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29 de Março de 2004 às 15:10

Uma farsa chamada IRC

Fossem as declarações de impostos um espelho aproximado da realidade e teríamos a maioria dos empresários como legítimos beneficiários do rendimento mínimo garantido. Porque não passa pela cabeça de ninguém que seja possível a sobrevivência de um tecido e

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Fossem as declarações de impostos um espelho aproximado da realidade e teríamos a maioria dos empresários como legítimos beneficiários do rendimento mínimo garantido.

Porque não passa pela cabeça de ninguém que seja possível a sobrevivência de um tecido económico onde mais de metade das empresas diz que acumula prejuízos ao longo de anos sucessivos.

Esta falsidade das declarações tributárias, que salta aos olhos até dos mais distraídos, é demasiado antiga. E nela podemos rever o país que funciona com permanentes expedientes e truques para fugir às mais básicas obrigações legais, sociais ou de cidadania.

É igualmente chocante a continuada incapacidade de governos e da máquina fiscal em atacar o problema. Com os dados da cobrança de IRC que são apresentados nesta edição podemos desfazer alguns mitos que muitas vezes são construídos à volta das nossas empresas e empresários.

Um deles é saber quem são afinal, nesta matéria, os lobos e os cordeiros. As maiores empresas, algumas cotadas, outrasmultinacionais, são as que pagam a generalidade da factura. Porque são grandes e lucram muito, é verdade.

Mas também porque os mecanismos laterais de fiscalização a que se sujeitam (desde logo porque estão sobre o permanente escrutínio dos mercados de capitais) impedem que pisem demasiado o risco da subfacturação ou da ocultação de prejuízos.

Do lado oposto temos os negócios mais pequenos, onde é legítimo concluir que se usa e abusa daqueles esquemas. Outro mito tem a ver com a real importância do nível da taxa de IRC para a competitividade de muitas PME.

É que para mais de metade das empresas, Portugal funciona como um verdadeiro paraíso fiscal. Elas auto-excluem-se do pagamento do imposto sem que sejam penalizadas por isso. Será que a descida da taxa de IRC vai alterar alguma coisa para estas empresas e para a sua competitividade?

Duvida-se. Diferente é o caso das que realmente pagam imposto. Essas sim, podem ganhar e vão ganhar. É quando olhamos para estes números que não podemos deixar de nos indignar com os protestos contra o remendo do Pagamento Especial por Conta e as alegadas dificuldades que ele veio trazer à generalidade das pequenas empresas.

Só um país demasiado habituado a não pagar impostos é que pode levantar-se quando lhe pedem, por especial favor, que contribua com alguma coisa. É uma injustiça para algumas empresas que vivem verdadeiras dificuldades, sem dúvida.

Mas injustiça muito maior é este regabofe de só pagar quem quer, quanto quer e quando quer.

P.S. - Só para que conste: José Manuel de Mello, promotor do Manifesto dos 40 em defesa dos centros de decisão nacionais, acaba de vender a Soponata a americanos.

O cheque, de 342 milhões de euros, é mais um documento interessante no dossier do patriotismo dos empresários.

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