Opinião
Este equilíbrio externo é sustentável?
O equilíbrio das contas externas portuguesas é muitas vezes apontado como o resultado mais positivo do ajustamento conseguido por Portugal. A rapidez com que o país conseguiu equilibrar a balança de bens e serviços foi notável. Mas será sustentável?
A redução do défice externo foi conseguida com aumento das exportações, mas foi também conseguida pela redução para níveis muito baixos das importações de bens duráveis e de investimento. A retoma pode inverter esta segunda componente muito rapidamente.
Entre 2008 e 2013, o saldo da Balança de Bens e Serviços aumentou 19 mil milhões, dos quais 10 mil milhões entre 2008 e 2011. O quadro abaixo agrupa os principais contributos para a redução do défice verificada entre 2008 e 2013. Os cálculos efectuados sector a sector mostram que o aumento das exportações num conjunto de sectores alargados foi responsável por 53,7% da redução do défice. Entre estes destaca-se o crescimento das exportações de serviços, mas também o crescimento das exportações em alguns sectores tradicionais, como o vestuário e calçado, os produtos alimentares e a fileira florestal (1).
Mas ao mesmo tempo 47,4% da redução do défice resultou da redução de importações, em particular de bens duráveis e de investimento - automóveis, de máquinas e material eléctrico. Se alguma redução de importações pode revelar maior nível de auto-suficiência - com substituição de importações por produção local, no caso destes sectores trata-se antes do adiar de compras externas, o que reforça a procura de importações futura.
Este aumento de importações já está a acontecer desde a segunda metade de 2013, mas pode estará reforçar-se. No primeiro semestre de 2014, as vendas de automóveis em Portugal registaram um crescimento superior a 40%. Um sinal positivo de confiança, mas um alerta de que a recuperação poderá resultar em desequilíbrio externo.
A evolução do défice dos produtos petrolíferos, que está em grande medida ligada à redução do consumo que acompanhou a diminuição da mobilidade dos portugueses num contexto de crise e de aumento do desemprego deu também um contributo positivo, enquanto a evolução dos preços dos produtos alimentares e de algumas matérias primas deu um contributo maioritariamente negativo.
Os dados do comércio externo de Maio, que saem esta semana, devem confirmar a tendência de crescimento das importações face ao ano anterior, esperando-se que sejam acompanhados pela retoma do crescimento das exportações, num contexto externo que é mais favorável do que o ano anterior, que permita inverter as quedas de exportações registadas em Março e Abril.
É importante verificar se Portugal consegue recuperar o crescimento das exportações. Não se trata tanto de garantir que uma parte importante do crescimento é puxada pela procura externa líquida, mas antes de garantir que o crescimento puxado pela procura interna é acompanhado por um dinamismo suficientemente forte das exportações para que estas consigam acompanhar o crescimento das importações mantendo o equilíbrio externo, evitando necessidades de reajustamento futuro que voltem a travar o crescimento.
A questão que se coloca hoje é a de, verificando que as importações estão a crescer mesmo em resposta a uma retoma do crescimento fraca, perguntar se conseguimos garantir que o crescimento das exportações as vai conseguir acompanhar. Desde o início de 2014, isso não tem acontecido - as exportações dos primeiros quatro meses revelam estagnação face ao ano anterior. E os dados sobre emprego na indústria ou os índices de produção industrial não estão a revelar o dinamismo que seria necessário. Resta esperar que 2014 possa ser mais um bom ano turístico, com a consciência de que Isso ajuda, mas não chega.
(1) Para um quadro com maior detalhe ver em http://destrezadasduvidas.blogspot.gr/
Professor no departamento de Economia da Universidade do Minho