Opinião
O novo produto de poupança europeu para a reforma – o PEPP
Em Portugal, os PPR fazem já parte do léxico dos portugueses e o novo produto PEPP tem muitas semelhanças com o seu regime, pelo que não devem existir resistências à sua implementação, caso o mercado o pretenda comercializar.
O tema da reforma voltou à agenda política nacional e comunitária. Com incidência na poupança, a Comissão Europeia deu a conhecer recentemente uma proposta de Regulamento, que tem aplicação direta e transversal em todos os países da União Europeia, para a criação de um novo produto de poupança para a reforma, o PEPP (Pan-European Personal Pension Product). A novidade é parcial porque apresenta muitas semelhanças com os PPR (Planos Poupança-Reforma) existentes em Portugal, mas analisemos qual o enquadramento atual de previdência social e a importância para o futuro de um novo produto de poupança.
Ao longo do tempo, as sucessivas reformas de que a Segurança Social tem sido objeto levaram a uma tendente desproteção no sistema previdencial por razões que se compreendem, ou seja, não existe equivalência suficiente, de um lado, entre os que trabalham e descontam para a Segurança Social e, do outro lado, os que recebem pensões. Nem tão-pouco se espera que no futuro tal venha a ocorrer. Assim, ganha maior relevância o princípio da complementaridade mencionado na Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, que define as bases gerais do Sistema de Segurança Social, para que entre o sistema público e outros complementares se encontrem as melhores soluções.
A lei reconhece que os objetivos do sistema se cumprem também através de planos de poupança-reforma, de seguros de vida, de seguros de capitalização e de modalidades mutualistas.
No entanto, para quem já efetua descontos para a Segurança Social, assumir um encargo adicional de forma individual pode representar um custo para o qual não tem capacidade ou não tem disponibilidade em razão das opções de vida. Viver melhor hoje ou com alguns sacrifícios para acautelar o futuro. Este é o dilema de muitos portugueses!
É neste panorama, comum à generalidade dos países europeus, que surge a proposta de Regulamento que cria o PEPP enquanto produto de poupança para a reforma, assumindo uma condição muito importante para o seu sucesso, os incentivos fiscais. Esta parte está dependente de cada Estado-membro. Para muitos cidadãos, ainda que reconheçam a importância de poupar para a reforma, o nível do incentivo fiscal à entrada (na contratação) é decisivo. Uma compensação imediata fiscal e não apenas diferida no tempo dará maior noção de partilha da preocupação do Estado com a reforma do cidadão.
Em Portugal, os PPR fazem já parte do léxico dos portugueses e o novo produto PEPP tem muitas semelhanças com o seu regime, pelo que não devem existir resistências à sua implementação, caso o mercado o pretenda comercializar.
De uma forma resumida, porque a proposta de regulamento é bastante extensa, diremos que o PEPP terá como vantagens e características o seguinte:
– Comercialização por um conjunto alargado de prestadores (bancos, seguradores, gestores de ativos, fundos de reformas profissionais, empresas de investimento) procurando garantir a igualdade de condições de concorrência;
– Um sistema complementar voluntário em paralelo aos regimes nacionais, que permitirá que os prestadores criem produtos individuais de reforma a uma escala pan-europeia e mobilizar mais poupanças de particulares dos instrumentos tradicionais, tais como depósitos a prazo, e canalizá-las para os mercados de capitais;
– Maior transparência quanto às características do produto através de um documento de informação pré-contratual sucinto e uniformizado que também permita a comparação entre produtos;
– Possibilidade para os consumidores de selecionar entre uma opção segura de investimento por defeito e opções alternativas com diferentes perfis de risco-retorno;
– Portabilidade do PEPP em toda a União Europeia, transparência total dos custos e a possibilidade de mudar de prestador (com limitação dos custos de mudança).
As maiores ou menores diferenças para o PPR português dependem da opção nacional, nomeadamente quanto aos motivos que permitem o reembolso antecipado dos valores investidos e quanto à matéria fiscal.
Para que o produto PEPP, quando aprovada a proposta de Regulamento, se implemente na oferta comercial dos prestadores será, no nosso entendimento, necessário que se cumpram várias premissas.
Deverá assegurar-se a existência de melhores incentivos fiscais, de que os atuais PPR também poderiam vir a beneficiar; que o PEPP exista em todos os Estados-membros e seja comercializado por vários prestadores, para que a portabilidade e a concorrência transfronteira possam funcionar; que os seguradores utilizem o seu passaporte comunitário para também manterem clientes nas mesmas condições contratuais, ainda que com diferentes enquadramentos fiscais; que as sanções gravosas em caso de incumprimento do Regulamento e que afetam diretamente, de forma pessoal, os administradores das empresas prestadoras do PEPP não tenham reflexo na vontade de o comercializar.
No entanto, há que ter noção de que produtos financeiros de longo prazo com capital e rendimento garantido existem já no mercado português, pelo que sem um incentivo fiscal que torne expetável um maior interesse dos consumidores que não pensam mudar de residência no espaço comunitário face, em particular, aos PPR existentes, será difícil o PEPP vingar.
De qualquer modo, a iniciativa traz para o debate o tema da poupança para a reforma e a consciência de que deve existir um balanço entre o que se vive no presente e o que se terá no futuro, bem como a noção de que se devem tomar medidas que ajudem a mitigar as perdas de rendimentos na reforma.
Advogado, doutorando e docente em Direito dos Seguros
Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico