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Em Portugal continuam a registar-se grandes discrepâncias entre homens e mulheres no que respeita às oportunidades profissionais e nos aspetos salariais, revela um novo estudo sobre diversidade, equidade e inclusão (DEI), realizado pelo BCSD Portugal em parceria com a Ernst & Young.
Segundo a análise "Diversidade, Equidade e Inclusão no meio empresarial português", que incidiu sobre um universo de 73 empresas e 96.757 colaboradores, cerca de 60% da força de trabalho é composta por colaboradores acima dos 43 anos.
O género masculino é o que apresenta maior progressão dentro das organizações. À medida que a progressão para cargos de liderança avança, a representatividade do género feminino diminui, com uma representação que se inicia em 49,3% nas funções de administrativos e operacionais e diminui para uma representação de 27,3% na direção executiva.
"O estudo indicou uma clara disparidade de representação de género em diferentes categorias funcionais, uma discrepância que se acentua em funções de maior liderança. As funções enquadráveis nas categorias de direção executiva e gestão e coordenação são representadas, maioritariamente, pelo género masculino, com uma representação de 72,7% e 66,1%, respetivamente.
O estudo apurou ainda que, nas empresas que constituíram a amostra, 66,3% das promoções internas foram atribuídas ao género masculino, perpetuando a desigualdade de género nas categorias funcionais de maior liderança", explica Maria João Coelho, Head of Sustainability Knowledge do BCSD Portugal, ao Negócios. Esta realidade, explica, "é resultado de questões culturais enraizadas e vieses inconscientes relacionados com a associação dos papéis de liderança ao género masculino. Além disso, o equilíbrio entre a profissão e a família continua a ser mais difícil para o género feminino".
O género masculino também tende a receber um vencimento mais alto do que o género feminino, em particular nos cargos de direção executiva, onde, dentro da mesma organização, por cada euro auferido pelos homens, as mulheres ganham, em média, apenas 89 cêntimos.
Questionada sobre que impacto isto provoca junto das colaboradoras, Maria João Coelho salienta que "o estudo não permite concluir sobre o sentimento que especificamente provoca nas executivas, mas foi possível verificar a partir dos resultados do questionário de auscultação que os líderes apresentam uma perceção mais positiva do que os colaboradores em termos das práticas de DEI da sua empresa, sendo que os líderes são maioritariamente do género masculino".
O estudo indica também que o género feminino é o que possui mais contratos a tempo parcial e o masculino contratos de trabalho temporário.
Segundo o estudo do BCSD Portugal, as organizações têm vindo a recrutar um maior número de colaboradores do género masculino, uma vez que, em 100 contratações realizadas, cerca de 57 são homens. No que se refere à retenção e progressão de talento na organização, verifica-se uma maior aposta no género masculino, uma vez que apenas 33,7% das promoções internas foram de colaboradores do género feminino.
O que estão a fazer as empresas
Quando questionados sobre como é que a sua empresa desenvolve e implementa a DEI, 42,4% dos colaboradores assinala a opção "Não sei". Também existe desconhecimento de 48,8% dos colaboradores em relação às práticas da sua organização no que toca à escolha de fornecedores e parceiros de acordo com os valores DEI.
No que concerne à organização e gestão do tema, 30,7% apontam o Departamento de Recursos Humanos como principal dinamizador de DEI na empresa. Do estudo resulta, também, que, globalmente, os líderes apresentam perceções mais positivas que os colaboradores em relação às políticas de DEI.
O estudo apurou, no entanto, que existe um compromisso com DEI ao nível da liderança, a predominância do sentido de justiça na dimensão da cultura de empresa, e a atração e seleção de talento na dimensão relativa a processos & políticas. Por oposição, os pontos menos positivos, mostram onde deverão ser canalizados os principais esforços das empresas. Nomeadamente, as lideranças devem olhar com atenção para a comunicação da DEI; tornar a cultura da empresa mais inclusiva e ao nível das políticas deverá apostar-se em formação.
Para Maria João Coelho, estes dados evidenciam que "em muitos casos a comunicação e transparência precisam de ser fortalecidas. As empresas devem intensificar a comunicação interna, mantendo os colaboradores informados sobre os responsáveis de DEI, as práticas em curso e os benefícios associados".
Questionada sobre a jornada da Leroy Merlin Portugal nesta matéria, Sara Sousa, responsável de Gestão e desenvolvimento de Talento, deu conta de que o primeiro passo da empresa foi "compreender e investigar a existência de alguma disparidade salarial entre os géneros dentro da nossa empresa. Esta análise foi o ponto de partida para definirmos um plano de ação para colmatar estas diferenças, o que nos levou a um gap salarial próximo de 0% ao dia de hoje".
Como parte integrante deste plano de ação está um mecanismo que permite alocar um orçamento específico para mitigar este gap durante o processo de revisão salarial, bem como um conjunto de medidas que garantem o reconhecimento das colaboradoras mesmo em período de ausência por licenças de gravidez/maternidade, explica. Para além disso, "continuamos a monitorizar de perto e de forma frequente estes indicadores, através de um dashboard criado para o efeito. Esta informação é partilhada com toda a empresa para que haja uma sensibilização cada vez maior para o tema", acrescenta Sara Sousa.
Para a responsável, a formalização de uma equipa dedicada ao tema e o lançamento da estratégia de DEI "foi o momento de viragem e o início do caminho que seria feito com todos e para todos. O facto deste programa estar integrado nos objetivos estratégicos da empresa permite reforçar a importância do tema e garantir um maior envolvimento e compromisso de todos".
Também o Grupo Ageas Portugal ediz estar a fazer esse caminho. "Definimos uma estratégia de diversidade e inclusão onde temos o compromisso de corrigir o gender pay gap que ainda exista, sendo uma prioridade para a nossa comissão executiva", salienta Flávia Nobre, responsável de Sustentabilidade. Para atingir os objetivos, a empresa está a desenvolver programas específicos de desenvolvimento de carreira para mulheres e a promover paridade de género nos planos de sucessão de carreira. "Estando ativamente a trabalhar sobre esta matéria, estamos igualmente conscientes que ainda há um caminho a percorrer", salienta Flávia Nobre.
Para esta organização, a chave está na transparência das políticas e posicionamentos adotados. Para esta responsável, "a área de DEI deve ter uma governance e estratégias claras, promovendo ações de sensibilização e comunicação, desenvolvendo a proximidade às pessoas da organização e a disponibilidade da área para o acompanhamento e resolução de temas concretos". Neste sentido, o grupo está a desenvolver uma comunicação interna "clara e eficiente", a promover a relação com as lideranças e a formação interna, entre outras ações. "O fundamental é adaptar a solução àquilo que é o contexto e especificidades de cada momento de maturidade de DEI em cada empresa", defende.