Notícia
Casalinho e PS divergem no alongamento da maturidade da dívida
Foi uma das propostas centrais do PS e do Bloco de Esquerda, mas não convence a presidente do IGCP, nem o ex-presidente do instituto. Paulo Trigo Pereira defende a ideia: “Quero convencê-la”, afirmou.
Foi uma das propostas do grupo de trabalho criado pelo PS e Bloco de Esquerda para melhorar a sustentabilidade da divida pública e os socialistas voltaram a defendê-la esta terça-feira, 19 de Setembro, no Parlamento. Paulo Trigo Pereira, que também foi um dos autores do relatório, apresentado em Abril, quer uma redução da maturidade média da dívida pública para dessa forma baixar a factura com juros, em particular nos próximos quatro anos. Cristina Casalinho não está convencida. Moreira Rato também não.
Na sua intervenção inicial no âmbito do grupo de trabalho parlamentar sobre a sustentabilidade do endividamento, e após notar que o peso da dívida pública se tinha mantido estável nos últimos quatro anos, mesmo com recessões e resgates a bancos, Cristina Casalinho antecipou uma redução da dívida nos próximos anos, acompanhada de uma estratégia de gestão da dívida assente num alongamento das maturidades - que alise o perfil de reembolsos - e na diversificação de investidores.
A maturidade média da carteira de dívida nacional é ligeiramente superior a 8 anos, o que compara "favoravelmente com o padrão internacional" e com o limite mínimo de 4 anos impostos ao IGCP por lei, avançou Cristina Casalinho. No documento produzido pelos peritos do PS e o Bloco de Esquerda era proposto, na altura, uma redução da maturidade média da dívida do Estado de 6,6 anos para 4,9 anos, para beneficiar de juros mais baixos.
"Quero convencê-la que temos razão", afirmou Paulo Trigo Pereira, dirigindo-se a Cristina Casalinho, para depois apresentar os seus argumentos para "reduzir, manter, mas nunca aumentar a maturidade da dívida". Na perspectiva do deputado socialista é essencial baixar os custos de juros nos próximos anos, um período que será marcado por "grande exigência orçamental" provocada por uma subida de despesas com PPP e com o "necessário" descongelamento das carreiras na função pública. "Nós temos que reduzir os juros da dívida pública, obviamente assegurando a sustentabilidade e o perfil futuro das amortizações", defendeu, acrescentando que "a maturidade de 8,5 anos está muito acima do que é obrigado".
Casalinho não ficou impressionada. Os próximos anos são exigentes "mas se calhar ainda serão mais exigentes no futuro", respondeu a Paulo Trigo Pereira, argumentado que as projecções de longo prazo para o efeito do envelhecimento nas contas públicas antecipa um acréscimo de mais seis pontos percentuais de PIB sobre a despesa social e de saúde.
Além disso, continuou, a maturidade de 8,5 anos é condicionada pelos empréstimos de longo prazo concedidos pelos fundos europeus de resgate que financiaram o país. "Em termos de financiamento propriamente dito [junto de investidores privados], nos últimos anos verificamos que a maturidade da divida emita tem vindo a diminuir", afirmou, defendendo que o alongamento de maturidades tem sido conseguido sem gerar um aumento relevante da despesa com juros.
2021, um ano de alto risco
Moreira Rato também defendeu a importância de estender maturidades, em particular num contexto de muito baixas taxas de juro. "Com taxas de juro historicamente baixas faz sentido estender maturidades", afirmou o ex-presidente do IGCP.
"Não devemos ver só este ano e o ano a seguir". Essa "é uma visão orçamental da dívida que é comum em vários países e fonte de tensão com os institutos de gestão de dívida", continuou Moreira Rato, reconhecendo que "a questão orçamental é o que mais preocupa os ministérios das Finanças, porque o ciclo político é mais curto que o ciclo da dívida". Mas, na sua opinião, "ainda é muito cedo para se pensar em puramente em custos de juros e não em estrutura de reembolso, defendeu.
Moreira Rato pautou a sua intervenção com um grau de preocupação elevado em relação aos riscos de acesso ao mercado que, embora tenham diminuído, não são despiciendos, defendeu. Por exemplo, "2021 é um ano de alto risco", com picos de reembolsos e incerteza sobre ciclo económico. Para o ex-presidente do IGCP a prioridade neste momento deve ainda ser "evitar uma crise de acesso ao mercado numa altura de grandes reembolsos", lembrando que "o não acesso aos mercados tem um impacto grande na população em geral, um programa de ajustamento tem custos sociais elevados".