Levantar voo na Praça do Comércio, sobrevoar a Sé e o Castelo de São Jorge, ver a Ponte 25 de Abril e o Cristo Rei com a mesma perspetiva das gaivotas, flutuar sobre Belém e os seus principais monumentos, seguindo depois o rio até Cascais e partir em voo até Sintra com "visita" a Monserrate e ao Palácio da Pena antes de aterrar na Quinta da Regaleira… Esta viagem, criada pela VR Tours e disponível no Lisboa Story Centre, não é feita de balão ou de planador, mas sim com recurso à realidade virtual.
"Muitas pessoas dizem que é uma forma de perceberem como a cidade está distribuída e que monumentos querem ver. É algo que as ajuda a organizar as visitas e a decidir como querem conhecer os locais", explica Bernardo Sá Nogueira que, em conjunto com Rui Machado, criou as VR Tours. Ao longo dos últimos dois anos, a experiência tem atraído tanto o público nacional como estrangeiro e é encarada de diferentes formas. Pode servir o propósito de preparar a visita. Mas também é muito interessante ver um monumento que já se conhece a partir de uma nova perspetiva: "uma coisa é ver a Torre de Belém ou o Castelo de São Jorge do chão, outra é sobrevoá-los. Temos uma visão completamente diferente", sublinha Bernardo.
As imagens foram captadas por um drone, com uma resolução de 11 K, e depois transformadas pela VR360, uma empresa de Aveiro. "A filmagem é feita com uma bola que tem uma série de lentes a toda a volta e cada uma filma uma película. Por exemplo, uma bola faz nove filmes diferentes que depois se sobrepõem e são encaixados de modo a garantir uma visão 360", explica Bernardo Sá Nogueira. Para aceder a esta realidade, o visitante tem de subir a uma plataforma hidráulica que acompanha os movimentos do filme e colocar uns óculos de realidade virtual com um campo visual de 180 graus. "Equivale ao nosso campo visual e dá uma sensação de maior realidade. Veem-se imensas pessoas a esbracejar ou a mexer os pés, porque dá mesmo a sensação de se estar a voar", diz o criador das VR Tours.
Um segmento a crescer
Um pouco por todo o mundo, o setor do turismo está a recorrer às tecnologias da internet do futuro. De acordo com os dados da Market Data Forecast, o mercado do turismo virtual, a nível global, estava avaliado em 385,75 mil milhões de dólares em 2022, prevendo-se que chegue quase aos 848 mil milhões em 2028.
Em 2022, o mercado do turismo virtual, a nível global, estava avaliado em 385,75 mil milhões de dólares, prevendo-se que chegue quase aos 848 mil milhões em 2028.
A forma mais conhecida de turismo virtual são as visitas em tempo real, criadas por empresas como a Discover Live ou a Wowzitude, que recorrem ao Zoom e a guias locais para realizarem percursos interativos, em que o visitante pode colocar perguntas ou até pedir alterações ao trajeto. Inicialmente pensado para pessoas mais idosas ou com algum tipo de limitação física, este tipo de soluções passou também a ser usado como sistema de apoio à decisão na programação das férias.
A realidade virtual permite uma experiência mais imersiva e é usada tanto em experiências como a criada pela VR Tours como por entidades oficiais ou operadores turísticos. Tanto pode ser utilizada pela experiência em si, como para fornecer uma camada suplementar de informação, como sons de um ambiente particular durante uma visita. A isto soma-se a vantagem de garantir experiências impossíveis de realizar no mundo real.
O recurso à realidade aumentada também está a crescer dentro do universo do turismo. Ao funcionar como uma porta de entrada digital, colocada no local onde se encontra o visitante, os portais de AR estão associados a um grande poder imersivo e permitem soluções que vão desde as "viagens no tempo", em que o visitante pode "ver" a ruína onde se encontra no seu estado inicial, à possibilidade de ter um museu aberto 24 horas - sendo a visita feita por realidade aumentada nos momentos em que está fechado ao público -, passando pela chamada "arte viva", em que os quadros de um museu ganham um caráter interativo.
Em Londres, o British Museum recorreu à realidade aumentada para acrescentar camadas de animação às peças expostas, com mais informação para o visitante. Nos Estados Unidos, a cidade de Filadélfia criou o "Revolutionary Philadelphia", um circuito turístico que recorre à realidade aumentada, e, em Nova Iorque, a aplicação Tunnel Vision NYC permite uma visualização interativa do mapa do metro da cidade.
Outra possibilidade são as chamadas "viagens imaginárias", que entram já no domínio da fantasia, por não serem de todo possíveis no mundo real. Um exemplo são as "viagens no tempo" disponibilizadas no simulador de viagens da plataforma de jogo online Roblox, criada por um "gamer".
Virtual é mais "verde"?
A maior acessibilidade - física e económica - a destinos que, de outra forma, estariam inacessíveis a algumas franjas da população é uma das vantagens apontadas às soluções do turismo virtual. Há ainda quem defenda que é uma opção ambientalmente mais sustentável por estar associada a uma redução das emissões de gases com efeito de estufa.
Em julho, um artigo publicado na revista The Environmental Magazine analisava o alegado aspeto "verde" desta forma de turismo. E se é verdade que há menos emissões e que, além do mais, o turismo virtual pode ajudar a minimizar impactos em ecossistemas ou monumentos históricos mais frágeis, o facto de estarem fortemente ancorados em tecnologia confere-lhes uma pegada ambiental que não pode ser ignorada.
Da energia e recursos necessários à produção e ao descarte dos dispositivos, ao consumo energético associado ao seu funcionamento, há vários contras a pesar numa identidade supostamente verde do turismo virtual.
Além de que o eventual abandono - ou a diminuição - das viagens e visitas reais também pode pôr em causa a fonte de rendimentos de algumas comunidades fortemente dependentes do turismo. O ideal será assim, defende o artigo, conjugar os dois tipos de turismo - real e virtual - e aliá-los a práticas que garantam uma redução dos impactos ambientais.
Até porque, como refere Bernardo Sá Nogueira, nada bate uma viagem no mundo real. "O turismo virtual não substitui a experiência real. Pode existir uma complementaridade grande entre um e o outro. A realidade virtual permite-nos, sem ir a um sítio, conhecer e ter uma experiência que, de outra forma, seria muito difícil de concretizar. Ir às ilhas Fiji é muito caro e é muito longe! Poder explorá-las de uma maneira espetacular durante meia hora. É divertido, mas nunca vai substituir uma ida ao local".