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"O futuro está na complementaridade"

Manuel Ramalhete, director de Planeamento Estratégico da Galp Energia, considera que a eficiência energética é a principal solução para a situação actual do planeta em termos ambientais

02 de Junho de 2011 às 10:36
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A situação actual do ambiente no nosso planeta podia ser melhor se a consciência dos efeitos negativos do uso dos combustíveis primários tivesse ocorrido mais cedo. Mas, para Manuel Ramalhete, director de Planeamento Estratégico da Galp Energia, chegar aqui era inevitável.

Alterações climáticas, emissões de gases com efeito de estufa, poluição, aquecimento global. Quais foram os principais erros da humanidade para se chegar a este estado de coisas?
A situação actual era praticamente inevitável. Poderia não ter hoje exactamente este grau, mas teria esta ordem de grandeza. Basta pensar que a população mundial cresceu cerca de quatro vezes desde 1900, para sete mil milhões de habitantes, e que os seus rendimentos aumentaram cerca de 25 vezes.

As grandes determinantes do consumo de energia são, por isso, o crescimento populacional - porque as pessoas a utilizam directamente, ou indirectamente nos produtos e serviços que consomem - e o crescimento económico. Se este não existisse o aumento do consumo de energia iria dar-se a taxas menos elevadas. Em complemento a esses dois "drives" dos consumo, temos, numa segunda escala, a urbanização crescente da sociedade e o fenómeno da globalização acentuada. Qualquer delas potencia o consumo de energia e, consequentemente, as emissões, uma vez que a maior parte da energia é de origem fóssil. Chegámos à situação actual no que respeita ao ambiente, porque só recentemente se começou a ter consciência dos impactos negativos associados à utilização intensiva de energia fóssil. Mas era inevitável chegarmos aqui. A situação actual podia ter um impacto inferior se a consciência dos efeitos negativos tivesse ocorrido mais cedo.

O caso mais paradigmático do despertar tardio são os Estados Unidos, país altamente desenvolvido e consumidor de energia. Se tivessem agora a eficiência energética dos países europeus ou o Japão, a situação do planeta seria um pouco melhor.

Quais são as soluções que adianta para se conseguir pelo menos manter o estado de desenvolvimento actual da humanidade e preservar o futuro da Terra como a conhecemos?
Entrámos, após a consciencialização sobre os impactos ambientais do uso de combustíveis fósseis, numa fase de diversificação energética e na aposta em energias complementares de forma equilibrada. Julgo que vamos precisar de todas. Mas também não podemos abdicar da energia fóssil, porque a humanidade não está preparada para uma mudança rápida. Tem de ser gradual.

A principal solução é a eficiência energética, porque tem a ver com comportamentos e pode ser efectivada em todo o mundo. Só depois podemos considerar o uso de outras formas de energia, de forma equilibrada, para garantir que o nível de desenvolvimento da humanidade se mantém. As energias renováveis terão um peso crescente. O petróleo continuará a ser utilizado, mas terá um peso decrescente, tal como o carvão. A energia nuclear, depois do que aconteceu na central de Fukushima, no Japão, poderá entrar em discussão, mas transitoriamente, pois há futuro ela até porque as centrais actuais são muito mais seguras do que as do passado. A energia do futuro, segundo os cientistas, será mesmo a da fusão nuclear, e podemos estar à distância de 30 a 40 anos para que seja economicamente viável.

Haverá, pois, o uso de uma relação equilibrada de fontes de energia. Mas não é fácil de definir qual. O grande desafio da política energética é conseguir a melhor afectação de recursos disponíveis para determinados objectivos. É um princípio simples, mas a importância relativa dos objectivos pode mudar com o tempo. Uma crítica às políticas dominantes, sobretudo na Europa, é ter praticamente uma prioridade: o ambiente. Mas é preciso manter uma relação equilibrada entre os objectivos da política energética - segurança de abastecimento, competitividade e sustentabilidade ambiental -, para mantermos o actual nível de desenvolvimento. Para isso, é necessária uma política que tenha em conta estes três factores. Quando se considera apenas um podem cometer-se erros. Ou seja, podemos ter uma situação ambiental muito boa e uma situação económica quase insustentável.

A cimeira da Terra de Cancún foi um passo em frente em relação a Copenhaga? Quais as ilações que se podem tirar dos seus resultados? O que esperar de Durban?
Não foi um passo em frente, mas também não foi um passo atrás. Ainda não há um consenso sobre o que fazer em relação ao problema ambiental. Os diagnósticos estão feitos, mas muitas das medidas obrigam a decisões com impacto económico e o consenso é difícil. Por isso, acho que, na linha de Copenhaga, foi um pequeno passo positivo.

Também não estou excessivamente optimista em relação à Cimeira de Durban, na África do Sul. Os países que estão mais na linha da frente em relação às questões ambientais são os europeus. Como são aqueles que vivem uma situação económica mais difícil em termos globais, haverá tendência para passarem os problemas relacionados com o ambiente para segundo plano. Os avanços dependerão também da vontade de países como a China, o maior consumidor de energia actual, para um consenso mais firme em relação ao ambiente.

Mas a China já evoluiu positivamente?
Já, mas o grande acréscimo no consumo de energia será na China e na Índia. Por isso é fundamental que estes países, não só assumam compromissos, mas também que os cumpram.

O que é se pode esperar para o futuro do planeta onde vivemos?
Estou relativamente optimista em relação ao futuro do planeta, porque a humanidade sempre resolveu os seus problemas. Às vezes, isso implica muita discussão. Também muito tempo, mas as soluções são encontradas. A história demonstra-o. Basta olharmos para o último século. Apesar de termos passado por duas guerras tremendas, a humanidade evoluiu de uma forma incomparável. Também acredito que a ciência saberá dar resposta às necessidades da humanidade, como sempre o fez até agora. Para mim a solução energética do futuro será a fusão nuclear, viável provavelmente em meados deste século. Até lá seremos capazes de encontrar soluções transitórias para chegar a essa solução mais sustentável.
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