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Desinformação em tempos de guerra e pandemia

A guerra na Ucrânia e a pandemia agitaram as águas da desinformação. O fenómeno das “fake-news” parece inquietar cada vez mais cidadãos. Mais de metade dos europeus frisam mesmo que as notícias falsas deveriam ser consideradas ilegais e que os estados deveriam punir criminalmente quem as dissemina ou reforçar essa punição. Grande parte desconhece a existência de legislação que já prevê alguns mecanismos para sancionar informação falsa
Susana Torrão 17 de Dezembro de 2022 às 11:00

A informação surge aparentemente comprovada: primeiro-ministro gasta 9.400,60 euros em almoço de celebração dos 100 anos do nascimento de José Saramago. Estudantes que protestam contra o uso de combustíveis fósseis deixam cartazes acumulados junto a contentores do lixo em Lisboa. Estes são exemplos de notícias falsas que circularam recentemente nas redes sociais portuguesas. Na verdade, a fatura exibida no Twitter não correspondia ao almoço de António Costa, e a fotografia dos cartazes tinha sido tirada em 2018, em Aljezur.

 

A proliferação de informações falsas nas redes sociais é uma realidade, e os europeus parecem estar cada vez mais atentos. Na última edição do European Tech Insights, realizado pelo Center for the Governance of Chance da IE University, em Segóvia, 42,3% dos inquiridos elegeram a desinformação e as "fake news" como os principais problemas das redes sociais. Segundo o estudo, 51,5% dos europeus defendem que a desinformação deve ser considerada ilegal e consideram também que os Estados devem punir criminalmente quem a dissemina.

 

"Em 2021, a maioria dos europeus acreditava que as ‘fake news’ que circulam nas redes sociais deviam ser controladas pelas plataformas e não pelos governos – 55% dos inquiridos defendiam então que plataformas como o Facebook e o Twitter deveriam ser responsáveis pela moderação dos conteúdos, e apenas 27% consideravam que caberia aos governos fazê-lo. Em 2022, o nosso inquérito mostrou uma mudança de opinião", explica Alex Roche, diretor associado do Center for the Governance of Change.

 

Para o responsável, a súbita mudança de opinião a favor da intervenção estatal (de 27% para 51,5%) deve-se, em boa parte, à guerra na Ucrânia, já que 42,2% acreditam ter sido vítimas de "fake news" relacionadas com o conflito. Ainda assim, reflete Alex Roche, há diferenças assinaláveis entre os países (Portugal não está incluído no inquérito), com a proximidade geográfica a desempenhar um importante papel na forma como a realidade é percecionada. "Nos países do Leste europeu, próximos da Ucrânia e da Rússia, as pessoas sentem-se mais expostas a ‘fake news’ relacionadas com o conflito: 68,5% dos estónios, 64,7% dos polacos e 54,7% dos romenos. Nos países da Europa Ocidental, só entre 15,6% e 39,7% sentem o mesmo."

 

"Quando se pergunta às pessoas se acham que as ‘fake news’ deveriam ser ilegais, a maioria responde que sim, sem pensar que a legislação permite punir essas mesmas ‘fake news’ desde que atentem contra a legislação de um país democrático", lembra Miguel Crespo, jornalista e investigador do CIES-ISCTE. O artigo 6.º da Lei 27/2021 (Lei dos Direitos Digitais) consagra precisamente o "direito à proteção contra a desinformação". O Estado compromete-se a assegurar o cumprimento em Portugal do Plano Europeu de Ação contra a Desinformação.

 

O interessante, defende o investigador, é o facto de existir cada vez maior consciência dos cidadãos dos perigos que as notícias falsas representam "para si próprios, para as suas comunidades e para a democracia". Geralmente, a "punição" passa pela eliminação das publicações.

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