Opinião
[712.] Fim do "sistema mágico" da publicidade?
A publicidade perde o seu carácter na dissolução no marketing e na falta generalizada de criatividade. As mesmas ideias repetem-se. São raros os anúncios memoráveis.
Este artigo vai pessimista por uma razão simples: não encontrei nenhum anúncio ou campanha memorável, que me estimulasse a sua análise.
Resolvi folhear digitalmente os media informativos sobre publicidade e marketing. O que mais encontrei foram conselhos sobre como obter maior visibilidade para as mensagens publicitárias. Listas e listas de conselhos de especialistas, matemáticos, marketeers. Todas as semanas há mais. Com a proliferação de plataformas para anunciar e, dentro de cada uma, de diferentes lugares, pessoais e colectivos, os anunciantes têm de escolher. Para lá da internet, que é um mundo, há os media tradicionais em papel, os painéis nas ruas, os eventos de todos os géneros, os patrocínios, que chegam à "street art".
Todavia, a famosa frase de John Wanamaker (1838-1922) mantém-se válida: "Metade do dinheiro que gasto em publicidade é desperdiçado; o problema é que não sei qual das metades." Mesmo com os software de métrica, o problema mantém-se, levando a que se estude a métrica da métrica. Se, em 2016, a internet já recolheu nos EUA maior investimento do que a TV, a sua eficácia é posta em causa. O banco JP Morgan Chase tinha anúncios em 400 mil sites na web. No início do ano, decidiu escolher só 5.000 para comparar a visibilidade - e os resultados foram os mesmos. O que conta não é estar em todo o lado, mas estar nos sítios certos. Como há cem anos.
A desestabilização da publicidade, a sua fusão com o marketing, a normalização da linguagem do marketing e da publicidade em todo o tipo de actividades, surgem nos media tradicionais em anúncios "à antiga", mas também em conteúdos patrocinados, que já pouco se distinguem de "notícias", bem como em todo o género de notícias criadas a partir de acções de marketing, algumas sem qualquer tipo de ética.
Se a informação, o jornalismo, o marketing e a publicidade se dissolvem numa amálgama comunicativa, as primeiras vítimas são o jornalismo e a boa publicidade. O jornalismo, que antes tinha como principal pressão a das instituições políticas, arca agora com o crescente poder empresarial na sociedade. As mesmas grandes empresas que diminuem a publicidade nos media jornalísticos são as mesmas que conseguem informação divulgada como notícias. Outras empresas contam com a ingenuidade do jornalismo e produzem campanhas que são apenas colocadas num ou dois painéis de rua, com um orçamento ridículo, mas obtêm visibilidade mundial porque são apresentadas como "polémicas", logo, motivo de notícia. Aparecem por todo o lado tendo sido apenas divulgadas num único cartaz, num único painel, numa única localidade, mas originam centenas ou milhares de notícias. Este modelo, em grande medida desenvolvido por Oliviero Toscani para a Benetton, acaba, se insistente, em diminuir a prazo o valor da marca, apesar de os anúncios, que são menos dos produtos do anunciante do que da mensagem social, permanecerem vivos através da memória digital da internet.
A publicidade perde o seu carácter na dissolução no marketing e na falta generalizada de criatividade. As mesmas ideias repetem-se. São raros os anúncios memoráveis. Os publicitários têm, também eles, de arcar com a pressão, no seu caso dos anunciantes, geralmente castradora da criatividade. Muitos libertam-se criando anúncios fantásticos oferecidos a organizações não governamentais, para causas sociais e ambientais. Não admira que os meus alunos de análise de publicidade, dando-lhes eu liberdade para escolherem os anúncios que quiserem para analisar, optem crescentemente por anúncios de ONG.
Na internet, mas também na televisão, os anúncios receiam a criatividade para não parecerem sofisticados, ou, horror dos horrores, intelectuais. Não são simples, mas simplistas, vulgares. Não puxam pelo observador, descem ao que julgam ser o nível ou acham que ele já não aceita mensagens com a magia dos mundos alternativos. Será que os próprios publicitários já não acreditam na publicidade como "sistema mágico"?