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10 de Dezembro de 2010 às 11:52

Verdades e mitos sobre o SNS

O crescimento da actividade dos privados é uma boa notícia para os portugueses

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O crescimento da actividade dos privados é uma boa notícia para os portugueses, porque significa que há mais oferta, que haverá um aumento da concorrência e também que o exorcizado (por alguns) carácter público do SNS não asfixia a iniciativa privada (e social).

Um aspecto que escapa a algumas análises é exactamente esta relação entre público/privado porque, como é sabido, há uma multiplicidade de contratos e convenções que estimulam a complementaridade de prestações e, por outro lado, há o financiamento directo pelo Estado, e em particular pelos subsistemas públicos de saúde (com a ADSE à cabeça) de centenas de milhões de euros de cuidados de saúde prestados pelos privados.

Quanto à execução financeira do SNS há que esclarecer e desmistificar uma mão cheia de ideias feitas e (falsas).

1ª incorrecção: "A despesa está descontrolada".
A verdade é que a despesa está a crescer abaixo dos 3% em 2010, com os custos com Pessoal a crescer menos de 2%. As rubricas mais preocupantes prendem-se com o custo dos medicamentos, quer em ambulatório, quer em meio hospitalar, razão pela qual foram tomadas medidas cujos resultados já estão à vista. Assim, depois de um primeiro semestre com crescimentos de dois dígitos na despesa com farmácias, em Outubro registou-se uma redução da ordem dos 4% e os dados relativos a Novembro indiciam nova redução. No caso dos medicamentos hospitalares, a taxa de crescimento acumulada tem sofrido uma redução mensal e em Outubro o valor é mesmo de -2,8% face Outubro de 2009.

2ª incorrecção: "Desconhece-se a dimensão do 'buraco' porque não são públicos os valores da dívida".
A verdade é que despesas e pagamentos são entidades distintas e remetem para questões diferentes. No caso concreto, o cálculo do défice contempla todas as despesas no âmbito de consolidação do SNS externamente auditado e a sua existência denota um excesso de despesa face às receitas. A questão das dívidas remete para as questões de tesouraria, sendo que as despesas que lhes dão origem estão devidamente contabilizadas para efeitos de défice.

3ª incorrecção: "A despesa com a saúde vai atingir os 20% PIB em 2020".
A verdade é que a análise da sustentabilidade das finanças públicas que consta do PEC (pg 85) revela que a tendência de crescimento da despesa com saúde a deve levar a 7,7% do PIB em 2020 e 9,3% em 2060. Ou seja, há aqui um problema que exige reflexão e respostas mas a questão coloca-se em todos os países do mundo, sendo que a sustentabilidade se define a longo prazo.

Em estudo recente da OCDE reconhece-se que Portugal é um dos países com menor aumento das despesas com Saúde em quatro países (EUA, Dinamarca, Suíça e Portugal) no período de 1980 a 2007. De referir que nos últimos anos, e também para 2011, a despesa pública com a saúde tem vindo a reduzir-se, fruto de ganhos de eficiência e luta contra o desperdício, e não a aumentar.

4ª incorrecção: "Deve iniciar-se a reforma do SNS"
A verdade é que a reforma do SNS está em curso. Que outra coisa é senão reforma a criação das USF e das Unidades de Cuidados na Comunidade, os incentivos à contratualização, a reorganização da estrutura hospitalar, o alargamento da rede com os cuidados continuados, etc?

A reforma deve continuar mas sem que o fantasma do financiamento ponha em causa esse valor maior que é a saúde. Recorde-se que também da Segurança Social se dizia há 20 anos que estava falida e tinha que ser privatizada e os portugueses sabem bem que, com coragem, determinação e esforço, é possível encontrar solução que vão ao encontro do que os portugueses podem aspirar como modelo social.

5ª incorrecção: "A solução do SNS é entregar a prestação de cuidados aos privados".
A verdade é que o problema é antes de mais o financiamento dos cuidados de saúde. Quem defende que o Estado deveria financiar e os privados prestar os cuidados, para além de esquecer o período de transição para as estruturas existentes, também deveria ter coragem de dizer que, para haver redução global de despesa, teria que se imputar maior despesa aos cidadãos. Ou seja, para além de óbvios problemas de acesso, a suposta "receita" não resolve o cerne do problema da despesa mas apenas reafecta o seu financiamento.

Além do mais, a OCDE e a Organização Mundial de Saúde concluem que todos os países podem beneficiar de reformas no sector da Saúde mas não se pode falar de uma "receita universal" ("one-size-fits-all").

Esta é a minha apreciação. Mas não estou só…

No estudo da OCDE "In Health Care Systems: Efficiency and Policy Settings", Portugal aparece particularmente bem classificado quanto à eficiência do seu sistema de saúde:
- Em termos de potenciais ganhos em termos de esperança de vida comparado com a média de crescimento da despesa no decénio 1997-2007 Portugal situa-se entre os países que mais investiram em saúde e que conseguiram atingir o potencial máximo de ganhos possível em termos de aumento de esperança de vida;
- Quanto aos ganhos de eficiência em termos de saúde quando relacionados com o crescimento da despesa "per capital", Portugal também se situa acima da média da OCDE, tanto em menor aumento de despesa per capita (8º menos gastador), como em melhores resultados potenciais em termos de eficiência projectados para o próximo decénio (2007/2017);
Perdoe-se o cinismo de um Keynesiano mas, tal como nas crises do capitalismo, garantir a sustentabilidade do SNS é reformar o SNS, não é entregar a saúde aos privados.


Secretário de Estado da Saúde
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