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Conheça algumas das apostas em obrigações que falharam esta década

Algumas apostas estranhas marcaram o mundo de títulos de dívida nestes últimos 10 anos.

Russell Boyce/Reuters
28 de Dezembro de 2019 às 18:00
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No início de 2019, os investidores não podiam emprestar dinheiro da Tesla com rapidez suficiente, apesar das dificuldades em entregar o Model 3 aos clientes. A fabricante de automóveis pode estar a sair-se melhor agora, mas as suas perspetivas de rentabilidade sustentada são, na melhor das hipóteses, nebulosas. Enquanto isso, investidores da Neiman Marcus deram mais tempo a uma rede de lojas que, como outros retalhistas, está no alvo do apocalipse do retalho. E houve também o caso da WeWork, mais um drama de um unicórnio que culminou com o SoftBank a concordar com um resgate de cinco mil milhões de dólares.

 

Mas, quando analisamos os últimos dez anos, o quadro é decididamente pior. MF Global ou Noble Group são-lhe familiares? E a Argentina?

 

Não são poucos os que alertam que, apesar de algumas notícias animadoras ultimamente, a recessão que todos previram pode finalmente chegar em 2020. Tradicionalmente, uma desaceleração é má notícia para as ações e boa notícia para o mercado de renda fixa. Mas, geralmente, é nesse momento em que algumas decisões equivocadas são tomadas. Desde a Grande Recessão e graças ao aumento dos níveis da dívida global, houve algumas raridades.

 

Então, em homenagem ao final da década, destacamos algumas apostas equivocadas e muito dinheiro investido em alguns negócios realmente arriscados.

 

2011: MF Global Holdings

Menos de três anos após o colapso do Lehman Brothers - o maior caso de falência da história dos EUA - e a subsequente crise financeira global, investidores correram para aplicar em outra ambiciosa empresa de trading. Graças ao que também se tornou um colapso financeiro histórico, as coisas não correram bem.

 

Estávamos em 2011, quando a MF Global Holdings era comandada pelo ex-co-chefe do Goldman Sachs (também ex-governador de Nova Jersey e ex-senador dos EUA), Jon Corzine. A empresa vendeu 650 milhões de dólares em títulos que prometeram pagar rendimento extra se Corzine assumisse um cargo no governo Obama (o que não ocorreu). Em vez disso, apostas fora de hora em títulos públicos europeus levaram ao rápido declínio da MF Global até a recuperação judicial - antes do primeiro pagamento de juros da nova dívida. Por sorte, muitos credores da corretora da empresa salvaram-se. Um porta-voz de Corzine não quis comentar.

 

2013: Empresa Mocambicana de Atum

Há seis anos, o Credit Suisse e a VTB Capital emprestaram 850 milhões de dólares à Empresa Mocambicana de Atum, conhecida como Mozambican Tuna, para financiar uma frota de barcos para pescar atum a uma das nações mais pobres do mundo. O empréstimo foi dividido e foram vendidas obrigações a investidores com uma garantia do Governo e um juro de 8,5%, apesar de o documento de venda só ter poucas páginas e de a empresa não se ter reunido com os credores antes. O acordo acabou por fazer parte de um escândalo de dois mil milhões de dólares. Os investidores foram surpreendidos quando souberam que parte do pacote de financiamento estava destinado a pagar barcos antipirataria que podiam ser equipados com canhões. A Fitch disse, na altura, que os investidores deviam saber quando lhes foi pedido para reestruturar a dívida, em 2016. Os obrigacionistas acabaram por chegar a um acordo no início deste ano para trocar as obrigações existentes por novas com maturidade em 2031.

 

2013: Banco Popular Español

O banco espanhol vendeu 500 milhões de euros numa emissão de obrigações em 2013. O objetivo era reforçar os requisitos de capital depois (do que muitos pensavam ser) o fim da crise de dívida europeia. A dívida foi emitida com um juro atrativo de 11,5%, com a ressalva de que as obrigações pudessem ser canceladas mesmo sem a empresa entrar em incumprimento. Em 2017, cerca de dois mil milhões de euros de obrigações foram canceladas depois de o regulador ter forçado a venda da instituição ao Banco Santander.

 

2016: Petróleos de Venezuela SA

Quando a petrolífera estatal da Venezuela vendeu títulos pela última vez, em setembro de 2016, a tentar refinanciar a dívida existente, os investidores com prioridade de pagamento receberam apenas 8,5% pelos títulos, embora os baixos preços do petróleo já levantassem preocupações de inadimplência.

 

Em novembro de 2017, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, disse que suspenderia os pagamentos e tentaria negociar com os credores. Hoje, os detentores de títulos ainda aguardam o pagamento de mais de nove mil milhões de dólares em dívidas inadimplentes do governo e da Petróleos de Venezuela, enquanto o país permanece mergulhado em turbulência e sob sanções.

 

2017: Títulos a 100 anos da Argentina

A Argentina demorou cerca de 15 anos para chegar a um acordo final, após um default sem precedentes de 95 mil milhões de dólares. Mas a tinta da caneta estava quase seca quando o país sul-americano regressou ao mercado de capitais. Desta vez, queria vender 2,75 mil milhões de dólares em títulos a 100 anos.

 

Os investidores estavam dispostos a emprestar com um rendimento de 7,917%, embora a Argentina tenha deixado de pagar a dívida três vezes em pouco mais de duas décadas.

 

Hoje, a economia do país está novamente em crise e os seus títulos são negociados em níveis baixíssimos. Originalmente vendidos a 90 centavos de dólar, os títulos a 100 anos agora são negociados perto de 46 centavos. Um porta-voz do governo não respondeu de imediato a um pedido de comentário.

 

2017: PetSmart

Os investidores acordaram emprestar dois mil milhões de dólares à rede de lojas de animais que PetSmart, que estava em dificuldades, para financiar a compra da marca Chewy. Entretanto, as obrigações vendidas para financiar a aquisição da cadeia de lojas começaram a cair. Um ano depois – num movimento que levou a posições semelhantes assumidas pelos retalhistas J. Crew Group e Claire’s Stores – a empresa transferiu um terço das ações da Chewy para uma holding controlada pela BC Partners – e colocou-as fora do alcance dos credores. Seguiram-se processos judiciais e uma oferta pública inicial da Chewy, que beneficiou os obrigacionistas. As coisas estão a melhorar para a empresa, mas o episódio foi, no entanto, um alerta.

 

2018: Noble Group Ltd.

Antes a maior trading de commodities da Ásia, a Noble enfrenta acusações desde fevereiro de 2015 sobre contabilidade inadequada. Mesmo com a queda dos preços das ações e do lucro, investidores e bancos concordaram em conceder 3 mil milhões de dólares em crédito.

 

Os credores de hedge funds da empresa aceitaram uma troca de dívida por ações de 3,5 mil milhões de dólares, mas as práticas contabilísticas e de gestão da empresa permanecem sob investigação pelas autoridades de Singapura. Em novembro, a empresa ainda lidava com um prejuízo de milhares de milhões de dólares e uma prolongada reestruturação. Com um futuro incerto, os títulos da empresa são negociados com rendimentos de dois dígitos. A Noble não respondeu imediatamente um pedido de comentário.

 

2018: Infrastructure Leasing & Financial Services Ltd

A dívida de infraestruturas indiana e a dívida bancária insuflou 44% entre 2015 e 2018, um sinal de alerta que aparentemente foi ignorado pelos investidores e pelas agências de "rating".  Ainda assim, a empresa manteve elevados níveis de rating e financiou-se repetidamente no mercado de dívida local antes de ter entrado em incumprimento no pagamento de cerca de 12,5 mil milhões de dólares em agosto, o que levou a um "sell-off" no mercado bolsista e elevou as preocupações com a estabilidade do sistema financeiro. Em outubro, o controlo e gestão da ILFS foram assumidos pelo Governo.

 

2018: Chuying Agro-Pastoral Group

O pequeno produtor de porco é um exemplo emblemático dos problemas das empresas chinesas que assumiram demasiada dívida num contexto de abrandamento da economia. Em novembro de 2017, a Chuying ofereceu-se para reembolsar os detentores de títulos de curto prazo, no valor de 500 milhões de yuans, em pacotes que incluíam fiambre e porco em vez de dinheiro. Dois meses depois disto, a empresa viu-se com pouco "stock" de porco depois de a febre suína ter afetado fortemente os seus inventários. Em junho, a Chuying falhou o pagamento de obrigação no valor de 798 milhões de yuans, com 98% dos credores a aceitarem prolongar a maturidade da dívida.

 

(Texto original: Ten of the Worst Bond Bets of the Decade)

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