Notícia
Conferência em Portugal patrocinada por empresa envolvida na denúncia de Temer
Depois de conhecido o acordo de delação de executivos da JBS, o instituto promotor do seminário cancelou o patrocínio e devolveu parte da verba. Juiz que decidirá a validação da delação é sócio-fundador do instituto que promove o evento.
O grupo empresarial brasileiro envolvido na delação do presidente Michel Temer financiou em Abril um congresso em Portugal. O evento foi co-promovido por um instituto ligado ao juiz que terá uma palavra a dizer sobre a validade daquela mesma delação.
Em causa, de acordo com o jornal Folha de São Paulo, está o V Seminário Luso-Brasileiro de Direito Constitucional, que decorreu entre 18 a 20 de Abril na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Um evento promovido pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IBDP) e que contou com o apoio do grupo J&F, dono do fornecedor de carnes JBS, cujo sócio Joesley Batista gravou conversas com o presidente brasileiro que sugerem que o chefe de Estado teria conhecimento do pagamento de subornos a Eduardo Cunha, ex-líder da Câmara dos Deputados e actualmente preso.
No total, nos últimos dois anos, o grupo empresarial terá destinado 1,45 milhões de reais (390 mil euros) em patrocínios ao IBDP, dos quais cerca de 175 mil euros foram aplicados na edição deste ano do evento em Portugal, de cujo programa constavam os nomes de vários ministros do executivo brasileiro.
Assim que foi conhecido o acordo de delação entre sete executivos da JBS e o Ministério Público Federal, ainda segundo o mesmo meio de comunicação, o IBDP rescindiu o contrato válido desde 2015, por razões relacionadas com conduta ética e moral do patrocinador, e devolveu um montante semelhante ao que foi empregue no apoio ao congresso em Lisboa. Mas o jornal não confirma se o patrocínio devolvido foi o mesmo que foi entregue para realizar este evento e o instituto refere que o valor em causa não chegou sequer a ser gasto.
O Negócios contactou o Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (ICJP), co-organizador do evento, mas até ao momento não foi possível saber se o valor devolvido é o que seria aplicado no evento português.
Um dos organizadores daquele seminário em Portugal é Gilmar Ferreira Mendes, presidente do Supremo Tribunal Eleitoral (STE) do Brasil e membro do Tribunal Supremo Federal (TSF), além de sócio-fundador do IBDP. O instituto garante no entanto que Gilmar não é nem nunca foi administrador do IBDP, pelo que não tem uma palavra a dizer sobre questões relativas à administração.
É a Gilmar que cabe, conta o Folha de São Paulo, deliberar – em plenário do TSF – a validade do acordo de delação, num julgamento ainda sem data. O voto de qualidade de Gilmar no STE contribuiu, na semana passada, para ilibar Temer e Dilma Rousseff por irregularidades em financiamento de uma campanha em 2014 que poderiam ter resultado na destituição do presidente.
Gilmar e o delator da JBS, Joesley Batista, tiveram um encontro nos últimos meses em que, segundo o juiz, foi discutido um julgamento do STF sobre negócio agrícola. No final do mês passado, o Folha de São Paulo tinha dado conta que Gilmar vendia gado à JBS, negociações que são feitas pelo irmão.
A edição do ano passado deste seminário tinha sido envolta em polémica por prever a presença de alguns dos protagonistas do processo então iniciado para a destituição de Dilma Rousseff como Presidente do Brasil, como o então senador Aécio Neves (entretanto afastado do cargo e que, de acordo com a delação, terá pedido subornos à JBS) e José Serra, ambos publicamente defensores do processo de "impeachment" da, à data, chefe de Estado.