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Virgolino Faneca revela o verdadeiro responsável pelo estado da Caixa

Virgolino Faneca aponta o dedo ao Manuel da ourivesaria, um estouvado incumprimento que devia 2,70 euros à Caixa. É por causa de clientes destes que o banco está cheio de imparidades.

28 de Outubro de 2016 às 17:00
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CII. Caro Emílio

Serve a presente para refutar o teor da carta que me enviaste, na qual tecias duras críticas à Caixa Geral de Depósitos. Admito que o passado do nosso banco possa não ter sido brilhante, em matéria de concessão de crédito e afins, mas a verdade é que o tempo mudou e existe agora um rigor que mede meças ao alemão, embora os alemães não sejam agora um bom exemplo por causa do Deutsche Bank. Mas, pronto, como quando um gajo profere a palavra alemão as pessoas associam a coisa a comportamentos espartanos e impolutos, é preferível manter o logro.

Para que não julgues que os meus argumentos se baseiam em conversa fiada, vou dar-te um exemplo concreto desta nova gestão, muito mais prudente, destinada a evitar o surgimento de novos buracões financeiros. O caso aconteceu com o Manuel da ourivesaria. Estava ele na loja quando recebeu uma carta da Caixa Geral de Depósitos. A princípio ainda pensou que fosse um postal de boas festas, mas sendo ainda Outubro descartou mentalmente esta possibilidade e, para não prolongar a angústia especulativa, abriu a dita. Foi aí que a espinha se lhe arrepiou. "1.º Aviso de Incumprimento", em título, seguido do explicativo, "relativamente à operação a seguir indicada, não foi possível cobrar o montante em dívida".

O Manuel ficou lívido. Há 23 anos que está a pagar um empréstimo à habitação feito na Caixa, só lhe faltam dois para terminar a via sacra e nunca tal lhe tinha acontecido. As mãos tremeram à procura do valor do incumprimento (será que se tinha esquecido de pagar a prestação?) e quando lá chegou leu 2,70 euros, ou, por extenso, dois euros e setenta cêntimos. Ó ignomínia, o Manuel devia 2,70 euros e foi tratado como merecia, isto é, como um infractor grave. "Solicitamos que proceda ao seu pagamento com a maior urgência. Aproveitamos para esclarecer que a falta de pagamento do montante em dívida determinará a oportuna comunicação ao Banco de Portugal no âmbito da Central de Responsabilidades de Crédito em situação de incumprimento", informava secamente a Caixa.

Ora isto prova que a Caixa trata de igual forma todos os clientes, quer sejam eles devedores de dois euros e setenta cêntimos ou dois milhões e 700 mil euros. O Manuel pagou de imediato os 2,70 euros, mas está convencido de que a malta que deve dois milhões e 700 mil euros ou soma parecidas é a responsável pelas imparidades que o banco teve de registar. Eu mostrei o meu desacordo e argumentei que de pequenino é que se torce o pepino, acrescentando que, de grão a grão, enche a galinha ao papo e concluindo, com toda a assertividade, que mais vale dois euros e setenta cêntimos na mão do que dois milhões e 700 mil euros a voar. Além disso, há que ter compreensão para com os clientes que devem muito dinheiro, porque a culpa não é deles, mas sim da economia, de muitas outras abstracções e do próprio banco que lhe emprestou o dinheiro. Um tipo como o Manuel, que devia 2,70 euros, tem de ser chamado à atenção para não andar a gastar o dinheiro em raspadinhas. E mais nada.

Um abraço com cobertura deste que te estima,

Virgolino Faneca

Quem é Virgolino FanecaVirgolino Faneca é filho de peixeiro (Faneca é alcunha e não apelido) e de uma mulher apaixonada pelos segredos da semiótica textual. Tem 48 anos e é licenciado em Filologia pela Universidade de Paris, pequena localidade no Texas, onde Wim Wenders filmou. É um "vasco pulidiano" assumido e baseia as suas análises no azedo sofisma: se é bom, não existe ou nunca deveria ter existido. Dele disse, embora sem o ler, Pacheco Pereira: "É dotado de um pensamento estruturante e uma só opinião sua vale mais do que a obra completa de Nuno Rogeiro". É presença constante nos "Prós e Contras" da RTP1. Fica na última fila para lhe ser mais fácil ir à rua fumar e meditar. Sobre o quê? Boa pergunta, a que nem o próprio sabe responder. Só sabe que os seus escritos vão mudar a política em Portugal. Provavelmente para o rés-do-chão esquerdo, onde vive a menina Clotilde, a sua grande paixão. O seu propósito é informar epistolarmente familiares, amigos, emigrantes, imigrantes, desconhecidos e extraterrestres, do que se passa em Portugal e no mundo. Coisa pouca, portanto.



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