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O proteccionismo não vai proteger empregos em lado nenhum

Infelizmente, a longa história do proteccionismo comercial mostra que este raramente assume a forma de um ataque cirúrgico.

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Os líderes políticos dos Estados Unidos e da Europa estão preocupados com o futuro dos empregos de qualidade, mas fariam melhor em olhar para os problemas maiores que enfrenta a Ásia em desenvolvimento – problemas que ameaçam colocar pressão sobre os salários mundiais. Na Índia, onde os rendimentos per capita são cerca de um décimo do que nos Estados Unidos, mais de dez milhões de pessoas por ano estão a deixar o campo, deslocando-se para as áreas urbanas e, frequentemente, não conseguem encontrar trabalho nem mesmo como chaiwalas, muito menos como programadores informáticos. A mesma angústia que os americanos e europeus têm sobre o futuro dos empregos é verificada na Ásia, mas com uma magnitude maior.

 

Deve a Índia seguir o modelo tradicional de exportação da produção, do qual o Japão foi pioneiro, e muitos outros, incluindo a China, seguiram? Em que é isso resultaria se, nas próximas décadas, a automatização vai fazer com que muitos desses empregos fiquem obsoletas?

 

Isto é claro no sector dos serviços, onde 80% da população nas economias desenvolvidas trabalha, e no qual o sector do outsourcing da Índia continua a liderar a nível mundial. Infelizmente, também neste sector, o caminho que está pela frente não é suave. Os sistemas automatizados já suplantaram uma parte substancial do negócio mundial de chamadas e muitos dos empregos rotineiros de programação estão também a perder terreno para os computadores.

 

O progresso económico da China pode ser a grande história dos últimos 30 anos, mas o país enfrenta desafios semelhantes. Ainda que seja mais urbanizada do que a Índia, a China também está a tentar trazer dez milhões de pessoas por ano para as cidades. Entre os empregos que são perdidos para a automatização e a concorrência dos países com salários mais baixos, como o Vietname e o Sri Lanka, integrar novos trabalhadores está a tornar-se cada vez mais difícil.

 

Recentemente, o crescimento do proteccionismo mundial piorou esta situação que já era difícil, como pode ser exemplificado pela decisão da Foxconn (a maior fornecedora da Apple), de investir 10 mil milhões de dólares numa nova fábrica no Wisconsin. Os 13 mil novos postos de trabalho nos Estados Unidos são um montante baixo quando comparados com os 20 milhões (ou mais) que a Índia e a China têm de criar todos os anos, ou mesmo comparado com os dois milhões que os Estados Unidos precisam.

 

Os Estados Unidos e a Europa podem ter alguma margem para fazer com que o comércio seja mais justo, dado que Trump diz que o vai fazer. Por exemplo, muitas siderurgias chinesas têm controlos de poluição de última geração, mas estes podem ser desligados para poupar nos custos. Quando o resultado é um excesso de produção que chega aos mercados mundiais a baixo preço, os países ocidentais têm justificação para tomarem medidas.

 

Infelizmente, a longa história do proteccionismo comercial mostra que este raramente assume a forma de um ataque cirúrgico. Muitas vezes, os principais beneficiários são os ricos com contactos políticos e os perdedores são os consumidores que pagam preços mais altos.

 

Os países que se fecham demasiado à concorrência externa perdem eventualmente a sua vantagem, o que tem impacto na inovação, no emprego e no crescimento. Por exemplo, o Brasil e a Índia historicamente sofreram com políticas comerciais voltadas para o consumo interno, embora ambos os países se tenham tornado mais abertos nos últimos anos.

 

Outro problema para a maioria das economias ocidentais é que há muito que estão profundamente ligadas com as cadeias de abastecimento mundiais. Mesmo a administração Trump teve de reconsiderar o seu plano para sair do Acordo de Comércio Livre da América do Norte depois de ter compreendido que grande parte das importações norte-americanas oriundas do México têm muito conteúdo americano. Criar tarifas elevadas pode custar tantos empregos americanos como mexicanos. E, claro, se os Estados Unidos subirem bruscamente as tarifas sobre as importações, uma grande parte dos custos vão passar para os consumidores na forma de preços mais elevados.

 

O comércio vai também certamente permear o sector dos serviços. O Amazon Mechanical Turk (que foi assim chamado devido à máquina do século XVIII que jogava xadrez e que na verdade tinha uma pessoa escondida lá dentro) é um exemplo de uma nova plataforma que permite aos compradores contratar tarefas pequenas e muito específicas (como, por exemplo, programar ou transcrição de dados) com taxas salariais de terceiro mundo. O slogan inteligente da Amazon é "inteligência artificial, artificial".

 

Mesmo que os proteccionistas pudessem fechar tarefas de outsourcing, qual seria o custo? Para ser claro, as plataformas de serviços online precisam de ser reguladas, como a experiência inicial com a Uber demonstrou. Mas, dado o elevado número de empregos que a Índia e a China precisam de criar todos os anos, e com a internet a continuar a ser altamente permeável, é insensato pensar que as economias desenvolvidas podem reduzir significativamente as exportações de serviços.

 

Como é que devem os países lidar com o avanço implacável da tecnologia e do comércio? No futuro próximo, melhorar a educação e as infra-estruturas pode ser importante. Enquanto o resto do mundo se debatia com as consequências da crise financeira de 2008, a China continuou a ampliar as suas cadeias de abastecimento e a sua logística.

 

Num mundo onde as pessoas provavelmente terão de mudar de emprego frequentemente e, por vezes de forma radical, são necessárias grandes mudanças na educação dos adultos, sobretudo através da aprendizagem online. Por último, e não menos importante, os países precisam de instituir uma redistribuição mais forte através dos impostos e das transferências. As políticas comerciais tradicionalmente populistas, como aquelas que foram expostas por Trump, não funcionaram bem no passado e provavelmente vão ter um desempenho pior agora.

 

Kenneth Rogoff, antigo economista-chefe do FMI, é professor de Economia e Políticas Públicas na Universidade de Harvard.

 

Copyright: Project Syndicate, 2017.
www.project-syndicate.org

Tradução: Ana Laranjeiro

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