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Economista-chefe do FMI: "Ninguém quer austeridade desnecessária"
Maury Obstfeld, no cargo há oito meses, vem pôr água na fervura sobre o alegado debate interno no FMI em relação ao sucesso da agenda "neoliberal" dos últimos anos. "Há limites para a dor que as economias podem aguentar", reconhece contudo.
O economista-chefe do FMI nega que as políticas austeritárias defendidas pelo Fundo tenham conduzido a mais desigualdade e que o papel da instituição no aconselhamento dos Governos destina-se apenas a ajudá-los a garantir a sua sustentabilidade orçamental.
Maury Obstfeld reagia a um artigo escrito por três economistas do Fundo, tornado público há uma semana pelo Financial Times, no qual se sugere que a receita "neoliberal" da instituição de Washington não teve os resultados positivos desejados e contribuiu para aumentar a desigualdade.
"Esse artigo foi largamente mal interpretado – não significa uma mudança drástica na abordagem do FMI. Ninguém quer austeridade desnecessária. Somos a favor de políticas orçamentais que sustentem o crescimento no longo prazo. Essas políticas variam de país para país e de situação para situação", afirmou Obstfeld numa entrevista publicada esta quinta-feira 2 de Junho no site do Fundo.
Em causa no artigo estava a análise das consequências de dois elementos específicos da actuação do FMI: a remoção de barreiras à circulação de capitais e a consolidação orçamental ("por vezes chamada 'austeridade'"), tendo os autores concluído que alguns aspectos da "agenda neoliberal" não tinham resultado como esperado: é difícil identificar benefícios em termos de crescimento em todos os países, há grandes custos de desigualdade e que por sua vez afectam a sustentabilidade de crescimento. "Mesmo que o crescimento seja o único propósito da agenda neoliberal, os defensores dessa agenda devem prestar atenção aos efeitos distributivos", advogaram.
"Evolução, não revolução"
De acordo com Obstfeld, há oito meses no cargo, a reflexão interna que está a ser levada a cabo pelo Fundo tem em conta os impactos das suas decisões em países membros e no sistema económico global, mas não passa por mudar os fundamentos da sua actuação. "É uma evolução, não uma revolução", argumenta. O objectivo é recolher contributos para chegar a resultados em actuações futuras "de forma sustentável".
"Às vezes, isso requer que reconheçamos situações em que cortes orçamentais podem ser contraproducentes para o crescimento e até para a sustentabilidade orçamental", afirma o economista-chefe da instituição que, entre 2011 e 2014, fez parte da troika que interveio em Portugal com um programa de resgate associado de 78 mil milhões de euros.
E exemplifica com o caso de Atenas, insistindo na necessidade de tornar sustentável a dívida do país: "Há limites para a dor que as economias podem aguentar, por isso especialmente em casos difíceis estamos a recomendar uma reestruturação ou redução de dívida, levando os credores a suportarem parte do custo de ajustamento. É o caso da Grécia".
(Notícia actualizada às 15:38 com mais informação)