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"Fantasmas da lei" e riscos "lesivos" impediram consenso na ERC sobre compra da TVI

Carlos Magno, presidente, recusou-se a “impedir um negócio entre privados numa lei que não existe". Arons de Carvalho e Luísa Roseira, vogais, vetaram a operação “em defesa da liberdade de comunicação social”. Saiba como se dividiu a ERC.

Miguel Baltazar
19 de Outubro de 2017 às 13:33
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A falta de consenso entre Carlos Magno, presidente da ERC, e Arons de Carvalho e Luísa Roseira, vogais do conselho regulador dos media, é notória nas suas declarações de voto em relação à compra da Media Capital pela Meo, comprada pela Altice em 2015.

De acordo com as declarações, a que o Negócios teve acesso, Arons de Carvalho explica que votou contra a operação porque lhe "pareceu ser a única forma de garantir" que o parecer emitido pela ERC, que não reuniu unanimidade, fosse divulgado publicamente. O que ainda não aconteceu.

"Desta forma, será possível a todos aqueles que analisarão este documento valorizar toda a extensa, fundamentada e assertiva análise dos evidentes riscos desta proposta de operação de concentração vertical não controláveis e gravemente lesivos do pluralismo e do direito dos cidadãos à informação", lê-se no mesmo documento.

O relatório elaborado pelos serviços jurídicos da ERC, que levantava sérias dúvidas sobre a operação, foi um dos documentos que os actuais três elementos do conselho regulador tiveram como base para elaborar a sua decisão.

Arons de Carvalho sublinha , nesse sentido, que a deliberação do regulador dos media foi "meticulosamente preparada e elaborada nos seus aspectos essenciais por um extenso e qualificado grupo de trabalho que inclui quadros da ERC de diversas unidades, mesmo amputada das suas conclusões lógicas por via da necessidade desse consenso, constitui uma relevante contribuição para a defesa da liberdade da comunicação social em Portugal".

Uma opinião partilhada por Luísa Roseira que sublinha que o seu veto à operação está justificado no parecer enviado à Autoridade da Concorrência que "elenca de forma exaustiva os riscos subjacentes" à aquisição, e "faz uma avaliação equilibrada dos riscos inerentes". Além disso, considera que "a mesma não permite antever benefícios em prol do pluralismo no sistema mediático português, comportando, pelo contrário, sérios riscos no sentido da sua diminuição", lê-se na declaração assinada por Luísa Roseira.

Carlos Magno fala em "fantasma da lei"

Do outro lado da balança está Carlos Magno, que começa por justificar a sua oposição contra o veto à operação com o facto de "a ERC não poder impedir um negócio entre privados com base numa lei que não existe".

"O fantasma da Lei contra a Concentração da Propriedade dos Media, aprovada pelo primeiro governo Sócrates, criticada por todos os partidos da oposição (à direita e à esquerda) e vetada duas vezes pelo Presidente da República, ameaça interferir neste processo de aquisição da Media Capital pela Altice". E relembra que "o actual presidente Marcelo Rebelo de Sousa foi também muito crítico dessa lei, na sua condição de jurista e de comentador político".

Por estes motivos, considera que não pode "assumir como competência/poder discricionário do conselho regulador o fantasma dessa lei abortada", aponta.

Carlos Magno relembra ainda que ouviu "todos os interessados, mas, com particular atenção, os que se opunham à aquisição". "Uma das minhas preocupações era perceber a dinâmica do sector sobre o qual a AdC nos pediu este pareceres para o futuro, tendo em conta o difícil presente, com o público risco de sobrevivência de alguns importantes grupos de media".

Para tal, o presidente da ERC revela ainda que "desde cedo" procurou "enquadramento na Regulação Europeia em sendo a Prisa [dona da Media Capital] espanhola, e a Altice francesa," consultou "os seus "colegas da Comisión Nacional de los Marcados y la Competencia – CNMC e do Conseil Supérior de l’Audiovisual – CSA. As indicações de ambos foram decisivas param esta minha posição", confessou.

Segundo Carlos Magno, o seu homólogo francês, Olivier Schrameck, enviou-lhe "uma carta de conforto" sobre o dono da Altice.

"Eu próprio já tinha tido informação directa sobre este comportamento do Sr. Drahi quando, há mais de dois anos, pedi ao presidente Schrameck que fizesse uma diligência em Paris depois de, aqui, em Lisboa, os três líderes das três televisões, Gonçalo Reis (RTP), Pedro Norton (SIC), e Rosa Cullel (TVI), terem vindo juntos à ERC pedir ao presidente do Conselho Regulador que obrigasse a Altice a negociar os preços dos seus canais. Nessa altura, os contratos com a PT estavam a caducar e o assunto (difícil) resolveu-se da melhor maneira possível", recordou.

Por todas estas razões, Carlos Magno defende que "a tese central para o veto imediato era que se esta operação se realizasse, no futuro, nenhum regulador conseguiria "atempadamente" impedir a Altice de praticar actos proibidos e lesivos do regular funcionamento do mercado". "Como presidente de um organismo regulador, não posso aceitar esta hipótese – nem teórica, nem academicamente", sustentou.

"Acho, por isso, que esta operação deve seguir para análise aprofundada da AdC. Com a análise de todos os riscos devidamente sistematizada", conclui na sua declaração de votos de três páginas.

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