Outros sites Medialivre
Notícias em Destaque
Notícia

O verdadeiro e falso nos vídeos de António Costa

António Costa fez sete vídeos a promover a virtudes do Orçamento do Estado, divulgados no Youtube e nas redes sociais. O Negócios seleccionou algumas das afirmações do primeiro-ministro e confrontou-as com os factos. Veja o resultado.

20 de Fevereiro de 2016 às 15:00
  • 18
  • ...
Costa diz que OE vira a página da austeridade. Vira mesmo?

É uma pergunta complexa, que está no centro do debate político actual e à qual é difícil dar uma resposta muito assertiva. No entanto, a forma como o primeiro-ministro coloca a questão faz com que ela não seja verdade. Se António Costa tivesse dito que virava a página da austeridade que afecta directamente as famílias, seria diferente: embora seja controverso, Costa teria bons argumentos para defender essa tese. Se dissesse que há austeridade, mas que a distribuição protege os mais pobres, também teria argumentos do seu lado. 

Assim, tendo em conta que o Governo antecipa uma melhoria de 0,2 pontos percentuais do saldo estrutural, este passa a ser um orçamento contraccionista, à custa de medidas de austeridade. O que não significa que não proteja mais as famílias e os portugueses mais pobres. 

 




A frase: "Este é um orçamento que quer virar a página da austeridade."


Comecemos pela forma mais simples de avaliar se este orçamento é expansionista ou contraccionista. O défice estrutural – défice orçamental, excluindo efeitos de ciclo económico e medidas extraordinárias – cairá entre 0,1 a 0,2 pontos percentuais do PIB potencial (180 a 360 milhões de euros). Esse é o saldo que melhor espelha aquilo que o Estado dá e tira à economia. Neste caso, esse saldo mostra que o Governo tira mais do que dá, uma vez que o défice diminui.

 

É isso que justifica o "não" da resposta. Contudo, existem algumas nuances a considerar. Embora haja austeridade, o Governo desenhou um conjunto de medidas que seguem uma estratégia diferente daquela que vinha sendo aplicada pelo Executivo anterior (por exemplo, optar por aliviar impostos directos e agravar indirectos). Que grupos são agora mais afectados por esta nova austeridade? Os números parecem mostrar que, de facto, este Orçamento do Estado protege mais as famílias. Segundo os valores apresentados pelo Governo para as suas medidas de austeridade e as contas feitas pelo Negócios, as famílias ficarão a ganhar cerca de 400 milhões de euros face a 2015. O mesmo exercício aponta que as empresas ficarão mais ou menos na mesma. Como desce então o défice? Contando essencialmente com o crescimento da economia.

 

O próprio Mário Centeno já disse que a austeridade continuará em 2016. Em entrevista ao Diário de Notícias, o ministro das Finanças admitiu isso mesmo. Pode dizer-se que a austeridade acabou? "Não. Continuamos com restrições [...] Virar a página da austeridade é um processo que tem de ser visto de forma gradual, implementado em cada exercício orçamental e sustentado num crescimento da economia que tem de casar bem com as alterações orçamentais." Porém, algumas frases antes Centeno também dizia que "se a austeridade significar que temos restrições mais fortes do que muitos países, nesse sentido o que nós estamos a fazer é uma redução da austeridade". No Parlamento, o governante preferiu outra formulação: "A austeridade entra no princípio do seu fim quando optamos por promover os rendimentos.
 

Porém, ao contrário do que sugere esta última declaração, o Governo também não pode dizer que haverá menos austeridade do que no último ano de governação de Passos Coelho. Embora o Orçamento prevesse uma ligeira redução do défice estrutural, 2015 trouxe até uma degradação de 0,5 pontos do saldo estrutural. 

 

O argumento em que o PS e o Governo mais têm insistido é que se trata de uma austeridade diferente. Isso sim, parece ser verdade. Desenhar um orçamento é fazer escolhas. Que escolhas foram então feitas pelo Governo? Apesar de contraccionista, este orçamento é progressivo? Para essa pergunta já temos diferentes respostas. Algumas análises na imprensa têm concluído que o orçamento beneficia mais quem tem salários mais elevados (a principal fonte para essas contas estará aqui). A opção por repor os salários dos funcionários públicos é um dos principais motivos para essa conclusão, uma vez que os cortes – considerados inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional, importa lembrar – só eram aplicados a quem ganhava mais de 1.500 euros. É uma das principais medidas do Governo.

 

Porém, existe outra análise que pode ser feita e que o Negócios já publicou: simulações sobre casos concretos. Esse método tem a vantagem de incluir medidas que, apesar de não constarem no Orçamento do Estado, dependem de decisões do Governo e que têm sido integradas pelo Executivo na sua estratégia de recuperação de rendimentos. É o caso da subida do salário mínimo de 505 para 530 euros.

 

Há uma semana, o Negócios escrevia com base nos cálculos da PwC que, da mesma forma que foi a classe média/alta que vive de rendimentos do trabalho (sobretudo do sector público) e de pensões quem mais sofreu com os anos de austeridade, também está entre os que mais ganham com a política de reversão dos cortes. Porém, as simulações da PwC também deixam claro que famílias muito pobres – dependentes de prestações sociais não contributivas - são os os que têm os maiores aumentos percentuais de rendimento. Por exemplo, um casal que três filhos e rendimentos mensais de 200 euros vê o seu rendimento mensal crescer 25%. Também os trabalhadores que recebem o salário mínimo verão o seu rendimento líquido crescer quase 5%. E os reformados com pensões baixas, embora tenham actualizações residuais das suas reformas, terão um aumento por via do Complemento Solidário de Idosos.  

Resumindo, este orçamento não reduz a austeridade e se vira a página é porque adopta uma austeridade diferente. O que o primeiro-ministro poderia ter dito, com propriedade, era que "este é um orçamento que queria virar a página da austeridade", mas a Comissão Europeia e os compromissos europeus não deixaram. 

 
Costa diz que diminui o IRS para 99,7% dos portugueses. Diminui?

Se o primeiro-ministro se refere apenas aos portugueses que pagam impostos, então é possível dizer que a generalidade vai mesmo pagar menos, com a redução na sobretaxa. Mas é preciso não esquecer que 46,3% das famílias já não pagam IRS, devido aos rendimentos baixos.



A frase: "Este é um orçamento responsável, que quer virar a página da austeridade, mas que quer garantir a diminuição do défice e a diminuição da dívida. Mas queremos fazer com as escolhas certas. Nós diminuímos o IRS para 99,7% dos portugueses. Mas compensamos aumentando a tributação da banca para o fundo de resolução."


A redução da sobretaxa de IRS vai trazer um alívio fiscal para a generalidade das famílias que pagam impostos. De facto, e de acordo com as simulações efectuadas pela PWC para o Negócios, todos ficam a ganhar face a 2015, mesmo os que estão no último escalão do IRS e não beneficiam da redução da sobretaxa. Isto acontece porque o Governo resolveu também actualizar os escalões do imposto em 0,5%, o valor da inflação esperada em 2015. A actualização é pequena, mas provocará, ainda assim, uma redução da carga fiscal.

Nesse sentido, António Costa tem toda a razão ao afirmar que o seu Governo diminui o IRS para 99,7% dos portugueses… que pagam impostos. Ficou foi por dizer que uma grande fatia da população já não paga um centavo porque tem rendimentos muito baixos. As estatísticas do Fisco não estão actualizadas, mas de acordo com os últimos números disponíveis, de 2013, verifica-se que quase metade dos agregados familiares não pagou IRS – na prática, só 53,7% das famílias tiveram IRS liquidado, devido aos níveis de rendimentos muito baixos. De lá para cá, pouca coisa terá mudado.

Depois, António Costa afirma que diminui o IRS, mas compensa "aumentando a tributação da banca para o fundo de resolução". Aumenta, de facto – sobe a taxa máxima aplicável (de 0,085% para 0,11%) e alarga-se o leque dos bancos que são abrangidos (passam a ser também as sucursais portuguesas de bancos estrangeiros). No entanto, com estas mexidas, o Governo estima arrecadar 50 milhões de euros, muito longe dos 430 milhões que vai deixar de encaixar com a redução da sobretaxa de IRS. Ou seja, para reduzir a sobretaxa foi preciso muito mais, além de aumentar a contribuição da banca, nomeadamente, um aumento de vários impostos sobre o consumo, como o ISP, o ISV ou o tabaco. 


António Costa diz que a carga fiscal desce. É verdade?

O primeiro-ministro diz que a carga fiscal vai baixar com este Orçamento. O assunto é polémico e deu azo a um aceso debate e muitos números diferentes. Com os números actuais e com base nas conclusões mais recentes da unidade que dá apoio técnico ao Parlamento pode concluir-se que a carga fiscal baixa de facto. Mas vale a pena ir aos detalhes.



A frase: "Este Orçamento do Estado diminuiu a carga fiscal e aumenta a justiça social. A carga fiscal diminuiu 0,2 pontos percentuais relativamente ao ano passado e até reduz 0,4 pontos percentuais relativamente ao compromisso que o anterior Governo assumiu no Pacto de Estabilidade e Crescimento." 

 

Tudo parece depender do conceito que se usa para calcular a carga fiscal e, nesta matéria, desde que o Orçamento do Estado foi entregue no Parlamento já houve várias versões, mesmo dentro do próprio Governo, o que tem alimentado a polémica em torno o assunto. Primeiro foi o relatório do Orçamento do Estado. O documento apontava para uma redução da carga fiscal em 0,2 pontos percentuais do PIB, o que resultava de considerar apenas a evolução das receitas fiscais (excluindo as contribuições sociais que financiam a Segurança Social).

 

Depois o Governo entregou uma errata ao documento onde admitia que a carga fiscal se mantinha estável face a 2015. Neste caso, o Ministério das Finanças considerava o conceito de carga fiscal mais alargado, que inclui além das receitas fiscais, as contribuições para a Segurança Social e os impostos sobre o capital.

 

E em que ficamos?

 

O Ministério das Finanças prefere concentrar a análise no "novo conceito" usado para medir a carga fiscal porque o aumento da receita com contribuições sociais não resulta de "qualquer alteração" nas taxas contributivas, mas sim do aumento do emprego, o que faz com que mais pessoas descontem para a Segurança Social.

 

É por este motivo que o Governo opta por destacar o conceito de carga fiscal que só tem em conta os impostos - onde aí sim há alterações nas taxas (os impostos sobre o rendimento baixam enquanto os impostos sobre o consumo sobem). Medida desta forma, a carga fiscal baixa efectivamente, de 25,4% para 25,2% do PIB. 

 

No entanto, não é este o conceito de carga fiscal que se costuma usar. Nos orçamentos anteriores os governos usavam a definição mais alargada para aferir o peso dos impostos e contribuições do PIB, que é utilizada pela Comissão Europeia e permite comparações internacionais. Usando este indicador, o nível de impostos na economia mantém-se igual ao ano passado.

 

Mas António Costa acrescenta mais dados para tentar provar que este Orçamento alivia os sacrifícios dos portugueses, ao adiantar que este Orçamento reduz a carga fiscal em relação ao compromisso assumido pelo Governo de Passos Coelho no Programa de Estabilidade, de Abril de 2015. E aí também tem razão. Naquele documento, o anterior Executivo previa que em 2016 a carga fiscal (medida pelo peso apenas das receitas fiscais) fosse de 25,6% do PIB, 0,4 pontos percentuais acima do que a carga fiscal projectada pelo actual Executivo para o mesmo ano.

 

Finalmente, de acordo com a Unidade Técnica de Apoio Orçamental, a entidade independente que dá apoio especializado aos deputados no Parlamento, a carga fiscal desce 0,3 pontos percentuais do PIB para 36,6% do PIB, usando um critério ainda mais alargado de carga fiscal, que inclui até as contribuições imputadas. Esta conclusão beneficiou de uma revisão em baixa do montante de contribuições sociais de cerca de 600 milhões de euros, adiantado pelo Ministério das Finanças numa nota explicativa sobre o Orçamento. Antes disso, as contas da UTAO apontavam para uma redução de 0,1 pontos na carga fiscal



Costa diz que OE cumpre o prometido. Cumpre mesmo?

António Costa diz que o Orçamento do Estado entregue no Parlamento cumpre o prometido aos eleitores do PS, o acordado com o BE, PCP e Verdes e também cumpre as regras europeias. Cumpre mesmo? 

O que, com rigor, António Costa poderia ter afirmado é que o Orçamento cumpre algumas propostas eleitorais do PS, boa parte dos compromissos assumidos com BE, PCP e Verdes e está em risco de não cumprir as regras acordadas pelo país no quadro da pertença à União Europeia e à Zona Euro.


A frase: "Este é um Orçamento que cumpre os nossos compromissos eleitorais, os nossos compromissos com os parceiros parlamentares e os nossos compromissos com a União Europeia".

 

Algumas medidas previstas no programa eleitoral do PS estão já implementadas ou previstas na proposta de Orçamento do Estado. É o caso da extinção da sobretaxa em sede de IRS, da reposição de salários no sector público, do aumento das pensões mínimas e do salário mínimo. A redução para 13% do IVA aplicada à restauração ficou a meio caminho, sendo intenção do governo baixar a taxa  para a comida, não para as bebidas.

Uma parte nuclear do programa eleitoral do PS não saiu ainda do papel. É o caso da descida da TSU para empresas e para os trabalhadores e do processo conciliatório para cessação de contrato de trabalho - ambos caíram por exigência expressa do Bloco de Esquerda - e da criação do complemento salarial anual para famílias de menores rendimentos, cujo arranque foi adiado.

A promessa número 1 do programa eleitoral do PS era "aumentar o rendimento disponível para as famílias". A proposta de Orçamento do Estado antecipa uma redução dos impostos directos: a arrecadação em sede de IRS deverá cair. Em contrapartida, as contribuições sociais e, sobretudo, os impostos indirectos sobem, pelo que o relatório da versão corrigida do Orçamento reconhece que a carga fiscal não baixa e o peso da receita total no PIB até sobe, de 43,9% para 44,1%.

Olhando agora para os compromissos assumidos pelo PS no âmbito das "posições comuns sobre situação política" que assinou com BEPCP e Verdes constata-se que várias medidas estão a ser implementadas, algumas das quais fora quadro da proposta de Orçamento do Estado. É o caso do regresso de quatro feriados, do fim das taxas moderadoras em casos de interrupção voluntária da gravidez, da revisão da cláusula de salvaguarda no IMI, da reposição dos complementos salariais nas empresas públicas e da reversão dos contratos de concessão nos transportes urbanos.

Já na "recompra" da TAP para ficar com 50% do capital "o Estado paga mas não manda", protestam BE e PCP, havendo ainda muitos pontos de interrogação sobre a redução da semana de trabalho para 35 horas na função pública – a sua entrada em vigor e, sobretudo, abrangência – dado que o governo diz que o fará, mas sem que isso implique custos, designadamente em horas extraordinárias.

Também a promessa feita pelo PS à esquerda de não despedir nem enviar funcionários públicos para o quadro de excedentários (ou "mobilidade") parece difícil de quadrar, agora com a promessa feita pelo PS à Comissão Europeia Bruxelas de que poupará 100 milhões de euros com a saída de 10 mil funcionários, apenas através da regra "saem dois, entra um".

Finalmente, a proposta de Orçamento do Estado está no limiar do aceitável pelas instituições europeias. 
O primeiro esboço enviado para a Comissão Europeia foi recusado por estar em risco de "grave" violação do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Nas contas de Bruxelas, o défice orçamental passaria de 3% (4,2% com custos da resolução do Banif) em 2015 para 3,4% do PIB em 2016.

Depois de o governo ter apresentado quase mil milhões de euros de medidas de austeridade adicionais – quase todas do lado dos impostos – a Comissão validou o esboço orçamental com reservas, evitando que este tivesse de ser formalmente devolvido a Lisboa, o que traduziria uma sanção política inédita.

Há três outros países (Itália, Áustria e Lituânia) que, na opinião da Comissão, secundada pelo Eurogrupo, estão também "em risco" de violar o Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) em 2016, mas nenhum deles está no chamado "braço correctivo" do PEC (porque têm défices já inferiores ao limite de 3% do PIB) e nenhum deles acaba de sair de um resgate. No caso de Espanha, Bruxelas também identificou risco de incumprimento, estando o processo parado à espera da tomada de posse de um novo governo. 

Este contexto e a recente subida das taxas de juro da dívida pública portuguesa – um sinal de que o risco de os mercados se fecharem, de um novo resgate, é real –  ajudam a explicar porque o governo português foi pressionado pelo Eurogrupo a assumir o compromisso de que vai preparar "desde já" um conjunto de medidas adicionais para accionar "quando for necessário". Portugal é, neste momento, o único país da União Europeia a quem foi pedido que tenha pronto uma espécie de plano B. O mais tardar em Maio, será analisado se será ou não preciso accioná-lo. Nesta semana, Jeroen Dijsselbloem, presidente do Eurogrupo voltou a afirmar que persistem "preocupações graves" em torno da situação o país.

Em suma, o que, com rigor, António Costa poderia ter afirmado é que o Orçamento cumpre algumas propostas eleitorais do PS, boa parte dos compromissos assumidos com BE, PCP e Verdes e está em risco de não cumprir as regras a que o país está sujeito decorrentes da sua pertença à União Europeia e à Zona Euro.

IMI tem novamente cláusula de salvaguarda. Mas beneficia quem?

Era uma promessa eleitoral e está mesmo na proposta de Orçamento do Estado (OE) um novo travão ao IMI, para evitar subidas bruscas. No entanto, dado que nenhuma está prevista, por agora de pouca utilidade será. Já os fundos vão mesmo pagar mais, como diz António Costa.


A frase: "Introduzimos uma cláusula de salvaguarda para que ninguém tenha que sofrer um aumento do IMI superior a 75 euros por ano. Mas em contrapartida eliminámos a isenção dos fundos de investimento imobiliário em IMI."

 

A proposta de OE contempla, tal como estava prometido pelo Governo, uma nova cláusula de salvaguarda no IMI. Na prática, se for aprovada tal como está, os prédios urbanos para habitação própria e permanente do sujeito passivo não poderão, em cada ano, suportar um IMI que seja superior ao do ano anterior em um de dois valores: ou 75 euros ou "um terço da diferença entre o IMI resultante do valor patrimonial tributário [VPT] fixado na avaliação actual e o que resultaria da avaliação anterior, independentemente de eventuais isenções aplicáveis".

 

Como se depreende da proposta, esta regra tem aplicação e cabimento sempre que um imóvel é sujeito a uma reavaliação do seu VPT. Ora a questão reside precisamente aí: em 2012 e 2013, as Finanças levaram a cabo uma avaliação geral de imóveis que actualizou o VPT de todos os prédios que não estavam ainda avaliados de acordo com as regras do Código do IMI, de 2004.

 

Nessa altura, porque muitos prédios registaram aumentos substanciais, já que há muito não eram avaliados, foi criada uma cláusula de salvaguarda em tudo idêntica a esta e que vigorou durante 2013 e 2014. Em 2015 já não se aplicou e, a partir daí, os proprietários já pagaram o IMI por inteiro. Logo, não vão beneficiar da cláusula agora recuperada pelo Governo.

 

Por outro lado, não há notícias de haver uma nova avaliação prevista para os próximos anos, havendo apenas as habituais correcções monetárias, o que esvazia, pelo menos para já, o campo de aplicação da cláusula de salvaguarda.

 

O primeiro-ministro afirma também que elimina a isenção dos fundos de investimento imobiliário em IMI. É verdade. Estes, que chegaram a estar isentos, já suportam agora 50% do imposto, passando, a partir do próximo ano, a ter de pagar a totalidade, tal como acontece com qualquer outro proprietário.



Costa diz que famílias vão poupar nas taxas moderadoras. É verdade?  

António Costa diz que baixa as taxas moderadoras e isso é verdade apenas para os utentes que sejam referenciados pela Linha de Saúde 24 ou pelos cuidados de saúde primários antes de ir para o hospital ou para o centro de saúde. Por outro lado, para três grupos específicos de utentes as isenções são alargadas.


 

A Frase:  "Hoje, para relançar a economia é fundamental repor os rendimentos disponíveis das famílias. […] Para toda a classe média, […] baixando as taxas moderadoras pagas pelo Serviço Nacional de Saúde".


António Costa aponta a reposição dos rendimentos disponíveis das famílias como estratégia para relançar a economia e, entre as medidas que constam no Orçamento do Estado, o primeiro-ministro destacou nesta frase a diminuição das taxas moderadoras no acesso aos serviços de Saúde. No vídeo, o primeiro-ministro fala do esforço poupado a "toda a classe média". Mas quem é abrangido pela redução das taxas moderadoras?

 

Primeiro é preciso esclarecer que não se trata da redução do valor das taxas moderadoras no geral, uma vez que os valores actualmente praticados se mantêm. O que muda é a política de isenção, que prevê a redução até 25% do valor total das taxas moderadoras.

Passará a haver isenção para todos os utentes que sejam referenciados pela Linha de Saúde 24, quer nos centros de saúde quer nas urgências. O objectivo? Filtrar os casos em que não é necessária uma deslocação a um serviço de saúde e "recompensar" quem faz uma utilização correcta do Serviço Nacional de Saúde, explicou o ministro da Saúde.

Além disso, os doentes ficam também dispensados do pagamento, quer nas consultas, quer nos exames, quando referenciados pela Linha de Saúde 24 (Centro de Atendimento do Serviço Nacional de Saúde) e pelo INEM.

Mas há mais: a primeira consulta de especialidade hospitalar também passa a ser gratuita quando o utente é referenciado pelo médico do centro de saúde. 


A proposta de Orçamento do Estado prevê também um alargamento das isenções do pagamento das taxas para três grupos específicos: os dadores benévolos de sangue e os dadores de células, tecidos e órgãos que ficam não só dispensados de pagar as taxas dos cuidados de saúde primários, mas também de saúde hospitalar. É também o caso dos bombeiros que só em exercício da sua actividade estavam isentos de pagar o uso de serviços hospitalares.

 

Por outro lado, mantêm-se sem alterações as isenções os menores de 18 anos, desempregados (com inscrição válida no centro de emprego) bem como o seu cônjuge e dependentes, grávidas, utentes em caso de insuficiência económica (utentes que integrem um agregado familiar cujo rendimento médio mensal seja igual ou inferior a 1,5 vezes o valor do Indexante de Apoios Sociais [IAS], equivalente a 628,83 euros) ou com um grau de incapacidade igual ou superior a 60%. Também transplantados, militares e ex-militares das forças armadas incapacitados ou requerentes de asilo e refugiados, respectivos cônjuges e descendentes directos continuam isentos. 


Apesar de em Janeiro o secretário de Estado da Saúde, Fernando Araújo, ter anunciado uma descida dos preços das taxas moderadoras, não se encontra na proposta do Orçamento do Estado qualquer referência a esta descida. O que se encontra, sim, é o cálculo da redução da receita do Estado: no total, os portugueses gastarão menos 35 milhões de euros em taxas moderadoras em 2016.

 


Costa garante que subida do ISP não vai aumentar custos dos transportes. Não vai?


As empresas de mercadorias antecipam impactos do aumento do ISP, podendo os custos subir até um milhão. Para as transportadoras de passageiros, a majoração nunca irá compensar o acréscimo dos custos com combustível.




A frase: "[As empresas] não têm de repercutir nem no preço do bilhete, nem no custo do transporte das mercadorias este aumento que vão ter. (…) Significa que todas as famílias que usam o transporte público não serão penalizadas por este aumento e as de mercadorias para exportar também não vão ter nenhuma penalização". 

As empresas de transporte não acreditam que o aumento do imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP) possa ser neutralizado com a majoração da dedução dos custos com os combustíveis. Antecipam uma subida das despesas, sendo que nem todas podem subir preços. 

 

No caso dos transportes de mercadorias, Gustavo Paulo Duarte, presidente da ANTRAM, diz que se as medidas "ficarem tal como estão" irão ter impacto para as empresas.

 

Ao Negócios, o responsável salientou que a medida de majoração destes custos no IRC é "nula" para as transportadoras, que podem acabar por ter aumentos de custos entre 50 mil e um milhão de euros, dependendo do tamanho das sociedades.

 

"Antes de subirmos os preços vamos ter movimentações", alerta o presidente da Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias, admitindo que isto "pode levar a protestos" das empresas. Recorde-se que as transportadoras de mercadorias protagonizaram protestos violentos que paralisaram o país, em 2008.

 

Nos últimos vídeos para explicar o OE, o primeiro-ministro não vê razão para que as empresas de transportes repercutam nos clientes o aumento do ISP, já que terão majoração acrescida sobre os custos com combustíveis. Diz ainda que esse não terá impacto no bolso das famílias que usem transportes públicos nem nas contas das empresas transportadoras.

 

Se nas mercadorias, as empresas têm a opção de subir os fretes, no caso dos transportes públicos de passageiros estão impedidas de mexer dos preços, sendo que este ano o Governo decidiu inclusivamente não actualizar tarifas.

 

Ao Negócios, Luís Cabaço Martins, presidente da Associação Nacional de Transportadores Rodoviários de Pesados de Passageiros (Antrop) considerou a medida do Governo muito limitada ao "só aproveitar às empresas que pagam IRC, de desta forma conseguem pagar um pouco menos".

 

Pelas suas contas, o efeito da majoração "nunca chegará para compensar o acréscimo de custos com combustível".

 

Para a Antrop, as empresas de transporte públicos de passageiros, nos quilómetros de serviço público que prestam, deviam ter uma isenção desses seis cêntimos de aumento do ISP. Porque caso contrário "estão em desvantagem porque não podem mexer nos preços".

 

A sugestão da associação envolve apenas aos quilómetros de serviço público, e não aos alugueres ou expressos, e, segundo Cabaço Martins, poderia ser facilmente posta em prática.  

Também  Carlos Ramos, presidente da Federação Portuguesa do Táxi (FPT), garante que a subida sobre o preço dos combustíveis terá um "efeito negativo" sobre a rentabilidade das empresas do sector. Até porque não haverá subida dos preços, que são definidos pelo Governo.

 

Ao Negócios, o responsável explicou que a FPT se reuniu na semana passada com o secretário de Estado do Ambiente, José Mendes, que prometeu aos taxistas uma "majoração de 120%" nos custos associados com o gasóleo.

 


O Orçamento permite baixar o défice e a dívida pública. É mesmo assim?

No Orçamento do Estado, o Governo prevê uma redução da dívida pública e do défice em relação a 2015. Porém, as projecções do Governo levantaram dúvidas junto da Comissão Europeia que pediu ao ministro das Finanças que apresentasse um plano B, com medidas adicionais. 

 

A frase: "Este é um Orçamento que permite uma gestão de rigor que diminuiu o défice e diminui a dívida pública".


É certo que o Orçamento do Estado para este ano prevê uma redução do défice e da dívida pública para este ano. Aliás, de acordo com os cálculos do Governo, o défice passa de 4,3% para 2,2% do PIB e a dívida pública baixa de 128,7% do PIB para 127,7%, entre 2015 e 2016. 


No entanto, a Comissão Europeia duvida que Portugal consiga com este Orçamento cumprir as metas orçamentais e, por isso, pediu ao Governo que preparasse um pacote de medidas adicionais para serem tomadas quando fosse necessário. O objectivo é evitar que Portugal falhe os compromissos europeus. 

O plano B tem de estar pronto até Abril, quando o Governo tem de entregar em Bruxelas o Programa de Estabilidade. Ou seja, o primeiro teste à veracidade desta declaração acontece já em Maio, quando a Comissão avaliar se Portugal precisa de implementar as medidas adicionais. 

A execução do Orçamento do Estado será a chave para a credibilidade do Orçamento. E nesta matéria foram identificados riscos, que podem penalizar o cumprimento das metas orçamentais. "Do nosso ponto de vista preferíamos mais medidas concentradas na despesa, e não tanto na receita. Mas esta foi a escolha do novo governo", disse o vice-presidente da Comissão.

Consciente da importância do controlo da execução do Orçamento do Estado - o próprio Governo tem destacado esse facto –, Mário Centeno adoptou algumas medidas de precaução, entre as quais o facto de a verba dos ministérios para a reversão salarial ter ficado guardada nas Finanças, de onde só sai com autorização de Centeno e do ministro da respectiva tutela. 

No que toca à dívida pública, o Ministério das Finanças começou por admitir uma descida da dívida para 125,8% do PIB, mas acabou por assumir uma meta de 127,7%. A "atitude mais prudente", como a classificou o próprio ministro das Finanças resulta do facto de o Governo ter optado por não contar com a poupança de juros em resultado de uma maior amortização do empréstimo do Fundo Monetário Internacional. 

Todos os meses, quando o boletim de execução orçamental for divulgado pela Direcção-Geral do Orçamento, a garantia que Costa dá agora em vídeo estará a ser testada. Porém, o exame final acontecerá apenas em Março de 2017, quando o Instituto Nacional de Estatística (INE) reportar ao Eurostat o défice e a dívida de 2016. Ou seja, não é possível dar já uma resposta definitiva sobre se com este Orçamento permite cumprir as metas fixadas, embora seja possível uma melhoria nos dois principais indicadores orçamentais.

Ver comentários
Saber mais Orçamento do Estado 2016 António Costa Vídeos Austeridade Carga Fiscal IMI ISP Taxas Moderadoras Défice Dívida
Outras Notícias
Publicidade
C•Studio