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18 de Dezembro de 2006 às 13:59

Trilogia da morte

As últimas semanas viram desaparecer três personalidades marcantes do mundo da energia. Em comum, para além da doença que tragicamente as vitimou, tinham o apurado sentido do interesse público, ...

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"C’est un Ange qui tient dans ses doigts magnétiques
 Le sommeil et le don des rêves extatiques"

Baudelaire
(de um poema da Trilogia da Morte musicado por Luis de Freitas Branco)


As últimas semanas viram desaparecer três personalidades marcantes do mundo da energia. Em comum, para além da doença que tragicamente as vitimou, tinham o apurado sentido do interesse público, a extraordinária capacidade analítica, uma vida cívica transbordante de generosidade e iniciativa, o apego às coisas do espírito e o desapego aos bens materiais.

O eng.º Sidónio de Freitas Branco Paes (1925 - 4.12.2006) desempenhou um importante papel na electrificação do nosso país, tendo sido responsável por alguns dos projectos tecnologicamente mais relevantes. Técnico e gestor de reconhecida craveira, depois de um notável percurso na indústria eléctrica foi durante longos anos Director-Geral de Energia. Continuou a acompanhar activamente até ao fim da sua vida a evolução do sector energético nacional, nomeadamente como Presidente do Conselho Consultivo da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), desde a sua criação em 1997.

Os interesses artísticos do engº Sidónio Paes eram múltiplos, sobretudo na música, no cinema e na literatura. Além de autor de uma assinalável produção, apoiou e dirigiu numerosas associações de cariz cívico e cultural.

François Lamoureux (1946 - 25.8.2006) foi um dos mais prestigiados funcionários da Comissão Europeia. Director-Geral de Energia e Transportes entre 1999 e 2005, fora antes chefe de gabinete da Comissária Edith Cresson e chefe de gabinete adjunto de Jacques Delors. O seu nome fica ligado a vários projectos de grande envergadura, na energia (p.ex. o diálogo energético Europa-Rússia, sob a égide de Romano Prodi), nos transportes (p. ex. a rede satelitar Galileo), no debate sobre a constituição europeia (Pénélope), etc.

Jurista brilhante, produto das grandes escolas francesas, personalidade frontal e europeísta militante foi membro do Conselho de Administração da Fundação Notre Europe.

Ignacia de Loyola de Palácio y del Valle Lersundi (1950 - 13.12.2006) foi Vice-Presidente da Comissão Europeia entre 1999 e 2004, com o pelouro da energia e dos transportes, além das relações com o Parlamento Europeu. Desempenhou um papel fundamental na construção do mercado interno da energia, tendo sido responsável, nomeadamente, pelo "pacote legislativo" de 2003 que enquadra os sectores da electricidade e do gás natural na Europa. Em 2000, apoiou activamente a criação do Conselho dos Reguladores Europeus de Energia (CEER) e, em 2003, a fundação da Florence School of Regulation, uma parceria entre a Comissão Europeia, o Instituto Universitário Europeu e o CEER.

Desempenhou numerosos cargos políticos em Espanha e era presidente do think tank do Partido Popular Europeu.

Tive o privilégio de colaborar longamente com Sidónio Paes, François Lamoureux e Loyola de Palácio. Com eles partilhei a convicção que o empenho pelo desenvolvimento de mercados de energia mais eficientes e europeizados contribui para uma sociedade melhor e fortalece o sonho de uma Europa mais dinâmica e mais justa. Por isso, não posso deixar de aqui render homenagem à extraordinária força magnética das suas personalidades. Um magnetismo que nos transportava, com discreta elegância e veloz discernimento, de um passado a descobrir para um futuro a construir. Era essa sagaz capacidade de mediação cultural que dava à sua acção grandeza, mesmo quando erravam. Essa grandeza que com naturalidade irradiavam deixa, com o seu desaparecimento, de nos pertencer e de nos estimular. Por isso, sem eles, nesta época triste de rarefeito magnetismo, ficamos mais pobres e mais conscientes que são lembranças como aquelas que eles nos deixam que nos dão "le coeur de marcher jusqu’au soir."

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