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Portugueses comem 300 gramas de carne por dia
Já muito se disse sobre o que os portugueses comem ou deixam de comer, desde Isabel Jonet a Alexandre Soares dos Santos. Os dados do INE mostram que o consumo recuperou finalmente e que, em média, os portugueses comem o equivalente a dois bifes.
"Se não temos dinheiro para comer bifes todos os dias, não podemos comer bifes todos os dias". A frase de Isabel Jonet, presidente do Banco Alimentar Contra a Fome, incendiou as redes sociais e gerou enorme polémica. Volvidos mais de três anos, os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram que efectivamente os portugueses não tiveram outra alternativa senão cortar no consumo de carne durante o período de ajustamento e de maior austeridade. Em 2014, pela primeira vez em três anos, houve finalmente um crescimento do consumo de carne e os portugueses comem, em média, 300 gramas de carne por dia, ou seja o equivalente a dois bifes médios. O que, evidentemente, não significa que todos os portugueses tenham direito ao seu bife diário.
Segundo o INE, cada português come, em média, 108 quilos de carne por ano. Dividindo pelos dias do ano, conclui-se que os portugueses consomem, em média, 300 gramas por dia, o que equivale a cerca de dois bifes.
Mas que tipo de carne? A de porco é, de longe, a que é mais servida à mesa dos portugueses. Segundo o INE, em 2014 (não existem dados mais recentes), cada português comeu, em média, 43,9 kg de carne de porco. Segue-se, destacada, a carne de aves de capoeira, com 37,5 kg. Em comum, estes dois tipos de carnes têm o facto de serem comparativamente mais baratas. As carnes de bovino representam uma fatia menor no menu dos portugueses, com um consumo médio anual de 17,5 kg. Finalmente, as carnes de ovino e caprino, com 2,3 kg por habitante.
Diz-me que carne comes, dir-te-ei como vives
O consumo de carne é também um bom indicador sobre a situação financeira das famílias portuguesas. Em 2014, pela primeira vez desde 2009, o consumo deste tipo de alimentos voltou a subir. O longo período de austeridade, iniciado em 2010, mas muito acentuado com a chegada da troika, resultou numa quebra do consumo de carne, um fenómeno inédito desde 1985. Em três anos – 2011, 2012 e 2013 – houve uma redução de 8%, com nuances consideráveis em função do tipo de carne. Por exemplo, o consumo de vaca caiu, no mesmo período, 13%, enquanto as aves (onde se destaca o frango) registaram uma quebra marginal, de 0,5%.
Esta evolução vai ao encontro do que se conhece sobre o consumo de carne e a sua distribuição pelas classes sociais. A carne de vaca é mais consumida por famílias com uma boa situação financeira, enquanto as aves e o porco são uma prioridade para as famílias com menores recursos económicos. Além de ter um preço mais baixo que a carne de vaca, a proteína proveniente de suínos ou de aves pode ter um efeito multiplicador em termos de utilização gastronómica nos lares – como é o caso da canja de galinha ou do arroz de frango.
Isso mesmo indicou, em Março de 2012, Alexandre Soares dos Santos, na altura líder do grupo Jerónimo Martins. Ainda a troika não tinha um ano em Portugal, já o dono da cadeia Pingo Doce, em entrevista à SIC, alertava para o efeito da crise nas refeições dos portugueses: "Começou-se na carne de vaca, passou-se para o porco, para o frango e já se vai na salsicha".
A questão do consumo de carne também esteve no centro de uma grande polémica relacionada com declarações de Isabel Jonet. Em entrevista à SIC, em Novembro de 2012, a presidente do Banco Alimentar Contra a Fome criticou o facto dos portugueses viverem acima das suas possibilidades e deu o seguinte exemplo: "Se não temos dinheiro para comer bifes todos os dias, não podemos comer bifes todos os dias".
Embora os resultados sejam ainda provisórios, os dados do INE relativos ao ano passado para a suinicultura aponta que em 2015 tenha havido "um decréscimo dos preços à produção de 13,3%". Este desempenho, a confirmar-se, representa o "segundo maior decréscimo em termos absolutos desde 2000", avança o INE. É certo que o "índice de preços dos alimentos compostos para animais também decresceu", salienta o organismo, "mas de forma menos acentuada", recuando 1,5% em 2015. "Assim", conclui o INE, "a tesoura de preços IPP/IPAC", ou seja, a relação entre o índice de venda no produtor (IPP) e o índice de preço dos alimentos compostos para animais (IPAC), reflectiu "a situação mais desfavorável para o produtor dos últimos 15 anos". Recorde-se que a situação de abrandamento do consumo – sobretudo na Rússia e na China – têm levado, desde o ano passado, a uma situação de recuo dos preços da carne de suíno na União Europeia, que, a par do fim das quotas de leite a 1 de Abril de 2015, têm provocado o protesto dos agricultores, desde Bruxelas a Lisboa, passando por França. Em Portugal, a situação levou à criação do gabinete de crise pelo ministro Capoulas Santos, que ainda esta quinta-feira, se reúne com as associações e respectivas confederações de agricultores – CAP, Confagri, CNA.