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Portugal capturou mais 20% de sardinha do que devia

Em seis anos, Portugal pescou mais 41 mil toneladas do que o aconselhado pelos cientistas. Hoje, o secretário de Estado das Pescas reúne-se com o seu homólogo espanhol para discutir plano de gestão da sardinha.

Miguel Baltazar
25 de Outubro de 2017 às 22:00
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A captura de sardinha em Portugal tem excedido sistematicamente os limites aconselhados pelos cientistas. Segundo um levantamento do Negócios feito a partir do parecer do ICES, entre 2011 e 2016 Portugal e Espanha capturaram 252,3 mil toneladas de sardinha. Este número supera em 20% o que foi sendo recomendado ao longo dos anos por este organismo que aconselha a Comissão Europeia e os países europeus sobre esta matéria.

Se a comparação for feita entre os valores aconselhados pelo ICES e as capturas registadas na lota (que nem sempre coincidem com os valores estimados por aquele organismo internacional), o excesso de pesca é ligeiramente inferior, situando-se nos 16%.

Em 2016, primeiro ano completo do actual Governo, a divergência entre a recomendação científica e a captura efectiva calculada pelo ICES foi especialmente gritante. Nesse ano, Portugal e Espanha capturaram quase o dobro do que era recomendável: 22,7 mil toneladas (das quais quase 14 mil toneladas foram pescadas por Portugal), o que contrasta com os 12 mil definidos pelo ICES.

O ‘stock’ de sardinhas com mais de um ano tem estado a cair desde 2006. ICES
Parecer divulgado no dia 20 de Outubro

Mas como se pode ver no gráfico, nos últimos seis anos, só em 2013 é que Portugal e Espanha pescaram menos sardinha do que o recomendado. Nos outros anos excedeu-se sempre, prejudicando assim a sustentabilidade da espécie.

Este tema está de novo a marcar a actualidade depois de o ICES ter divulgado o seu parecer onde recomenda a suspensão total da pesca em 2018. Essa suspensão, prevêem os cientistas, permitiria uma recuperação de 12,6% do "stock" de sardinha. Ainda assim, ficaria muito abaixo da dimensão considerada aceitável do "stock" de sardinha: a suspensão elevaria o "stock" de sardinha a 171 mil toneladas, o que contrasta com os 293 mil verificados em 2009, o último ano em que se atingiu um valor considerado aceitável pelos cientistas.
Porém, esse não é o caminho escolhido pelo Governo. Em declarações aos jornalistas na sexta-feira, a ministra apontou como meta a captura de 14 mil toneladas de sardinha, o que permitiria "um crescimento expectável da biomassa de 5,8%", menos de metade do recomendado.

O Governo acredita que é possível seguir uma terceira via, reduzindo um pouco as capturas mas sem prejudicar excessivamente as comunidades piscatórias. A ideia é apostar em medidas complementares, tais como a definição de áreas onde é interdita a pesca, o aumento do período de defeso e ainda o lançamento de projectos de investigação.

Um retrato preocupante
No parecer divulgado na sexta-feira, o ICES faz um retrato preocupante sobre a situação da sardinha nas águas ibéricas. O "stock" de sardinhas "com mais de um ano está a cair desde 2006 e tem estado abaixo dos valores aconselháveis desde 2009". Como é que isto acontece quando o nível de capturas foi tão reduzido nos últimos anos? O problema está nos baixos níveis de recrutamento, ou seja, no número de sardinhas que conseguem transpor a fasquia de um ano de idade.

Pesca será proibida em algumas zonas 

Esta quarta-feira, a ministra do Mar levantou um pouco mais o véu sobre o que será o novo plano de gestão da sardinha, necessário depois de o ICES ter considerado, em Julho, tal como Negócios noticiou, que este "era não precaucionário", ou seja, incapaz de assegurar a sustentabilidade da espécie.

Em declarações feitas à margem da conferência "O valor dos Oceanos", a decorrer na Gulbenkian, em Lisboa, Ana Paula Vitorino afirmou que prosseguem "conversas e reuniões de reflexão com as comunidades piscatórias para juntamente com o IPMA, já com informação científica, se poder delimitar áreas em que não haverá pesca de todo, porque são áreas importantes para a reprodução da espécie".

Essas áreas situar-se-ão sobretudo nas zonas centro e Norte do país, adiantou a ministra. "Existem várias propostas em cima da mesa, maioritariamente na região centro, também existe alguma coisa no Norte", disse citada pela Lusa, esclarecendo que a discussão ainda não está encerrada.

Resta saber se a proibição da pesca nestas zonas especialmente propícias à reprodução da espécie é suficiente. É que os dados científicos indicam que a ameaça sobre a sardinha não está apenas na dificuldade de reprodução, mas sobretudo na capacidade de os peixes chegarem à idade adulta (acima de um ano) em que já podem reproduzir e conseguirem envelhecer (aspecto especialmente relevante nos peixes em que a fertilidade aumenta com a idade).

Entretanto, o Parlamento aprovou ontem, por unanimidade, a audição da ministra do Mar no âmbito de um requerimento do PSD. O deputado do PSD Cristóvão Norte destacou que é importante perceber se o Governo tem estado atento à matéria e se já fez as diligências necessárias junto da Comissão Europeia e do Governo espanhol. 



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