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[580.] Novo Banco: nova borboleta

A borboleta naturalista do Novo Banco não durou um mês. Ainda as agências começavam a pendurá-la pelos suportes, paredes, portas e janelas, e o frágil insecto foi substituído pela sua própria estilização.

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A borboleta agora morta imitava uma borboleta real, era verde, tinha antenas, pêlos no corpo e todos os detalhes coloridos das suas grandes asas. Morreu jovem. Talvez esta mudança em dois momentos da imagem da instituição tenha sido propositada. Não sei. O Novo Banco não explica se a mudança de imagem "determinada pelo Banco de Portugal e pela Direcção-geral da Concorrência da Comissão Europeia" se refere a esta ou a esta e à anterior, quando morreu o dinossauro BES.

 

Desaparecida a borboleta analógica, veio uma borboleta simbólica, cinzenta e simplificada num sinal gráfico. O banco esforça-se em comunicado por explicar o novo logótipo. Mantém a cor verde de referência. Num exercício retórico mais publicitário do que analítico, o Banco explica que as letras representam "o chão, a força, o estabilizador" e que "dele desprende-se o símbolo", o tal sinalzinho gráfico aborboletante.

 

Este, continua o Banco, "parte da reinterpretação das asas da borboleta que simbolizou na primeira campanha transformação e capacidade de renovação." O sinal é, assim, segundo a sua explicação, "o compromisso com a elevação, a ambição e a agilidade". Foi "representado como uma potência matemática", pois o banco quer retomar a liderança.

 

Quando a explicação é grande, o crítico desconfia. De facto, se a publicidade serve para criar uma linguagem simbólica que cubra e transporte a realidade do cliente para a estratosfera dos sonhos e representações, ela, por isso mesmo, não costuma explicar em detalhe essas operações estéticas e culturais. No comunicado do Novo Banco apresentando a sua "nova identidade" - como se a identidade de alguém ou alguma coisa só fosse a do papel de embrulho publicitário - é grande o esforço para explicar o novo logótipo. O conceito "símbolo" aparece quatro vezes, juntando-se-lhe ainda os conceitos "representação e "reinterpretação".

 

A explicação era necessária porque o sinal gráfico por cima do último "o" do nome do banco pouco se assemelha, na estilização, a uma borboleta. Poderia ser uma traça cinzenta, ou uma pequena seta ou até um acento circunflexo virado de lado. Como não conviria que a mudança fosse em excesso, borboleta foi, borboleta será: mudar de novo em apenas um mês criaria uma ainda maior instabilidade na instituição e na sua percepção pública. Assim, avançou-se para qualquer coisa um pouco parecida e um pouco diferente. 

 

A explicação mais excessiva – e o exagero é inerente à publicidade – é a que compara a borboleta estilizada a uma "potência matemática". A leitura literal desta explicação seria: Novo Banco elevado à borboleta, ou Novo Banco elevado à potência da borboleta. Mas o comunicado do banco pretende impor uma leitura simbólica: elevação do "compromisso da equipa Novo Banco ao desafio de voltar a ocupar a posição de liderança". Não joga bem com o símbolo, nem com a estilização, mas os publicitários tinham de conjugar a nova mudança de identidade gráfica com a continuação da borboleta naturalista do mês anterior.

 

"Parecem intenções porque são intenções", diz, com assinalável franqueza um anúncio do Novo Banco sobre o seu futuro. A frase aplica-se à nova imagem. Diz esse anúncio com rara humildade em auto-avaliações publicitárias dos anunciantes: "Ninguém nasce virtuoso". É mesmo. Incluindo na publicidade. Quando o mundo real e as mudáveis circunstâncias da entidade anunciada são brutais, faz-se o que se pode. 

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