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A/c da família Espírito Santo

A família Espírito Santo decidiu colocar a sucessão no BES na agenda no pior "timing" possível. Assistir à cadeia de comunicados do braço familiar dos Ricciardi e do conselho superior do banco, há precisamente uma semana, trouxe à memória outra inquietante cadeia de comunicações públicas: a de Vítor Gaspar e de Paulo Portas e as suas demissões.

Parece que os Espírito Santo, tal como os Portas e Gaspares, não percebem a situação de emergência que os rodeia, preocupando-se mais com o legado individual do que com o interesse colectivo. 


No caso do Governo, os danos foram tão irreparáveis como vão ser mais dolorosos os termos finais do ajustamento financeiro para os portugueses. Mas no caso de José Maria Ricciardi e Ricardo Salgado o mais surpreendente é que são eles próprios as vítimas de um processo de descredibilização aos olhos de potenciais accionistas, muito semelhante ao de Portugal aos olhos de potenciais compradores de dívida pública. De fora, ninguém compreenderá as motivações desta "guerra" aberta no topo de uma instituição que pode vir a precisar de novo fôlego de capital nos próximos meses.

Senão, vejamos: O nível de solidez do banco ("core tier 1") está nos 10,4%, o mais frágil entre os grandes bancos, que apresentam rácios à volta dos 12% e que no caso do BPI e Santander Totta chegam mesmo aos 15%.

Na limpeza dos balanços, o BES é o banco mais atrasado. As imparidades para cobrir créditos que ficam por pagar ou a desvalorização de imóveis no balanço continuam a crescer (+42% nos primeiros nove meses), quando a maior parte dos rivais já está noutra fase desse processo, depois de fortes aumentos de provisões no passado. Nomeadamente, a Caixa, que diminuiu este indicador em 36%, ou o BPI, em 24%.

E nos resultados líquidos, o BES não resistiu e caiu este ano para prejuízos de 381 milhões de euros quando os outros já estão a diminuir perdas (BCP, por exemplo, apesar da maior dimensão) ou a continuar delicadamente em terreno positivo (BPI e Totta).

O BES tentou tudo para travar a entrada do Estado, mas ao ir por aí prescindiu de uma arma eficaz na limpeza dos efeitos da crise: o envelope de 12 mil milhões de euros disponibilizados pela troika para isso mesmo.

E agora entra-se precisamente na fase mais importante dessa estratégia, quando o Banco de Portugal está apertar o cerco para garantir a transição para as regras europeias, quando a carteira de imóveis devolvidos pelos clientes está sob pressão da desvalorização do mercado, e numa altura em que o BCE intensifica a vigilância antes de assumir a supervisão decorrente da união bancária.

O BES arriscava-se a ficar sozinho no quartinho dos bancos descapitalizados, só à conta da estratégia de alto risco seguida para superar a crise. Mas, se ainda por cima, tiver de lidar com a descredibilização externa devido a zangas familiares (independentemente da legitimidade das motivações, o caso dá ao BES uma imagem de "negócio familiar" que sempre conseguiu evitar), aumenta consideravelmente a probabilidade de Ricciardi e Salgado terem de explicar os seus planos de sucessão não só aos outros membros da família, mas também aos representantes nomeados pela ministra das Finanças, como já acontece no BCP, BPI e Banif.

*Editor de Empresas

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