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O trabalho dá felicidade? E a felicidade? Dá trabalho?

Uma comunidade junta-se em palco para fazer nascer um espectáculo. Carregam cartazes, garrafões de água, mesas. Nessa coreografia, em simultâneo, trabalham e buscam a felicidade. Terá ela a mesma forma num futuro distópico?

21 de Abril de 2018 às 14:00
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A Manual on Work and Happiness
Depois da estreia na Grécia, a peça do projecto ARTEMREDE chegou ao Montijo, onde esteve no passado fim-de-semana no Cinema-Teatro Joaquim d'Almeida. A próxima etapa será em Alcobaça, a 11 e 12 de Maio, no Cine-Teatro João d'Oliva Monteiro. Sempre com a assinatura da companhia Mala Voadora.


Imagine o ano de 2140. Imagine que é eliminada a sensação de sofrimento em relação à morte ou que os cães podem reclamar a falta de atenção dos donos através de um dispositivo tecnológico. Imagine que sensores elevam a sinestesia à potência máxima: vai poder ver a música, cheirar as cores, tocar os sabores.

Os relatos de um futuro distópico vão-se sucedendo em "A Manual on Work and Happiness". Há uma clarividência e - porque não? - um carácter profético no texto de Pablo Gisbert. Os sinais que o presente nos dá permitem antever algumas das imagens traçadas pelo dramaturgo.

Será impossível andar debaixo do sol sem protecção? A União Europeia vai desintegrar-se? As fronteiras serão traçadas com perigosas linhas infravermelhas? Os rostos dos migrantes serão dispostos em catálogos como escravos sexuais? E a nossa canção preferida, será ela o resultado adaptado de um algoritmo?

"A Manual on Work and Happiness" não faz questão de responder. É mais importante deixar as perguntas no ar, enquanto a estrutura do espectáculo - rápido, dinâmico - nos revela como o trabalho em comunidade é capaz de fazer a diferença. Agora e no futuro.

A peça faz parte do projecto de cooperação cultural ARTEMREDE e, a cada cidade onde passa, irá convocar a população para uma residência artística. A estreia mundial teve lugar em Patras, na Grécia. A segunda paragem coube ao Montijo, antes de partir para Alcobaça. Há ainda, em Julho, uma apresentação em Pergine, Itália. Já para a próxima temporada, chega a Lisboa e ao Porto.


Um grupo de pessoas (não necessariamente ligadas ao teatro) segue um manual de instruções para montar um espectáculo. E isso, por mais divertido que seja, dá trabalho. Em palco, facilmente se reconhece a estética (e lógicas de repetição) que Jorge Andrade e José Capela têm cultivado ao longo dos últimos anos com a companhia Mala Voadora.

Sem esquecer de integrar a genuinidade (e um certo desconforto) de quem é novo nas lides do teatro, criam-se percursos e gestos que marcam o ritmo de "A Manual on Work and Happiness". Sobretudo com o movimento permanente dos cartazes que criam a palavra "Work". Como parte de uma coreografia, em que entram os garrafões de água que os sustentam, eles estão quase sempre presentes. Work, work, work. Trabalhar, trabalhar, trabalhar. Como uma necessidade intrínseca ao ser humano.

E é daí que pode emergir a felicidade. Porque o conceito de felicidade, ele próprio, está dependente da noção de trabalho. Se nos julgamos felizes quando não estamos a trabalhar, sentiríamos o mesmo se não existisse a ideia de trabalho para fazer esse contraste? A questão fica a remoer num belíssimo monólogo interpretado por Vítor d'Andrade, o único actor profissional neste palco. A felicidade é então uma condenação do ser humano, uma obrigação consciente. Vamos atrás dela como nosso objectivo primordial, alheios à tragédia e à barbárie que nos rodeia.

"A Manual on Work and Happiness" é como essa busca pela felicidade: nunca termina. Por isso mesmo, toda a informação necessária, para que o espectáculo seja posto de pé, pode ser descarregada da internet a partir de Julho. Qualquer grupo, em qualquer parte do mundo, poderá seguir o movimento. Basta que tenha vontade de trabalhar. E, em última instância, de ser feliz.


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