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Por Tortus caminhos

Enquanto o buraco para o qual o País se atirou parecia não ter fundo, os investidores que apostaram na desvalorização dos activos fizeram fortunas.

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Enquanto o buraco para o qual o País se atirou parecia não ter fundo, os investidores que apostaram na desvalorização dos activos fizeram fortunas. Obrigações de dívida pública. Bancos e grandes empresas cotadas. Todos foram alvo dos "short sellers". Portugal ter deixado de ser pasto fértil para esta estratégia mostra o quanto já se progrediu. A percepção dos investidores mudou. Mas as percepções são voláteis. É nisso que aposta a Tortus Capital Management, um "hedge fund" americano, que diz estar a "shortar" a dívida portuguesa.


A Tortus lançou este mês um sítio, onde aloja uma apresentação com o título "Reabilitar Portugal". Em 63 cuidados "slides", repletos de gráficos, argumenta que o País não tem como escapar a uma reestruturação da dívida, com perdas para os credores privados (o endereço on-line é http://rehabilitatingportugal.com).


A estratégia de comunicação da Tortus denota algum desespero. Não é habitual um "hedge fund" criar um "site" e uma apresentação para seduzir outros investidores. Ainda que o uso dos media e das redes sociais para difundir opiniões e influenciar o rumo dos mercados seja já um hábito entre os investidores activistas, como Bill Ackman e Carl Ichan.


Se o preço das obrigações portuguesas subir, em vez de cair, a Tortus incorre em pesadas perdas. E as coisas não estão a correr bem. A bolsa valoriza em linha recta. Subiu na segunda-feira pela oitava sessão consecutiva, somando 8% desde o início do ano. Desde que entrámos em 2014, as taxas de juro implícitas da dívida pública já recuaram tanto como em 2013. O Tesouro colocou com sucesso uma emissão de dívida de médio e longo prazo na semana passada, no mesmo dia em que foi divulgada a apresentação.


Mas a Tortus acredita que a coisa vai dar para o torto. "A situação de Portugal e a sua dívida pública são insustentáveis", diz o "site". Pelo que os investidores privados "correm o risco de uma reestruturação". Um dos argumentos é de que mesmo com o equilíbrio nas contas públicas, o peso da dívida no PIB só descerá com um crescimento nominal da economia de 3,5%, o que parece difícil de atingir face ao fraco potencial de crescimento económico. E isto assumindo que o Estado consegue refinanciar-se com aquele nível de juros.


A reestruturação da dívida é então a solução para reabilitar Portugal. O fundo apresenta-a como se tratasse de um desejo altruísta. Há tiradas como: "O povo português carrega aos ombros injustamente todo o fardo do ajustamento, enquanto os especuladores lucram". Ver um "hedge fund", o tipo de fundo conotado com as práticas mais agressivas da especulação financeira, usar os mesmos argumentos que os partidos mais à esquerda do espectro político português... Só pode ser desespero.


Há também argumentos falaciosos. Como dizer que "não virá mais apoio oficial para proteger" quem investiu na dívida portuguesa. A troika diz insistentemente o contrário. Outros factos são torcidos para servir a tese da Tortus.


Há dois ou três anos a iniciativa poderia ter conseguido outro eco nos media e agências internacionais. Até agora, não teve crédito, além de alguns "blogs" especializados em informação financeira. Cabe ao Governo e aos líderes europeus garantir que a Tortus perca dinheiro na aposta que fez.

 


averissimo@negocios.pt

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