Opinião
Ajardinamento
No final da última assembleia geral do BCP alguém disse que a prioridade devia ser tirar o banco dos jornais. Se esse é o objectivo, é caso para dizer que estão a fazer precisamente o contrário.
O primeiro erro foi logo na saída de Paulo Teixeira Pinto. Quando o momento aconselhava à discrição, Jardim Gonçalves preferiu um evento de grande visibilidade, no horário de abertura dos telejornais, para apresentar o sucessor que tinha preterido dois anos antes.
Os erros sucederam-se no posicionamento face às iniciativas desenvolvidas por Pedro Teixeira Duarte para chegar a uma solução de consenso sobre um novo modelo de governo que reflectisse a experiência recente e a necessidade de os accionistas terem maior influência no banco. A fazer uma trajectória para ganhar equidistância em relação ao líder histórico, de quem era um tradicional apoiante, Teixeira Duarte viu os seus esforços travados por Jardim Gonçalves, que preferiu trazer para dentro do órgão que tutela a discussão sobre o modelo societário.
Jardim quer “normalizar” a vida do BCP e que a discussão se faça nos órgãos próprios porque não é normal que os estatutos de uma empresa sejam discutidos na praça pública. O problema é que, quanto mais ele puxa a discussão para dentro, mais ela sai para fora. Porque a situação que se viveu no BCP está longe de ser classificada de “normal” e as suas consequências vão perdurar muito para além daquela que podia ser a causa próxima – a ruptura entre Jardim e Teixeira Pinto – e o seu desfecho.
Além da questão de fundo. Está o líder histórico disponível para enfrentar sem complexos a mudança de estatutos e deixar cair o actual modelo, que lhe confere apreciável poder, ou, pelo contrário, acha que o Millennium não pode prescindir da sua experiência e sabedoria, o que torna inaceitável qualquer mudança que o relegue para uma função meramente consultiva? E vai aproveitar a impossibilidade prática de reunir uma maioria qualificada para deixar tudo como está.
Parece que Jardim Gonçalves se arrependeu de ter abandonado a presidência executiva do BCP. E ao tentar reparar o erro está a protagonizar o que vai ser um “case study” das escolas de gestão do que não se deve fazer num processo de sucessão.
O BCP tornou-se a novela da economia nacional. Como em todas novelas, está a abusar da paciência do telespectador.
Esticar o argumento coloca dois problemas. Por um lado, há muito boa gente que começa a ficar com os dedos a arder, sobretudo se comprou acções com financiamento. Investidores que reforçaram no auge da guerra, entre Maio e Agosto, registam menos-valias apreciáveis, o que se aplica a partidários dos diversos lados da barricada, desde alguns dos membros do “grupo dos sete”, à Teixeira Duarte ou à Eureko.
O segundo problema é o de eternizar a controvérsia, prolongando a discussão pelo menos até à assembleia geral de Março. Pode fazer sentido poupar o banco à realização de uma quarta assembleia de accionistas em 2007. Mas as tensões contidas pela terceira via preconizada pela Teixeira Duarte podem regressar em pleno com o ajardinamento da discussão.
Em plena crise, houve um momento em que ficou claro que Paulo Teixeira Pinto fazia parte do problema mas já não fazia parte da solução. Mas nem todos são tão rápidos a chegar a idêntica conclusão.