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O Orçamento do Estado 2020 - Enquadramento político e económico

Não será possível ter uma política orçamental radicalmente diferente, nem fazer mudanças num quadro anual, mas há mudanças que numa legislatura são possíveis e também indispensáveis.

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1. Neste momento é possível, pela análise do esboço do orçamento já publicado e pela análise do Programa do Governo, antecipar as principais opções da política orçamental.

 

Teremos um orçamento do Partido Socialista com as medidas necessárias à sua aprovação pela esquerda parlamentar, num enquadramento de despesas públicas cada vez mais rígidas.

 

Uma previsão de crescimento de 2,0%, valor mais optimista do que o das organizações internacionais, a continuação da baixa da taxa de desemprego, embora esta tenha subido no último trimestre e um crescimento de produtividade de 1,2%.

 

O crescimento das receitas fiscais assegurará a descida do deficit para 0. Mas o crescimento continuado das despesas públicas fica evidenciado na deterioração do saldo estrutural.

 

2. É necessário reconhecer que a parte da classe empresarial que achava que o Partido Socialista libertado dos seus parceiros da geringonça teria uma política diferente deverá ter-se enganado.

 

É hoje quase consensual que Portugal tem um crescimento insuficiente.

 

Insuficiente para poder encarar com alguma tranquilidade uma possível deterioração da economia internacional, as condições de financiamento da economia portuguesa, níveis adequados de investimento, um crescimento sustentado dos salários à classe média.

 

Insuficiente para criar um ambiente de dinamismo necessário a ultrapassar com vantagem os desafios, nomeadamente o da digitalização.

 

3. Será possível fazer diferente? É realista propor outras medidas? Acho que não só é possível e realista como é indispensável.

 

Não será possível ter uma política orçamental radicalmente diferente, nem fazer mudanças num quadro anual, mas há mudanças que numa legislatura são possíveis e também indispensáveis.

 

A primeira tem a ver com a qualidade da despesa. É sabido que a qualidade é baixa e não é avaliada regularmente.

 

A nova Lei da Execução Orçamental (LEO) vem sendo adiada há dois anos. Evidenciar compromissos plurianuais, comparar o orçamentado com o realizado e, sobretudo, a qualidade dos resultados para as verbas orçamentadas e realizadas são um passo necessário à melhoria da actividade do Estado.

 

Especial destaque mereceriam, na óptica do trabalho e das empresas, as contas da Segurança Social, que são geridas confundindo Segurança Social da população activa com política assistencial ou até eleitoral.

 

É possível fazer melhor com o actual nível de despesa pública e aumentar o esforço nalgumas áreas deve ser possível reduzindo-o noutras.

 

A segunda mudança tem a ver com o realismo das propostas políticas.

 

Ler os programas eleitorais dos partidos, e não só do PS, mostra-nos uma imagem muito irrealista do que é possível fazer e cria falsas expectativas.

 

O Orçamento do Estado sustenta dificilmente o SNS actual, muito menos o do futuro. 

 

É parte significativa da despesa pública e sujeita a grande pressão.

 

A política energética é área muito importante para a actividade económica e já dissuasora de investimento. É pelo menos surpreendente ouvir inúmeras medidas de transição energética, parando activos produtivos sem uma palavra sobre o que acontecerá às tarifas.

 

Na área da educação, outro ponto orçamental de peso, continuamos a ter uma percentagem assustadora de activos só com ensino básico - 50% do total. Não foi possível articular esforços, para um problema conhecido há décadas, com o Instituto de Emprego e Formação Profissional que vive da sua parcela da TSU, em aumento constante nos últimos anos, sem escrutínio.

 

É indispensável dar prioridade à empregabilidade e adequar a formação às necessidades do futuro, em que grande parte dos empregos serão tão novos que ainda não existem hoje.

 

4. Já do lado das receitas é previsível a continuação do aumento dos impostos.

 

Será indispensável aumentar a capitalização das empresas e os passos que têm sido dados no sentido da dedução dos lucros retidos e reinvestidos é manifestamente insuficiente por uma aplicação que ao limitar o montante absoluto das deduções só beneficia as empresas de menor dimensão.

 

A procura incessante de receitas fiscais e a pouca vontade de aumentar o número de empresas de maior dimensão resulta num tecido empresarial insuficientemente dimensionado para crescer nas exportações e entrar em segmentos e sectores tecnologicamente mais evoluídos.

 

A progressividade do IRC limita fortemente o indispensável crescimento da produtividade e a capacidade de pagar salários mais elevados.

 

Se a esta limitação adicionarmos a progressividade do IRS desde níveis baixíssimos e os descontos de Segurança Social, encontramos a principal dificuldade de retenção de quadros mais qualificados.

 

É incompreensível que para um mesmo encargo salarial é em Portugal que o salário líquido recebido pelo trabalhador é mais baixo.

 

Estes três aspectos são centrais na obtenção de taxas de crescimento mais elevadas e só a sua redução permitirá aumentar a poupança e o investimento.

 

E se não for possível alterá-los caminhamos para o empobrecimento.

 

5. Existem, no entanto, políticas públicas que são poderosos instrumentos de progresso e que exigem poucos recursos.

 

Refiro-me, em particular, à qualidade das instituições em que salientaria o sistema legal e direitos de propriedade e a regulação dos mercados, bem como a eficiência governativa e o controlo da corrupção, áreas em que estamos mal e onde há portanto mais ganhos potenciais com estas reformas.

 

6. O que estas mudanças exigem é uma visão de longo prazo, um espírito reformista e a vontade colectiva de crescer.

 

Deve ser esta a missão do Governo.

 

Presidente do Conselho Directivo do Fórum para a Competitividade

 

Artigo em conformidade com o antigo Acordo Ortográfico

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