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Um país queimado pelo fogo é um país de luto

Os incêndios foram o acontecimento nacional do ano.

Bruno Colaço/Correio da Manhã
Filipa Lino flino@negocios.pt 22 de Dezembro de 2017 às 12:00
As imagens de satélite divulgadas pela NASA mostraram as colunas de fumo vistas do espaço. Portugal estava a arder. 15 de Outubro foi considerado pelas autoridades o "pior dia do ano" em termos de incêndios florestais. Foram contabilizados 500 focos espalhados por todo o território que provocaram a morte a 42 pessoas. Mas o penoso teste do fogo, que mostrou de forma clara as fragilidades da Protecção Civil, começara quatro meses antes.

Com a tragédia de Pedrógão Grande, a 17 de Junho, abrimos os olhos da maneira mais dolorosa para a realidade da desertificação e do isolamento do interior. Morreram 65 pessoas e mais de 200 ficaram feridas. As imagens de terror, pintadas de negro, ainda estão na nossa memória e correram mundo. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, abraçou e beijou as vítimas e prometeu que não iria deixar esquecer a tragédia que assolou a região centro do país. As famílias das vítimas reclamaram justiça, o Governo prometeu uma reforma da floresta e a reconstrução rápida das casas e das empresas afectadas.

Este ano, o fenómeno do fogo foi atípico. Ouvimos especialistas a falar sobre as alterações climáticas, a excessiva cultura do eucalipto, a falta de limpeza da floresta (tanto por parte dos privados como do Estado), sobre a desatenção das autoridades para quem vive nas zonas mais despovoadas e também a criticar a forma como está montado o dispositivo de combate a incêndios. O Parlamento constituiu uma comissão técnica independente para analisar o que falhou.

O relatório e a queda da ministra

O relatório dos peritos, que analisou incêndios em 11 concelhos dos distritos de Leiria, Coimbra e Castelo Branco, ocorridos entre 17 e 24 de Junho, refere que, apesar de o fogo de Pedrógão ter tido origem em descargas eléctricas na rede de distribuição, um alerta precoce poderia ter evitado a maioria das 64 mortes registadas. E deixa claro que "não foram mobilizados totalmente os meios disponíveis" no combate inicial e que existiram falhas no comando dos bombeiros.

Além disso, o documento aponta para falta de conhecimento técnico no sistema de defesa florestal e falta de preparação dos actuais sistemas de combate às chamas para as alterações climáticas, confirmando, por outro lado, falhas de comunicação do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP).

Na sequência dos fogos de 15 de Outubro, a ministra da Administração Interna pediu a demissão, admitindo, numa carta dirigida ao primeiro-ministro, que "não tinha condições políticas e pessoais para continuar no exercício deste cargo". Constança Urbano de Sousa revelou no documento tornado público que logo a seguir à tragédia de Pedrógão solicitou "insistentemente" a António Costa que a libertasse de funções, mas que o Chefe do Executivo lhe pediu para se manter no Governo.

Seis meses depois, ainda há muito a fazer na reconstrução das casas ardidas. Nem todos já terão a sua habitação de volta no Natal, como desejava Marcelo Rebelo de Sousa. Na floresta, já se vêem pontos verdes a rebentar na terra queimada. A vida renova-se. Mas, para quem viveu a tragédia do fogo, há feridas que dificilmente irão sarar.


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