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Tempo de clareza

O terrorismo e o aquecimento global são, para muitas pessoas, as maiores ameaças ao planeta. Nos Estados Unidos, a Administração Bush quer aumentar em cerca de 20% o financiamento destinado à segurança das fronteiras e ao cumprimento das leis sobre a imig

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No entanto, o terrorismo internacional mata cerca de 400 pessoas por ano. Quanto dinheiro estaríamos dispostos a pagar para reduzir esse número de mortes em, digamos, 25% - mil milhões de dólares, cem mil milhões de dólares?

Entretanto, no Hawai, os decisores políticos reuniram-se para debater o tratado sobre as alterações climáticas que irá substituir o Protocolo de Quioto. Os grupos do “lobby” ambientalista querem que o novo tratado vá mais além do que o de Quioto, cuja implementação implica um gasto de 180 mil milhões de dólares por ano. Com efeito, os esforços para abrandar o aquecimento global por meio do Protocolo de Quioto ou de um tratado similar farão uma diferença mínima, atrasando o aumento das temperaturas em apenas sete dias até 2100.

Um décimo do custo anual da implementação do Protocolo de Quioto – ou um décimo do orçamento norte-americano deste ano para financiar as guerras no Iraque e no Afeganistão – evitaria cerca de 30 milhões de novas infecções pelo vírus da SIDA/HIV. A mesma quantia poderia, de igual forma, ser utilizada para ajudar os quatro milhões de pessoas que irão morrer de desnutrição este ano, os 2,5 milhões que sucumbirão à poluição do ar exterior e interior, os dois milhões que morrerão devido à falta de micronutrientes (ferro, zinco e vitamina A) ou os dois milhões cujas mortes resultarão da falta de água potável limpa.

Sabemos como evitar que as pessoas morram de desnutrição, poluição, SIDA/HIV e malária. As estratégias eficientes são baratas e simples: trata-se, essencialmente, de conseguir aquilo que é necessário (micronutrientes, combustíveis mais limpos, preservativos gratuitos e mosquiteiros) para aqueles que disso precisam. O número de vítimas continua a ser elevado porque dispomos de recursos limitados para solucionar todos os problemas do mundo e esses problemas não estão entre as nossas maiores preocupações.

Os governos e as organizações não-governamentais gastam milhares de milhões de dólares todos os anos a tentar ajudar o mundo, sem ponderarem, explicitamente, até que ponto estão a conseguir dar o seu melhor. Estabelecem prioridades ao nível dos bem intencionados projectos que financiam, apenas decidindo fazer algumas coisas em detrimento de outras – muitas vezes baseados em realidades políticas e na atenção dos media, em vez de optarem por uma análise rigorosa das situações.

O pânico em torno do terrorismo e das mudanças climáticas não nos cega inteiramente para outros problemas com que o planeta se depara, mas o nosso medo acaba por distorcer as lentes pelas quais analisamos o quadro global. Espero que se torne perceptível um quadro global mais nítido quando tiver lugar, em Maio, a mesa redonda com economistas internacionais que irão avaliar mais de 50 soluções para variados desafios planetários, no âmbito do projecto “Consenso de Copenhaga”.

Os participantes recorrerão à análise do custo-benefício para avaliarem diferentes estratégias. O resultado será uma lista prioritária de soluções, que revelará quais os projectos que poderão trazer os maiores benefícios por comparação com os custos associados. Deverá o mundo colaborar num novo acordo ao estilo do Protocolo de Quioto? Deveremos fazer da poluição do ar a nossa principal prioridade?

Há quem se mostre fortemente contra a ideia de recorrer a ferramentas económicas para avaliar os principais problemas que afectam o mundo. Mas essa é uma forma de sermos honestos em relação aos projectos que funcionam e que não funcionam. É demasiado fácil para os políticos destinar mais dinheiro à tentativa de solucionar problemas como o terrorismo, quando algumas nações podem já estar a gastar demasiado dinheiro em medidas de segurança que apenas servem para redireccionar os ataques. Nós precisamos de saber aquilo que funciona.

Quando chegamos à conclusão que algumas políticas são pouco eficazes, podemos debater outras opções. Talvez existam formas mais inteligentes de combater o terrorismo do que levar a cabo guerras dispendiosas e investir ainda mais na segurança interna. Talvez possamos atacar melhor o problema das mudanças climáticas através de iniciativas de carácter tecnológico, menos caras e mais eficazes. Talvez acabemos por ajudar mais o mundo ao focalizarmo-nos na poluição do ar, na educação e na situação das mulheres.

Sabemos de que forma é que os políticos tomam actualmente as suas decisões em matéria de despesas. Em Maio, veremos de que maneira é que alguns dos melhores economistas do mundo – incluindo cinco laureados com prémios Nobel – investiriam a mesma quantia de dinheiro para obterem o máximo possível de benefícios.

Descobriremos o que poderia suceder se os políticos ponderassem as situações sem terem apenas em conta a extrema concentração dos media no terrorismo e nas mudanças climáticas. O resultado seria uma clara focalização nos principais problemas com que o mundo se confronta actualmente e nas melhores soluções para os resolver.

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