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26 de Fevereiro de 2017 às 20:00

Capitalismo inclusivo ou fracasso

O capitalismo inclusivo consiste, em última instância, em voltar a abraçar o propósito mais puro das empresas: resolver problemas e melhorar a vida das pessoas.

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"A ciência não conhece países", disse o grande químico do século XIX Louis Pasteur, "porque o conhecimento pertence à humanidade e é a tocha que ilumina o mundo". Hoje, as tecnologias e ideias inovadoras que estão a conduzir a Quarta Revolução Industrial pertencem a toda a humanidade, e estão a provar que Pasteur estava certo, de formas que ele nunca poderia ter imaginado.

 

Mas, ainda que o impacto da inovação tecnológica seja global, afecta diferentes populações de formas muito diferentes. As condições em rápida mudança melhoraram as perspectivas económicas de algumas pessoas; mas deixaram outras para trás, lançando uma sombra negra de insatisfação em toda a economia global. Para aqueles de nós que sabem, pela história e pela experiência, que a inovação cria novas oportunidades e prosperidade em todo o mundo, é hora de redobrarmos os nossos esforços para construir um capitalismo mais inclusivo, para que todos possam partilhar os benefícios do progresso.

 

Historicamente, não há dúvidas de que a inovação tecnológica e o comércio global têm sustentado o rápido progresso material e as melhorias substanciais nos padrões de vida. De acordo com os últimos dados disponíveis, a economia global é hoje cinco vezes maior do que há meio século, e o PIB global per capita mais do que duplicou neste período.

 

Estes números representam mais do que um aumento dos lucros para as empresas; também representam milhões de empregos criados e milhares de milhões de vidas melhoradas. Em 2015, o Banco Mundial estimou que a proporção da população mundial que vivia em extrema pobreza cairia brevemente para menos de 10% pela primeira vez – uma grande descida face aos 40% de há apenas três décadas.

 

Mas a economia global não está claramente a servir todos por igual, e muitas pessoas acreditam – com razão – que não está a servi-las de todo. Em Julho de 2016, o McKinsey Global Institute divulgou um extenso relatório sobre os rendimentos em 25 economias avançadas em todo o mundo. Uns surpreendentes 65 a 70% dos rendimentos das famílias estagnaram ou diminuíram entre 2005 e 2014. Este valor é ainda mais notável quando comparado com os 12 anos até 2005, quando menos de 2% dos rendimentos das famílias eram estáveis ou estavam em declínio. Assim, ninguém deveria ficar surpreendido com o facto de a maioria dos cidadãos em vários desses países dizerem que a economia global já não é uma força benéfica.

 

Para sustentar o progresso económico perante a frustração generalizada - e justificada - devemos tomar medidas para corrigir o que está errado com a economia global, continuando a participar nela. Infelizmente, as recentes disrupções políticas não vão ajudar neste esforço. O Gabinete de Responsabilidade Orçamental do Reino Unido, por exemplo, estima que sair da União Europeia reduzirá o crescimento económico do Reino Unido em 2,4% até 2020. A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos demonstra igualmente a necessidade de tomar medidas decisivas para tornar a economia global mais inclusiva, ou corremos o risco de ver mais turbulências políticas e económicas que dificultarão ainda mais o crescimento.

 

Para isso, os governos terão um papel indispensável, tal como o sector privado. Os líderes empresariais têm agora uma oportunidade genuína para promover um capitalismo mais inclusivo, que não só gera lucros, como também cria oportunidades e prosperidade para todos.

 

O sucesso exigirá que as empresas - e particularmente as que têm uma dimensão global - pensem além dos seus balanços e assumam responsabilidades que tradicionalmente não têm sido centrais para as suas missões. As empresas devem fazer mais para maximizar o seu valor, não apenas para os accionistas, mas também para todas as partes interessadas nas comunidades afectadas pelos seus negócios. Os líderes empresariais podem - e devem - redefinir o papel das empresas na sociedade.

 

Evidentemente, isso não significa que as empresas com fins lucrativos se tornem instituições de caridade. Em vez disso, as empresas que crescem e têm sucesso num ambiente cada vez mais volátil serão aquelas que criam mais valor para a sociedade como um todo. As empresas que irão definir o século XXI reconhecerão que a sua licença para operar não é simplesmente um presente de accionistas ou governos; em vez disso, deve ser conquistada através de soluções reais, criando empregos e desempenhando um papel construtivo nas comunidades de todo o mundo.

 

O capitalismo inclusivo consiste, em última instância, em voltar a abraçar o propósito mais puro das empresas: resolver problemas e melhorar a vida das pessoas. Isto é especialmente importante numa era de crise e incerteza. Com tantos desafios globais que é preciso enfrentar, o capitalismo inclusivo é a única maneira de garantir que o progresso alcançado durante o século passado continua no próximo século e daí por diante.

 

Andrew Liveris é chairman e CEO da Dow Chemical.

 

Copyright: Project Syndicate, 2017.
www.project-syndicate.org
Tradução: Rita Faria

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