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18 de Abril de 2018 às 14:00

Como a desigualdade alimentou a crise do euro

Embora uma união bancária seja um passo positivo, ela será incompleta sem esforços para reduzir a desigualdade.

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Desde a Grande Recessão de 2007-2009, a maioria dos economistas começou a considerar as finanças como um dos principais condutores do ciclo económico. Mas a dinâmica precisa ainda não foi totalmente compreendida.

 

Por exemplo, Amir Sufi, da Universidade de Chicago, e Atif Mian, de Princeton, argumentam que a expansão do crédito leva a recessões, que surgem assim que as famílias perdem o acesso ao financiamento necessário para fazer o "rollover" das suas dívidas. Mas esse argumento negligencia um factor-chave, como demonstra a crise da Zona Euro.

 

A criação do euro foi acompanhada por uma liberalização financeira em larga escala, que incluiu a eliminação dos controlos de capital e a adaptação do quadro legal para permitir que qualquer banco europeu abrisse filiais no exterior. Esse processo levou à crescente concorrência no sector bancário e a um aumento progressivo da proporção de bancos privados em relação aos públicos.

 

O resultado foi uma queda generalizada nas taxas de juro de longo prazo e um aumento do crédito em relação ao PIB. As famílias europeias de quase todos os países ficaram mais endividadas, mas o impacto da expansão do crédito no consumo privado foi diferente nos países do núcleo da UE - onde os excedentes em conta corrente cresceram - e na periferia, onde os países acumularam défices.

 

Porque é que o mesmo choque de oferta de crédito gerou respostas tão variadas? Como mostra um estudo recente, o processo de liberalização financeira da Zona Euro representou uma mudança mais profunda para a periferia do que para o centro: a periferia tinha menos contas de capital abertas, mais bancos públicos em relação aos privados, maiores taxas de juro de longo prazo e menores rácios de crédito em relação ao PIB.

 

O mesmo estudo argumenta que nos países periféricos, mais reprimidos em termos financeiros, a grande expectativa associada ao processo de liberalização era que aqueles que anteriormente não tinham acesso ao crédito - por causa dos baixos rendimentos ou baixa poupança – passassem a poder contrair empréstimos para financiar mais consumo. Por outras palavras, as famílias de baixos rendimentos - que representam uma grande parcela da população nos países mais desiguais da periferia - desempenharam o papel mais importante na mudança das posições externas das suas economias.

 

No núcleo da Zona Euro, em contrapartida, o efeito inicial da introdução do euro foi principalmente mais e melhores oportunidades de poupança, caracterizadas por melhores relações de risco-retorno. Isso beneficiou principalmente as famílias ricas, que podiam, por exemplo, contrair empréstimos para fazer investimentos de longo prazo que financiariam o consumo futuro, em vez do actual.

 

Como as famílias de rendimentos mais altos representam uma parcela maior do total nesses países (que também tendem a ter níveis mais baixos de desigualdade), o consumo agregado permaneceu moderado. Tendo a desigualdade começado a crescer na década de 1990 - particularmente na Alemanha -, essas famílias tiveram ainda mais incentivos para aumentar as suas poupanças.

 

As tendências contrastantes na periferia e no centro foram intensificadas depois do surgimento da crise financeira global e de a Zona Euro ter entrado em recessão. Na periferia, os grupos com baixas qualificações foram os primeiros a serem ejectados do mercado de trabalho. Com os bancos comerciais mais avessos ao risco, esses consumidores em dificuldades passaram a não conseguir contrair empréstimos para fazer o "rollover" das suas dívidas e financiar o consumo actual, que teve uma travagem, aprofundando a recessão.

 

Nos países do centro, pelo contrário, os principais devedores eram ricos e, portanto, não foram muito afectados. Se tivessem enfrentado choques negativos ao nível do rendimento, poderiam usar as suas poupanças como almofada. Assim, a gravidade da quebra dependeu não tanto do nível de endividamento das famílias, mas sim da distribuição da dívida em todos os níveis de rendimento.

 

Até certo ponto, isso é uma boa notícia. Tendo a periferia sofrido já o choque inicial da liberalização financeira, é menos provável que os eventos futuros de oferta de crédito afectem esses países desproporcionalmente. E a mudança da regulação macroprudencial do nível nacional para a União Europeia pode reforçar esse resultado ajudando ainda mais a harmonizar o comportamento do crédito bancário.

 

Mas há um senão: a regulamentação financeira ao nível da UE está limitada aos grandes bancos sistémicos. Como resultado, é improvável que afecte as operações dos pequenos bancos locais que emprestam pequenas quantias a consumidores de baixos rendimentos.

 

A melhor forma de fortalecer a resiliência financeira da Zona Euro é abordar os incentivos ao crédito. E a melhor forma de o fazer é melhorar a posição dos mutuários de rendimentos baixos, investindo recursos europeus em educação e qualidade do trabalho. Mesmo nos países do centro, mais igualdade de oportunidades pode melhorar a moral, reduzindo assim a poupança preventiva. A melhoria do capital humano e uma maior igualdade de oportunidades devem desempenhar um papel proeminente nas negociações sobre o próximo Quadro Financeiro Plurianual da UE, com o Banco Europeu de Investimento também a prestar apoio.

 

O denominador comum das propostas existentes de reforma da Zona Euro é a conclusão de uma união bancária, que muitos acreditam ser necessária para reduzir a fragmentação financeira e quebrar o ciclo vicioso entre bancos e dívida soberana. Esta é a área onde deverá haver mais progressos no período que antecede a reunião do Conselho Europeu de Junho. Mas, embora uma união bancária seja um passo positivo, ela será incompleta sem esforços para reduzir a desigualdade.

 

Benedicta Marzinotto é professora de Política Económica na Universidade de Udine e professora visitante de Políticas Macroeconómicas e de Governação da UE no Colégio da Europa.

 

Copyright: Project Syndicate, 2018.
www.project-syndicate.org
Tradução: Rita Faria
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