Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Opinião
02 de Fevereiro de 2017 às 20:29

Wilders e a tentação holandesa

Por estes dias, Donald Trump parece ser o centro do mundo, causando nervosismo crescente em todo o mundo. Mas, enquanto isso, a Europa não tem pela frente apenas o desafio que a nova administração americana lhe acena.

  • 1
  • ...

Tem também os seus enormes problemas internos, a começar pela teimosia alemã sobre a forma como se deve modelar a economia europeia e resolver o problema da dívida. A Europa está frágil e cinde-se a olhos vistos. Trump poderia ser um factor de unificação face a um "inimigo externo", mas parece mais evidente que isso não adoçará o frenesim alemão sobre os países do Sul da Europa nem alterará a posição de muitos países do Leste, também eles empenhados em construir os seus muros perante a apatia de Bruxelas e Berlim. Este ano vai ser de grandes mutações, independentemente dos resultados das eleições que se vão desenrolar em França ou na Alemanha. Muitos esquecem uma das eleições mais importantes de 2017: as que se vão realizar na Holanda. Este é um dos países que criou a primitiva União Europeia e um solavanco forte na sua posição no núcleo duro do projecto europeu pode ter consequências graves e imprevisíveis. Como a tentativa de sair da União Europeia.

Não é uma impossibilidade, tal como não é a vitória de Marine Le Pen em França. A Holanda sempre foi vista como um país tranquilo e multicultural, tolerante e agradável. Da herança vistosa da sua arte à beleza estética da sua selecção de futebol, a "laranja mecânica" dos tempos de Cruyff, a Holanda parecia continuar a ser um país sem problemas. Não é o caso. Em Março, tudo pode mudar. O Partido da Liberdade de Geert Wilders pode muito bem ser a surpresa que ninguém na Europa desejava. Wilders foi uma das vozes mais sonantes da recente reunião de grupos de extrema-direita em Koblenz, onde ele fez o elogio rasgado de Donald Trump. E não deixou de referir que estamos a caminhar para uma "Primavera Patriótica" na Europa. Talvez como metamorfose da célebre "Primavera Árabe", que teve os resultados conhecidos. É um choque para um país sempre preocupado com a lógica do comércio e dos negócios e que sempre buscou o consenso. Este ainda existe na figura do primeiro-ministro conservador Mark Rutte. Mas até este está a ser contaminado pelo vento extremista, tendo já dito que quem não se adaptar aos valores holandeses pode ir embora. Só que o populismo de Wilders já está à solta. Há algum tempo que ele propõe o fecho das mesquitas, banir o Corão e fechar as portas aos que buscam refúgio na Holanda.

As sondagens são transparentes: Wilders pode ganhar as eleições, mesmo que isso não signifique que venha a ser o primeiro-ministro, se encontrar uma maioria que possa bloquear essa possibilidade. Mas mesmo que isso aconteça, Wilders passará a ser um elemento crucial para qualquer decisão política na Holanda. E reforçará o poder de fogo de todos os que na Europa lutam contra Bruxelas e desejam o desmantelamento da União Europeia. As formas de identidade nacional implodiram e agora parece que a sociedade holandesa (tal como a francesa ou alemã, só para darmos alguns exemplos) busca uma solução para as suas indefinições. Se ganhar, Wilders acenderá mais um fogo na pradaria europeia.

 

Grande repórter

Ver comentários
Mais artigos do Autor
Ver mais
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio