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João Costa Pinto 05 de Julho de 2016 às 00:01

Brexit: para onde nos leva a Europa? - (LXXVI)

Na verdade a União Monetária é integrada por duas zonas que, partilhando embora a mesma moeda, se apresentam com situações financeiras diametralmente opostas.

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1. O resultado do referendo britânico vai condicionar o movimento de integração - política, económica e financeira - da Europa. No que nos diz respeito, as questões que nos devemos colocar não são difíceis de identificar. Como resposta, vai a Europa do euro acelerar a integração e preservar a atual configuração da União Monetária? Vai continuar a insistir em políticas que ignoram os dois principais problemas com que a Zona Euro se debate - endividamento excessivo e elevado desemprego jovem? Problemas que estão a contribuir fortemente para a fragmentação dos sistemas políticos construídos no pós-guerra e a ameaçar o próprio projeto da moeda única. Ou, pelo contrário, vai adotar políticas orçamentais mais flexíveis, orientadas para o combate ao desemprego e, deste modo, apoiar os esforços do BCE que está a levar ao limite e com fracos resultados, uma política monetária não convencional? A este respeito é surpreendente, além de tecnicamente absurda, a discussão em torno de eventuais sanções a Portugal e Espanha. O que, a acontecer - como parece querer o ministro alemão Schäuble -, só poderia significar um endurecimento em relação às economias devedoras periféricas e um impulso - deliberado ou não - ao projeto de uma Europa a duas velocidades. Sabemos como tradicionalmente prevalecia a convicção de que a Europa, quando confrontada com dificuldades - como as que resultam do Brexit - acabava por responder com uma aceleração do processo de integração. Aparentemente foi o que aconteceu com o lançamento da União Bancária. Desta vez, no entanto, a Zona Euro tinha acumulado de-sequilíbrios só ultrapassáveis com um salto qualitativo que a principal economia excedentária - a Alemanha - não queria, nem quer, dar. Na verdade a União Monetária é integrada por duas zonas que, partilhando embora a mesma moeda, se apresentam com situações financeiras diametralmente opostas. Uma é estruturalmente excedentária em poupanças/capital e credora, enquanto a outra é estruturalmente deficitária e devedora. Em vez de reconhecer que este desequilíbrio tinha de ser resolvido a nível da União Monetária, de modo a preservar a sua coesão - o que implicava a implantação de mecanismos de mutualização de dívida e de responsabilidades - impôs programas unilaterais envolvendo apenas as economias devedoras, como se fosse possível resolver deste modo desequilíbrios estruturais que se acumularam no interior de toda a Zona Euro. Como resultado, o Parlamento Europeu e a Comissão - que terão subavaliado a resistência política e doutrinária alemã - aprovaram uma solução inacabada e claramente desequilibrada para a União Bancária que ameaça provocar mais problemas do que os que resolve. Na verdade, esta está na origem de pressões crescentes, em particular nas economias apanhadas na "armadilha da dívida" e a braços com mercados bancários fragilizados. Pressões que se não forem neutralizadas em tempo útil, irão acelerar a fragmentação da União Monetária e pôr em causa de forma crítica a sua coesão, ameaçando a prazo o próprio projeto do euro. Pelo menos na sua configuração atual.  

 

2. O que refiro não ignora os erros próprios que nos levaram a acumular uma dívida excessiva, nem a responsabilidade de procurar soluções que dependam sobretudo de nós e que possam responder aos complexos desafios enfrentados pela nossa economia. Questões para outro dia.

 

Economista

 

Este artigo está em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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