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11 de Fevereiro de 2016 às 20:00

Fechar as lacunas de competências da Ásia

Apesar das diferenças entre os vários países asiáticos, alguns pontos fracos nas políticas e sistemas concebidos para impulsionar o desenvolvimento de competências são endémicos.

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A Ásia enfrenta um desafio de capital humano. Ao longo das últimas três décadas, ganhos significativos na dimensão e qualidade da força de trabalho ajudaram a Ásia a tornar-se um centro importante para as cadeias de suprimento globais – e, assim, a sustentar um rápido progresso em direcção a níveis de rendimento e padrões de vida de economias avançadas. Mas com os trabalhadores cada vez mais incapazes de corresponder às exigências do mercado de trabalho, o sucesso notável do desenvolvimento da região poderá ser prejudicado.

 

A Ásia tem muitos jovens trabalhadores qualificados. Mas, num momento de modernização industrial e uma cada vez maior sofisticação tecnológica, os conhecimentos e competências adquiridos na escola são muitas vezes insuficientes. Como resultado, o desemprego jovem, o subemprego e a insatisfação no trabalho estão a crescer.

 

Em toda a Ásia, uma parte significativa dos trabalhadores sente que tem excesso ou falta de qualificações para os seus empregos, enquanto os empregadores muitas vezes lamentam a falta de quadros qualificados. Um estudo da Manpower Grupo mostra que 48% dos empregadores tiveram dificuldade em preencher vagas na Ásia em 2015, em comparação com 28% em 2006. Ao mesmo tempo, muitos graduados universitários – incluindo uns incríveis 45% na Coreia do Sul – têm dificuldades em encontrar emprego.

 

Apesar das diferenças entre os vários países asiáticos, alguns pontos fracos nas políticas e sistemas concebidos para impulsionar o desenvolvimento de competências são endémicos. Entre os mais prejudiciais está a incapacidade de muitos países para transmitir as competências certas através dos exames de admissão e da formação no local de trabalho.

 

Na Índia, por exemplo, apenas 0,8% dos alunos, em média, frequentou o ensino técnico e profissional ao nível secundário de 2006 a 2010. O sistema de formação e educação técnica e profissional do país (TVET, na sigla inglesa) tem capacidade suficiente para formar menos de um quarto dos 13 milhões de pessoas que entram no mercado de trabalho todos os anos. O TVET raramente está disponível para trabalhadores das pequenas e médias empresas (PME) ou do sector informal, e recebe muito pouco financiamento público.

 

Além disso, em toda a Ásia, a falta de envolvimento das empresas privadas – potenciais empregadoras – enfraquece ainda mais a capacidade dos sistemas TVET para responder adequadamente às mudanças no mercado de trabalho, reduzindo assim a empregabilidade pós-graduação. No Bangladesh, Indonésia e Sri Lanka, menos de um quarto das empresas dá formação aos trabalhadores. A escassez de professores bem qualificados e de uma governação eficaz agrava a situação.

 

Os governos em toda a Ásia devem arranjar formas de transformar os seus sistemas de educação e formação, para que os trabalhadores adquiram as competências de que necessitam para impulsionar o crescimento económico e a produtividade – a chave para melhores empregos e salários mais altos. Mais importante ainda, os governos precisam de tornar a aquisição de competências numa característica central das políticas nacionais de desenvolvimento. Num momento de rápida mudança, a educação e a formação profissional devem ser coordenadas com as políticas industriais e de comércio para melhorar as hipóteses de as exigências do mercado de trabalho serem correspondidas.  

 

Além disso, os sistemas de educação gerais e os TVET precisam de ser reestruturados. Em muitos países asiáticos, a educação formal é muitas vezes excessivamente académica ou simplesmente de baixa qualidade, o que prejudica a empregabilidade dos estudantes e a sua capacidade de colherem maiores benefícios dos TVET. Para serem eficazes, as escolas do ensino secundário e superior devem produzir graduados com competências sociais, tais como a comunicação e o trabalho em equipa, e competências técnicas relevantes. Aqui, parcerias mais fortes entre educadores e empregadores para desenvolver padrões curriculares, criar oportunidades de estágio e fornecer financiamento ajudariam muito.

 

Quanto aos sistemas de TVET, é preciso melhorar a sua capacidade e qualidade. Com os governos a melhorarem a sua capacidade de supervisão, coordenação e regulação do sistema TVET, o treino real das competências deve ser deslocado para o sector privado, para que o sistema possa responder de forma eficaz à evolução da procura no mercado.

 

Para este fim, os governos deveriam incentivar as parcerias público-privadas viradas para a identificação das necessidades não satisfeitas do mercado de trabalho, o estabelecimento das prioridades políticas dos sistemas TVET, a formação de professores e a implementação de mecanismos de partilha de custos. Os governos também devem garantir um melhor acesso aos sistemas de TVET para os grupos desfavorecidos, incluindo crianças de famílias pobres e áreas rurais e trabalhadores das PME e do sector informal.

 

Tendo em conta que o desafio de actualizar os sistemas educacionais e de treino de competências é compartilhado por toda a Ásia, os governos nacionais não devem trabalhar de forma isolada. Uma maior partilha de tecnologia e de conhecimentos, especialmente no que diz respeito ao desenvolvimento curricular e formação de professores, bem como intercâmbios de estudantes e peritos, reforçaria consideravelmente os esforços de todos. Além disso, promover uma maior mobilidade dos estudantes/trabalhadores e melhorar a flexibilidade do mercado de trabalho, tanto dentro dos países como em toda a região, contribuiria para melhorar a alocação de trabalhadores qualificados.

 

Nas próximas décadas, a Ásia continuará a contribuir com um grande número de trabalhadores para o mercado de trabalho global. A forma como esses trabalhadores estiverem preparados para responder às necessidades do mercado será um factor-chave, que influenciará não só a trajectória da Ásia, mas também a de toda a economia global.

 

Lee Jong-Wha é professor de Economia e director do Instituto Asiático de Pesquisa da Universidade da Coreia. O seu mais recente livro, em co-autoria com Robert J. Barro, da Universidade de Harvard, é Education Matters: Global Gains from the 19th to the 21st Century.

 

Copyright: Project Syndicate, 2016.
www.project-syndicate.org
Tradução: Rita Faria

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