Opinião
Quem casa quer casa
A percentagem de alojamentos vagos em Portugal subiu no decénio 2001-2011. Apesar dos níveis de produção atuais de novos fogos serem apenas 1/3 do que se verificava na transição do milénio, ao atual ritmo de formação de famílias, ainda levará algum tempo até se retomar um equilíbrio estável.
Uma das características distintivas, e positivas, de Portugal nos últimos anos foi a ausência de uma "bolha" imobiliária. Não se desencadeou um ajustamento adicional que, conforme se verifica noutros países, se revela complexo e persistente.
Não obstante, desde meados de 2010 que se regista uma ligeira queda dos preços de venda da habitação em Portugal (aproximadamente 1% em termos homólogos no final de 2011), que se associa à alteração das condições de financiamento, à conjuntura recessiva e ao aumento do desemprego.
Este contexto tem proporcionado algumas mudanças, destacando-se o arrendamento habitacional. Mas, também pressiona as autoridades a desenvolverem políticas de suporte, tais como a lei do arrendamento ou o plano para reduzir o nível de incumprimento das famílias, que deverão ter desenvolvimentos a muito breve prazo em Portugal, por forma a evitar ciclos viciosos que se revelam difíceis de transpor.
Embora provindo de situações muito diversas, são temas comuns a Portugal e aos EUA, país onde o Sistema da Reserva Federal ("Fed") tem assumido algum protagonismo no desenho de medidas de incentivo à habitação1, algumas delas semelhantes ao que se está e pretende fazer em Portugal.
Como ponto de partida, a constatação de risco de agravamento do desequilíbrio entre procura e oferta. A percentagem de alojamentos vagos em Portugal subiu no decénio 2001-2011. Apesar dos níveis de produção atuais de novos fogos serem apenas 1/3 do que se verificava na transição do milénio, ao atual ritmo de formação de famílias, ainda levará algum tempo até se retomar um equilíbrio estável. Entretanto, as condições económicas desincentivam a procura e geram novos motivos de pressão sobre a oferta de habitação.
Para mitigar este tipo de riscos, o "Fed" propõe um conjunto de medidas tendentes a conter o incumprimento dos particulares e a aproveitar o stock de habitações no balanço das entidades financeiras.
No primeiro caso, as propostas são relativamente tradicionais. Sugerem-se medidas do tipo renegociação das condições contratuais (prazo, taxa de juro, período de graça), em boa parte semelhantes ao que se pratica em Portugal. Porém, a incerteza com a capacidade financeira futura do devedor leva a que, na maior parte dos casos, estes programas nos EUA tenham de beneficiar de suporte público (programa "Making Home Affordable").
No segundo caso, indica-se a possibilidade de conversão dos empréstimos (ou das propriedades detidas em balanço das instituições financeiras) em arrendamento habitacional, com a própria entidade financiadora ou com terceiros, adaptando regulação para o efeito. E, ainda, o desenvolvimento de entidades financeiras públicas ("land banks") para os casos de propriedades que exibam menor interesse comercial. Dá-se particular atenção aos fatores subjacentes de incentivo ao investimento para arrendamento, sintetizado na taxa de capitalização (renda/valor imóvel) e que agrega fatores como o valor da renda, a taxa de ocupação, trâmites processuais, custos de manutenção e fiscalidade.
Independentemente da maior ou menor facilidade de transposição de algumas destas sugestões, releva-se a importância conferida ao mercado habitacional (já correm quase 5 anos desde a eclosão da crise do "subprime" e o mercado imobiliário ainda é considerado fator de risco nos EUA), à mitigação dos riscos associados e a predisposição a iniciativas que permitam conciliar condições financeiras exigentes com o aproveitamento de stock de habitação inaproveitado. Na ausência de margem de manobra ao nível dos recursos públicos em Portugal, espera-se criatividade em incentivos de outra natureza para obter efeitos semelhantes.
1 "The US housing market: current conditions and policy considerations", Board of Governors of the Federal Reserve System, janeiro de 2012
Gabinete de Estudos do Millennium BCP
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Este artigo de opinião foi escrito em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.
Não obstante, desde meados de 2010 que se regista uma ligeira queda dos preços de venda da habitação em Portugal (aproximadamente 1% em termos homólogos no final de 2011), que se associa à alteração das condições de financiamento, à conjuntura recessiva e ao aumento do desemprego.
Embora provindo de situações muito diversas, são temas comuns a Portugal e aos EUA, país onde o Sistema da Reserva Federal ("Fed") tem assumido algum protagonismo no desenho de medidas de incentivo à habitação1, algumas delas semelhantes ao que se está e pretende fazer em Portugal.
Como ponto de partida, a constatação de risco de agravamento do desequilíbrio entre procura e oferta. A percentagem de alojamentos vagos em Portugal subiu no decénio 2001-2011. Apesar dos níveis de produção atuais de novos fogos serem apenas 1/3 do que se verificava na transição do milénio, ao atual ritmo de formação de famílias, ainda levará algum tempo até se retomar um equilíbrio estável. Entretanto, as condições económicas desincentivam a procura e geram novos motivos de pressão sobre a oferta de habitação.
Para mitigar este tipo de riscos, o "Fed" propõe um conjunto de medidas tendentes a conter o incumprimento dos particulares e a aproveitar o stock de habitações no balanço das entidades financeiras.
No primeiro caso, as propostas são relativamente tradicionais. Sugerem-se medidas do tipo renegociação das condições contratuais (prazo, taxa de juro, período de graça), em boa parte semelhantes ao que se pratica em Portugal. Porém, a incerteza com a capacidade financeira futura do devedor leva a que, na maior parte dos casos, estes programas nos EUA tenham de beneficiar de suporte público (programa "Making Home Affordable").
No segundo caso, indica-se a possibilidade de conversão dos empréstimos (ou das propriedades detidas em balanço das instituições financeiras) em arrendamento habitacional, com a própria entidade financiadora ou com terceiros, adaptando regulação para o efeito. E, ainda, o desenvolvimento de entidades financeiras públicas ("land banks") para os casos de propriedades que exibam menor interesse comercial. Dá-se particular atenção aos fatores subjacentes de incentivo ao investimento para arrendamento, sintetizado na taxa de capitalização (renda/valor imóvel) e que agrega fatores como o valor da renda, a taxa de ocupação, trâmites processuais, custos de manutenção e fiscalidade.
Independentemente da maior ou menor facilidade de transposição de algumas destas sugestões, releva-se a importância conferida ao mercado habitacional (já correm quase 5 anos desde a eclosão da crise do "subprime" e o mercado imobiliário ainda é considerado fator de risco nos EUA), à mitigação dos riscos associados e a predisposição a iniciativas que permitam conciliar condições financeiras exigentes com o aproveitamento de stock de habitação inaproveitado. Na ausência de margem de manobra ao nível dos recursos públicos em Portugal, espera-se criatividade em incentivos de outra natureza para obter efeitos semelhantes.
1 "The US housing market: current conditions and policy considerations", Board of Governors of the Federal Reserve System, janeiro de 2012
Gabinete de Estudos do Millennium BCP
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Este artigo de opinião foi escrito em conformidade com o novo Acordo Ortográfico.
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