Opinião
Notas essenciais sobre o procedimento disciplinar
O poder disciplinar pode servir propósitos de prevenção, mas, em regra, surge associado à via sancionatória. Conheça as regras.
A execução de qualquer tipo de contrato de trabalho confere ao empregador os necessários poderes de direcção e disciplina, a fim de assegurar a organização do trabalho, a promoção pessoal e profissional dos trabalhadores, bem como o incremento da produtividade com vista ao êxito organizacional.
Embora o poder disciplinar possa servir propósitos de prevenção, a verdade é que, em regra, surge associado à via sancionatória, não podendo revelar-se, em qualquer caso, arbitrário.
A aplicação de qualquer sanção, por parte do empregador, exige o cumprimento de procedimentos e prazos específicos, bem como a observância do princípio da proporcionalidade atendendo-se à gravidade da infracção e à culpa do trabalhador, sob pena de responsabilização do empregador.
Destaque-se que o despedimento sem indemnização ou compensação (despedimento com justa causa) constitui a sanção mais grave legalmente prevista e apenas poderá ser aplicada em caso de comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. Considerando que o conceito de justa causa é indeterminado, o legislador, no Código do Trabalho, enumera alguns comportamentos exemplificativos que poderão ser considerados e utilizados como referência.
Em caso de despedimento com justa causa, o procedimento disciplinar a observar é complexo, estando sujeito a prazos curtos e ao cumprimento das seguintes fases: (i) nota de culpa; (ii) resposta à nota de culpa; (iii) instrução; e (iv) decisão.
Algumas novidades foram introduzidas às referidas fases através da Lei n.º 23/2012, de 25 de Junho, designadamente: (i) na fase de instrução o empregador encontra-se agora obrigado, por si ou através de instrutor que tenha nomeado, a realizar as diligências probatórias requeridas na resposta à nota de culpa, a menos que as considere patentemente dilatórias ou impertinentes, devendo neste caso alegá-lo fundadamente por escrito; (ii) ainda na instrução, o empregador não é obrigado a proceder à audição de mais de 3 testemunhas por cada fato descrito na nota de culpa, nem mais de 10 no total; e (iii) concluídas as diligências probatórias, o empregador, sob pena de praticar uma contra-ordenação, deve apresentar cópia integral do processo à comissão de trabalhadores e, caso o trabalhador seja representante sindical, à associação sindical respectiva, que podem, no prazo de 5 dias úteis, fazer juntar ao processo o seu parecer fundamentado.
Atentas as referidas alterações foram eliminadas todas as anteriores referências à possibilidade do empregador poder optar por não realizar as diligências probatórias na fase de instrução e, consequentemente, ajustados os prazos relacionados com tal opção.
Concluído o despedimento com justa causa, apenas o tribunal judicial poderá pronunciar-se sobre a regularidade e licitude do mesmo, ficando a defesa do empregador condicionada aos factos e fundamentos invocados na decisão de despedimento.
Para efeitos de apreciação judicial do despedimento, o trabalhador afectado deverá opor-se ao despedimento mediante apresentação de requerimento em formulário próprio, junto do tribunal competente, no prazo de 60 dias contados a partir da recepção da comunicação de despedimento ou da data de cessação do contrato, se posterior.
Saliente-se que a Lei fala expressamente em 60 dias não equiparando este período a dois meses, pelo que a sua correcta contagem é fulcral, sob pena do trabalhador ver caducado o seu direito de oposição ao despedimento .
Finalmente, saliente-se que em caso de serem declarados judicialmente procedentes os motivos justificativos invocados para o despedimento, verificando-se apenas uma mera irregularidade fundada em deficiência do procedimento de despedimento por omissão das diligências probatórias acima descritas e introduzidas pela n.º 23/2012, o trabalhador terá somente direito a receber metade do valor da indemnização prevista em caso de ilicitude do despedimento e substituição de reintegração a pedido do trabalhador, ou seja, a metade do valor que vier a ser fixado pelo tribunal entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade.
1. O poder disciplinar não pode ser exercido de forma arbitrária, exigindo-se para a aplicação de sanções o cumprimento de procedimentos e prazos específicos, bem como a observância do princípio da proporcionalidade;
2. A Lei 23/2012, de 25 de Junho introduziu novidades nas diferentes fases que constituem o processo disciplinar em caso de despedimento com justa causa;
3. O prazo de 60 dias legalmente previsto para a oposição ao despedimento com justa causa não pode ser equiparado a dois meses, pelo que a sua correcta contagem é fulcral, sob pena de caducidade do direito do trabalhador;
4. Verificando-se a deficiência do procedimento disciplinar por omissão de diligências probatórias apenas é conferido ao trabalhador o direito a metade da indemnização legalmente prevista.
*Associado da Teixeira de Freitas, Rodrigues e Associados,
rodrigo@teixeiradefreitas.pt
**Regional Director Hays
duarte.ramos@hays.pt