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FT: Como Draghi vergou o banco que só respondia perante Deus
O Banco do Vaticano esteve no centro da última controvérsia a afectar a cidade-estado que é a sede da Igreja Católica Romana. O aumento da transparência e de controlos no banco da Igreja Católica é uma prioridade do Papa Francisco que os reguladores vinham a tentar impor ao banco desde 2008.
A prisão de um sacerdote, de um corretor e de um antigo funcionário dos serviços secretos italianos por suspeita de tentativa de contrabandear 20 milhões de euros através da fronteira com a Suiça foi o mais recente escândalo a envolver a Igreja Católica Romana.
A edição on-line do “Financial Times” dá conta da má gestão no banco da Igreja Católica, cujo nome oficial é Instituto para as Obras Religiosas, e que a publicação diz estar em penitência dos escândalos de que foi protagonista nos últimos quatro anos. A falta de transparência e sistemas de controlo dentro do banco levou a instituição a atravessar um período de “penitência”, refere o FT.
“Não podemos ter mais escândalos. É muito vergonhoso”, afirmou um membro da administração financeira do Vaticano ao jornal. A prisão do sacerdote a 28 de Junho deste ano tornou impossível que se continuasse a adiar as reformas obrigatórias no sistema financeiro em geral e que o Banco do Vaticano não tinha de cumprir por se encontrar fora da jurisdição dos reguladores europeus.
Parte das reformas que estão a ser levadas a cabo no Instituto para as Obras Religiosas foram pressionadas pelos grandes bancos internacionais, que se viram nas malhas dos reguladores depois de terem liquidado transacções com o banco da Igreja. Bancos como Deutsche Bank, JPMorgan e Unicredit tiveram de responder perante os reguladores e acabaram por pressionar a Santa Sé a introduzir reformas.
Um banqueiro europeu explicou ao FT as dificuldades na relações com a Santa Sé. “Nós dizíamos, ‘temos de responder perante o regulador acerca deste assunto’. Eles respondiam, ‘Nós respondemos perante Deus’.”
Apesar de escapar à regulação do sistema financeiro do espaço europeu, o Banco de Itália, então liderada por Mario Draghi, começou a levantar dificuldades aos bancos que serviam de contraparte em operações com o Banco do Vaticano. A estratégia consistia em dificultar ao máximo o funcionamento do banco do micro-estado.
“É assim que se faz nestas situações, quando há um estado sobre o qual se não tem poder regulativo e se queres provocar mudanças. Torna-se a vida [do banco] muito difícil. Diz-se aos bancos que não estão autorizados a fazerem negócio com eles”, explicou um antigo ministro italiano ao jornal britânico.
A regulação bancária no Vaticano até 2008 era “indulgente”, já que não era feita pressão sobre a instituição para controlar as contas e a identidade dos seus depositários. 25% do dinheiro movimentado pela instituição é feito em notas e moedas, o que também levanta preocupações junto das autoridades internacionais.
Durante o Verão de 2012, o Banco de Itália tomou uma decisão ainda mais dura para com a instituição. O gestor da rede de Multibanco da cidade do Vaticano era gerida pelo Deutsche Bank, que não detinha uma licença válida para operar a o sistema. O regulador acabou que instar o Deutsche Bank a suspender o serviço no país.
Deutsche Bank suspende o serviço de Multibanco
A decisão provocou algum caos no Estado quando a dia 1 de Janeiro de 2013, uma época de particular movimento, foi suspenso o serviço de pagamentos por cartão. No ano anterior, vários bancos tinham suspenso a sua relação com a Santa Sé.
Com a chegada de Francisco ao Vaticano, o esforço de regulação ganhou um novo fôlego na Santa Sé. Depois de Bento XVI ter conseguido entregar a gestão da rede Multibanco a uma empresa suíça, que escapa à regulação da UE e Itália, o novo Papa reconheceu a importância de melhorar a transparência e as garantias de que o banco da Igreja opera em consonância com as regras internacionais.
O Estado do Vaticano passou a deter uma Autoridade da Informação Financeira com poder renovado e o banco a identidade dos titulares de todas as contas. A revisão vai durar até meados do próximo ano e até ao final de Dezembro próximo deverão ser fechadas algumas contas, refere o FT.