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15 de Março de 2007 às 13:59

Urgentemente

Tem sido tema de abertura de Telejornal e notícia gorda de primeira página: o ministro Correia de Campos, alegadamente no cumprimento da promessa eleitoral de concretizar uma reforma estrutural do Serviço Nacional de Saúde (SNS), abriu uma frente de "guer

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Tem sido tema de abertura de Telejornal e notícia gorda de primeira página: o ministro Correia de Campos, alegadamente no cumprimento da promessa eleitoral de concretizar uma reforma estrutural do Serviço Nacional de Saúde (SNS), abriu uma frente de "guerra" com variados poderes locais espalhados pelo País, isto na sequência do anúncio da decisão – ou apenas da intenção? – de encerrar ou desclassificar algumas unidades hospitalares com serviços chamados de urgência, onde os doentes, hoje pomposamente apelidados de utentes, são atendidos em permanência, durante as 24 horas de cada um dos 365 dias do ano.

Conhece-se e percebe-se a argumentação em que assenta o propósito do titular da pasta da Saúde. O ministro mede o pulso a um país economicamente exaurido e conclui que o estado febril é grave, que não é fácil encontrar alternativa ao imperativo de concentrar meios e recursos, única forma expedita de assegurar razoáveis índices de qualidade nos serviços a prestar aos doentes/utentes.

Vai daí, porque não lhe passa pela cabeça reclamar mais dinheiro do Orçamento de Estado para a Saúde – quiçá exigindo o cancelamento de outros gastos menos urgentes, com submarinos e aviões de combate, por exemplo, ou mesmo com um TGV modernaço e uma OTA polémica –, o ministro Correia de Campos entende que a saída possível passa pela racionalização dos recursos humanos e técnicos disponíveis, única forma de assegurar o acompanhamento médico mínimo exigível a quem dele necessita com urgência.

Conhecem-se e percebem-se, também, as reacções emocionadas das populações, aqui e ali picadas por interesses pessoais e/ou partidários. O sonho de qualquer português que se preze, cansado de ser despojado dos mais elementares direitos, é ter um médico à cabeceira e um hospital à esquina de cada rua. Por isso reage com raiva e ruído perante a ameaça de lhe tirarem o serviço de atendimento médico mais próximo, mesmo que lá não haja clínico, meios de diagnóstico ou alguém que lhe possa valer. 

Trata-se de uma reacção normal de quem está dorido por ir perdendo aos poucos o pouco que sempre teve. Isto apesar de desconfiarmos que muitos dos hospitais e dos serviços de urgência que foram polvilhando o País ao longo das últimas décadas já nasceram contra o parecer negativo dos técnicos responsáveis do sector da Saúde.

Pessoa responsável dizia-nos, há dias, que esta questão da reorganização dos serviços de urgência é bem capaz de andar mal contada, tornando-se necessário definir, primeiro, o que é que se pretende verdadeiramente das urgências no quadro do Serviço Nacional de Saúde, só depois sendo possível estabelecer um diálogo construtivo e serenar os ânimos.

No que respeita ao Distrito de Vila Real, que conhecemos melhor, onde o programa da NORAD ajudou a construir cinco magníficos Centro de Saúde (Montalegre, Boticas, Ribeira de Pena, Vila Pouca de Aguiar e Santa Marta de Penaguião), compreende-se mal que venha agora o Ministério da saúde mandar fechar os respectivos serviços de atendimento, em determinadas períodos do dia.

Porque, neste caso concreto, as populações terão sempre razões de sobra para alegar que aquelas instalações, construídas com a ajuda do Governo da Noruega, foram projectadas para estarem abertas em permanência e não para estarem fechadas ao sabor de interesses que nada têm a ver com as suas necessidades reais. Como nós as compreendemos?

Quem viva em Capeludos, em Cabanas, em Alturas do Barroso, e em tantas outras povoações distantes das respectivas sedes do Concelho, por vezes a dezenas de quilómetros, jamais aceitará a obrigação de fazer mais do que uma hora de viagem, até Vila Real ou Chaves, em caso de doença aguda. O mínimo que se exige é que qualquer cidadão possa encontrar, em tempo útil, um rosto do serviço de saúde, nem que seja num simples posto de socorros e só para decidir o melhor encaminhamento a dar a cada caso concreto.

Mesmo que nos digam que a Saúde é também uma área de negócio e, como tal, sujeita às leis do mercado; mesmo que todos entendamos que os recursos não são infindáveis, há que ter em consideração os aspectos morais e éticos muito particulares que esta actividade encerra e aos quais o Estado não se pode eximir.

Se não é viável passarmos do oito para o oitenta, conforme parece acenar Correia de Campos, tentemos ao menos manter o oito, que é incomensuravelmente maior do que o zero. É que já ninguém aguenta regressar ao zero absoluto. Mesmo que nos digam que se trata de uma mera questão psicológica, há que tê-la em consideração. Urgentemente!

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