Opinião
Pedro Braz Teixeira - Investigador do Nova Finance Center, Nova School of Business and Economics
pbteixeira3@gmail.com
18 de Março de 2009 às 12:02
Reputação em risco
As reuniões de ministros das Finanças da UE desenrolam-se em três etapas. A primeira etapa envolve os membros substitutos do Comité Económico e Financeiro (CEF), composto por representantes dos ministérios das Finanças e dos bancos...
As reuniões de ministros das Finanças da UE desenrolam-se em três etapas. A primeira etapa envolve os membros substitutos do Comité Económico e Financeiro (CEF), composto por representantes dos ministérios das Finanças e dos bancos centrais nacionais de cada dos 27. A segunda etapa envolve os membros principais do CEF e a terceira etapa é o Ecofin, já com os ministros das Finanças e, em geral, administradores dos bancos centrais. Para além destas reuniões, há ainda as reuniões do Eurogrupo a que têm acesso apenas os países participantes no euro e de que os representantes dos bancos centrais foram gentilmente expulsos, para não "chatearem" com a sua ortodoxia. Cabe ainda dizer que ao longo das três etapas as questões técnicas vão perdendo importância, cedendo-a às questões políticas.
A Comissão Europeia (CE) prepara documentos para discussão e a generalidade dos países acaba por adoptar uma posição mais ou menos egoísta, preocupando-se sobretudo com o seu interesse nacional. Para o caso de um pequeno país como Portugal é natural que os restantes países confiem sobretudo no trabalho da CE. Como Portugal representa menos de 2% do PIB da zona do euro, um disparar do défice português não terá praticamente nenhum impacto na taxa de juro que os outros países pagam. Já um descontrolo da parte de Itália (que tem uma dívida pública ligeiramente superior à alemã, em valor absoluto, recorde-se) será pago em parte pelos italianos, pelo aumento do "spread", mas outra parte será paga por taxas de juro mais altas para todos.
Nas reuniões do CEF os representantes de Itália (tecnicamente muito bem preparados) são ouvidos com atenção nas intervenções gerais mas, quando se pronunciam sobre as contas públicas italianas, recebem olhares do tipo "se julgas que eu acredito numa palavra do que estás para aí a dizer…"
A CE já foi descaradamente enganada por vários governos e parece pouco ter aprendido. Só no caso português, Guterres apresentava-lhes em 2001 em simultâneo uma previsão de défice de 1% do PIB e necessidades de financiamento de 5% do PIB. Como é que a brutal disparidade entre estes dois valores não fez soar todas as campainhas de alarme em Bruxelas? É incompreensível, mas é verdade.
É óbvio que, após estas trafulhices, os membros portugueses do CEF passaram a ser rudemente insultados, até que o novo governo conseguiu recuperar a credibilidade sobre as contas públicas portuguesas.
Dando um salto para o presente, a CE disponibilizou a 25 de Fevereiro uma recomendação (1) para uma "Opinião do Conselho", aprovado no Ecofin de 10 de Março sobre o PEC 2008-2011 de Portugal.
Neste documento a CE tem o cuidado de apontar para o "fraco crescimento da produtividade, que permanece uma das maiores fraquezas da economia portuguesa" (pág. 5), para as previsões económicas optimistas (pág. 6) e salienta os fortes riscos negativos para as contas públicas (pág. 7). No entanto, por diversas vezes "engravida de ouvido". Ignora que nem todo o pacote orçamental extra se extinguirá em 2010, como a UTAO já criticou.
Mas o cúmulo da credulidade surge quando acredita que as medidas propostas pelo Governo vão aumentar o potencial de crescimento e a competitividade (pág. 8). Se há área em que os resultados alcançados pelo Governo são nulos ou negativos é esta. Como é possível acreditar que agora, no meio da crise, é que vão conseguir os resultados que não conseguiram no tempo das vacas gordas?
Penso que neste momento a CE está a cometer o mesmo erro de 2001: está a ser enganada, ainda que haja sinais evidentes de falta de verdade, que deveriam fazer soar todos os avisos vermelhos. O PEC inclui receitas não fiscais de cerca de 2% do PIB, que não são explicadas e foram mesmo revistas em alta em relação aos valores já inexplicáveis do OE de 2009.
O Governo português prepara-se para enganar a CE pela segunda vez em oito anos. Uma coisa é ser um aluno com más notas, outra é um aluno que aldraba nos exames. Portugal corre o sério risco de passar a ser olhado com elevada desconfiança, como Itália, e a pagar um prémio de risco pela falta de verdade nas suas contas públicas. Quem vai pagar esta factura será, não só o Estado (leia-se: os contribuintes), como as empresas e as famílias.
(1)http://ec.europa.eu/economy_finance/publications/publication14112_en.pdf
Economista
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A Comissão Europeia (CE) prepara documentos para discussão e a generalidade dos países acaba por adoptar uma posição mais ou menos egoísta, preocupando-se sobretudo com o seu interesse nacional. Para o caso de um pequeno país como Portugal é natural que os restantes países confiem sobretudo no trabalho da CE. Como Portugal representa menos de 2% do PIB da zona do euro, um disparar do défice português não terá praticamente nenhum impacto na taxa de juro que os outros países pagam. Já um descontrolo da parte de Itália (que tem uma dívida pública ligeiramente superior à alemã, em valor absoluto, recorde-se) será pago em parte pelos italianos, pelo aumento do "spread", mas outra parte será paga por taxas de juro mais altas para todos.
A CE já foi descaradamente enganada por vários governos e parece pouco ter aprendido. Só no caso português, Guterres apresentava-lhes em 2001 em simultâneo uma previsão de défice de 1% do PIB e necessidades de financiamento de 5% do PIB. Como é que a brutal disparidade entre estes dois valores não fez soar todas as campainhas de alarme em Bruxelas? É incompreensível, mas é verdade.
É óbvio que, após estas trafulhices, os membros portugueses do CEF passaram a ser rudemente insultados, até que o novo governo conseguiu recuperar a credibilidade sobre as contas públicas portuguesas.
Dando um salto para o presente, a CE disponibilizou a 25 de Fevereiro uma recomendação (1) para uma "Opinião do Conselho", aprovado no Ecofin de 10 de Março sobre o PEC 2008-2011 de Portugal.
Neste documento a CE tem o cuidado de apontar para o "fraco crescimento da produtividade, que permanece uma das maiores fraquezas da economia portuguesa" (pág. 5), para as previsões económicas optimistas (pág. 6) e salienta os fortes riscos negativos para as contas públicas (pág. 7). No entanto, por diversas vezes "engravida de ouvido". Ignora que nem todo o pacote orçamental extra se extinguirá em 2010, como a UTAO já criticou.
Mas o cúmulo da credulidade surge quando acredita que as medidas propostas pelo Governo vão aumentar o potencial de crescimento e a competitividade (pág. 8). Se há área em que os resultados alcançados pelo Governo são nulos ou negativos é esta. Como é possível acreditar que agora, no meio da crise, é que vão conseguir os resultados que não conseguiram no tempo das vacas gordas?
Penso que neste momento a CE está a cometer o mesmo erro de 2001: está a ser enganada, ainda que haja sinais evidentes de falta de verdade, que deveriam fazer soar todos os avisos vermelhos. O PEC inclui receitas não fiscais de cerca de 2% do PIB, que não são explicadas e foram mesmo revistas em alta em relação aos valores já inexplicáveis do OE de 2009.
O Governo português prepara-se para enganar a CE pela segunda vez em oito anos. Uma coisa é ser um aluno com más notas, outra é um aluno que aldraba nos exames. Portugal corre o sério risco de passar a ser olhado com elevada desconfiança, como Itália, e a pagar um prémio de risco pela falta de verdade nas suas contas públicas. Quem vai pagar esta factura será, não só o Estado (leia-se: os contribuintes), como as empresas e as famílias.
(1)http://ec.europa.eu/economy_finance/publications/publication14112_en.pdf
Economista
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