Opinião
UE - Novas regras na resolução de litígios fiscais
Ambos os mecanismos podem decorrer em paralelo com um processo judicial ou um procedimento administrativo relativamente à mesma questão. Os contribuintes podem, assim, abrir várias frentes de contestação, numa perspetiva de reforço das suas garantias.
Brevemente, será transposta para o direito português uma diretiva comunitária relativa à resolução de litígios em matéria fiscal na União Europeia (UE) decorrente da interpretação e aplicação de acordos para eliminação da dupla tributação, procurando alcançar uma justiça redistributiva para a qual o quadro legislativo existente não dava resposta rápida, nem efetiva.
Em Portugal, país de importantes fluxos migratórios de entrada e saída de pessoas, esta realidade atinge muitos cidadãos, que, desconhecedores da complexidade dos sistemas fiscais, não acautelam o seu enquadramento fiscal, mudando a sua residência sem alterar o seu estatuto fiscal, vendo-se confrontados com liquidações de impostos, que lhes causam problemas de liquidez e custos.
Já para as empresas, é comum, por exemplo, verem negado o direito à dedução de créditos de imposto relativos a retenções efetuadas indevidamente em países com os quais Portugal até celebrou um acordo de dupla tributação, mas que, não obstante não terem competência territorial para tributar os rendimentos à saída, continuam a aplicar indevidamente retenções na fonte, para as quais Portugal, enquanto Estado da residência, tem legitimidade para negar a eliminação da dupla tributação.
O quadro normativo existente assenta no modelo de soberania estadual em que contribuinte é um mero destinatário passivo, dependendo unicamente do impulso processual dos Estados, que nem sequer estão obrigados a chegar a acordo final.
Se é certo que da aplicação de um acordo de dupla tributação não deveria decorrer uma situação final mais prejudicial do que aquela que pré-existia à celebração do acordo, a não resolução dos litígios demonstra a negação dos princípios com que tais acordos foram celebrados, que são, afinal, os de evitar a dupla tributação e a dupla não tributação.
Mecanismo de arbitragem
O novo mecanismo de resolução por mútuo acordo passa a possibilitar o impulso processual por parte dos contribuintes e assenta em dois meios alternativos. O primeiro é o procedimento amigável entre as autoridades tributárias, que devem resolver o assunto no prazo de dois anos. A decisão definitiva sobre o procedimento amigável é vinculativa para os Estados, sendo aplicada sob reserva do interessado aceitar essa decisão e renunciar ao direito a qualquer outro recurso.
Se não for encontrada uma solução neste prazo, pode recorrer-se a um mecanismo de arbitragem, solicitando o contribuinte a criação de uma comissão consultiva ou de uma comissão alternativa de resolução de litígios com competência para emitir um parecer vinculativo com recurso, além de membros das autoridades tributárias, a peritos independentes. Neste último caso, o prazo para chegar a acordo sobre a forma de resolver a questão litigiosa é de seis meses. Também aqui, pode haver lugar a acordo entre as autoridades fiscais dos Estados. Em qualquer caso, a decisão sobre este procedimento não constitui precedente e também aqui é aplicada sob reserva do interessado aceitar essa decisão e renunciar ao direito a qualquer outro recurso.
É ainda importante salientar que ambos os mecanismos podem decorrer em paralelo com um processo judicial ou um procedimento administrativo relativamente à mesma questão. Os contribuintes podem, assim, abrir várias frentes de contestação, numa perspetiva de reforço das suas garantias.
Este novo mecanismo aplica-se a reclamações apresentadas a partir de 1 de julho de 2019 sobre questões litigiosas respeitantes a rendimentos ou capital auferidos a partir de 1 de janeiro de 2018.
Consultora da Ordem dos Contabilistas Certificados