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Sócrates acusa Cavaco de "conjura baseada numa história falsa" para derrubar o seu Governo
José Sócrates respondeu às acusações de que é alvo no livro de Cavaco Silva, acusando-o de conceber e executar uma "conjura baseada numa história falsa, de forma a deitar abaixo um Governo legítimo em funções."
Numa carta enviada à TSF na noite de sexta-feira, o antigo primeiro-ministro aborda a questão das escutas a Belém, cuja responsabilidade o ex-Presidente Cavaco Silva atribui ao Partido Socialista, no livro "Quintas-feiras e outros dias".
"O que se passou foi, tão simplesmente, isto: pela primeira vez na história democrática do país ficou provado que um Presidente concebeu e executou uma conjura baseada numa história falsa, de forma a deitar abaixo um Governo legítimo em funções", afirma José Sócrates.
No livro, apresentado na quinta-feira, Cavaco Silva escreve, sobre as acusações de que o gabinete de José Sócrates teria feito escutas ao Palácio de Belém, que se tratou de uma "intriga política insidiosa, criada e alimentada por sectores do PS com a participação activa de alguns órgãos de comunicação" para o envolverem na campanha das legislativas de 2009.
"Por mais desprezo que sinta – e sinto – por tal estilo e por tal literatura, não posso consentir que tal deturpação da verdade fique sem resposta", escreve Sócrates na resposta pela TSF, pedida também pela agência Lusa.
"Ponho de lado as vulgares opiniões políticas expressas no livro pelo autor, que, aliás, sempre me enfastiaram. Ponho igualmente de lado outras conversas, na sua maioria distorcidas e falsas, que não passam de vulgar exercício de mesquinhez disfarçado de relato histórico. Mas não posso pôr de lado, pela sua importância e pelo que tem de paradigmático, o inacreditável relato que faz do chamado ‘episódio das escutas ‘, sem outro propósito que não seja o de distorcer e falsear a verdade histórica", afirma.
Segundo o ex-primeiro-ministro, depois de Cavaco Silva se ter recusado desmentir a notícia das escutas que "sabia ser falsa", Sócrates insistiu: "A notícia das escutas era pessoalmente ofensiva e, estando o país em campanha eleitoral, tinha provocado sérios prejuízos ao Partido Socialista, podendo ter sido evitados se o Sr. Presidente da República a tivesse desmentido. Agastado, o Senhor Presidente entendeu lembrar-me que estava a falar com o Presidente da República. Respondi que nunca me esquecia disso, mas que estava ali a falar-lhe como primeiro-ministro, eleito democraticamente e contra o qual se tinha lançado uma falsa e maldosa campanha para que perdesse as eleições. A conversa ficou por aí."
Mais tarde, diz Sócrates, "soube-se a verdade", através de um e-mail que "permitiu saber que tais notícias tinham sido transmitidas a um jornalista pelo principal assessor de imprensa do Senhor Presidente da República". Quando o assessor, Fernando Lima, publicou as suas memórias, confirma a situação, escrevendo "Recebi uma indicação superior para o fazer", recorda.
Assim, "custa acreditar na perfídia que a recente versão do livro contem", afirma Sócrates, citando um excerto onde é dito que as notícias sobre as escutas teriam sido intencionalmente colocadas na imprensa pela "tenebrosa máquina de propaganda do PS" para afectar a credibilidade do Presidente.
No livro, Cavaco Silva descreve o antigo primeiro-ministro, dizendo que "sabia que o fingimento era uma das suas características", critica a sua "tendência arrogante e agressiva face à oposição" e acusa-o de ter "grande dificuldade em se adaptar à perda da maioria absoluta".
"Nunca nenhum Presidente ou primeiro-ministro relatou as conversas tidas entre ambos enquanto exerceram funções. Há boas razões para isso, que vão da boa educação até ao necessário sentido de Estado. A avaliar pelos relatos públicos e bem vistas as coisas, o livro agora publicado é um auto-retrato perfeito das consequências que o ressentimento pode ter no carácter de um político", responde Sócrates.
O antigo líder do governo termina a carta dizendo que "a única preocupação do Sr. Presidente era aquela que revelou na noite da sua reeleição: vingança e desforra" e que o seu discurso de tomada de posse "foi o sinal de que a direita precisava para atirar o governo abaixo e provocar eleições".
"Na Assembleia da República, e pela primeira vez na história democrática, chumbou-se um acordo e um compromisso com as instituições europeias que um governo legítimo tinha conseguido para que o país não fosse forçado a pedir ajuda externa. O Presidente da República de então não tem moral para dar lições de lealdade institucional. Na crise política de 2011, ele sempre foi a mão por detrás dos arbustos", conclui.