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Quais os objectivos de um Bretton Woods II?

Para aqueles que há muito dizem que a arquitectura financeira internacional tem de ser profundamente reformada, o apelo a um "Bretton Woods II" é bem vindo. Houve apelos semelhantes após as crises asiática e russa de 1997-1998, mas não foram levados a sério pelos países industrializados mais ricos. Agora que esses países estão no meio da tempestade, talvez levem os apelos de forma mais empenhada.

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Existem dois problemas fundamentais com o apelo à reforma. Em primeiro lugar, falta-lhe conteúdo: não está muito claro qual será o debate em torno de um Bretton Woods II. Em segundo lugar, o processo começou da forma errada, ao excluir a maioria dos países das conversações. É obviamente positivo para os membros do G-7 ou de um subgrupo do G-7 mostrarem liderança, mas não pode dar-se uma reforma fundamental sem um processo inclusivo que dê ouvidos tanto aos países industrializados como em desenvolvimento, tanto pequenos como grandes. São as instituições globais, e não grupos "ad hoc" de países, que devem estar no centro desta iniciativa de reforma.

A questão mais clara, de momento, é corrigir o défice de regulamentação prudencial que caracteriza os mercados financeiros mundiais. O debate deve começar por acordar os princípios regulatórios, sendo evidente que as regulamentações devem ser abrangentes, de forma a evitar as sérias insuficiências que conduziram à actual crise.

As regulamentações devem ser também de natureza anti-cíclica, de forma a evitar o excessivo recurso ao endividamento (alavancagem). Além disso, devem prever os aumentos de capital e das provisões (reservas) em períodos de expansão, impedindo que as bolhas dos preços dos activos levem a mais pedidos de crédito. É de descartar a confiança nos modelos internos de avaliação de risco das instituições financeiras, que constituem o ponto mais importante do acordo de Basileia II sobre regulação bancária. Essa estratégia revelou-se perigosa, pois a utilização de modelos de risco semelhantes por parte das instituições financeiras pode levar a uma maior instabilidade.

Qualquer novo sistema regulatório deveria basear-se numa rede – que funcionasse bem - de autoridades nacionais e regionais (que ainda falta na União Europeia) e incluir uma verdadeira supervisão internacional das instituições financeiras com uma abrangência global. A maioria das pessoas concorda que o Fundo Monetário Internacional não deveria estar no centro do sistema regulatório. O Banco de Pagamentos Internacionais e o Comité de Basileia estão em melhor posição para assumirem este papel, mas é necessária uma reforma profunda para alargarem o seu número de membros e para evitarem um dos principais problemas do Comité de Basileia: a falta de representação dos países em desenvolvimento.

Três elementos centrais da reforma do FMI deveriam ser incluídos na agenda. O primeiro é a necessidade de uma reserva em divisas verdadeiramente mundial, talvez baseada nos Direitos Especiais de Saque do FMI. Isto contribuiria para ultrapassar as desigualdades e a instabilidade que é inerente a um sistema mundial de reservas baseado numa moeda nacional. O actual sistema caracteriza-se por ciclos de confiança e de desconfiança no dólar e por choques periódicos resultantes das políticas norte-americanas impostas ao mundo e que são adoptadas sem terem em conta as suas consequências globais.

O segundo elemento é a necessidade de colocar o FMI, e não o G-7 – ou qualquer outro "G" -, no cento da coordenação da política macroeconómica à escala mundial. É a única maneira de dar a voz adequada aos países em desenvolvimento. A supervisão multilateral dos desequilíbrios mundiais, que foi lançada pelo FMI em 2006, constituiu um interessante passo nesta direcção, mas as diferentes partes não se empenharam o suficiente, pelo que faltou eficácia ao dispositivo.

O terceiro elemento prende-se com a maior exigência por parte dos países em desenvolvimento. O FMI deveria conceder rapidamente empréstimos durante as crises de balanças de pagamentos, sem condições demasiado draconianas, nomeadamente quando a crise é provocada por uma brusca reversão dos fluxos de capital ou por uma forte deterioração das trocas comerciais. Isto aproximaria o funcionamento do FMI ao de um banco central, injectando liquidez de forma rápida, tal como os bancos centrais dos países avançados o fizeram recentemente em larga escala. No caso do FMI, o financiamento da liquidez necessária poderia provir de emissões cíclicas de Direitos Especiais de Saque.

Nestes três domínios, o FMI deve recorrer mais às instituições regionais. Há já uma década que proponho que o FMI do futuro seja considerado como o vértice de uma rede de fundos de reserva regionais – ou seja, um sistema mais próximo, em termos conceptuais, do Banco Central Europeu ou da Reserva Federal norte-americana.

Uma mesma concepção institucional poderia aplicar-se às políticas prudenciais. Uma rede institucional mais densa parece adaptar-se melhor à heterogeneidade da comunidade internacional e será certamente mais eficaz na prestação de serviços e dará uma voz mais forte aos países mais pequenos.

Por último, uma grande deficiência da actual arquitectura financeira internacional está na ausência de uma estrutura internacional – isto é, um tribunal semelhante aos que foram criados a nível nacional para gerir as falências – para gerir o excessivo endividamento a nível internacional. O actual sistema baseia-se em mecanismos "ad hoc", que normalmente intervêm demasiado tarde, quando o elevado endividamento já provocou efeitos devastadores. O único verdadeiro mecanismo institucional é o Clube de Paris, que lida exclusivamente com o financiamento estatal. O Bretton Woods II deveria resolver este problema, através da criação de um tribunal internacional da dívida.

A actual crise financeira tornou bastante clara a necessidade de uma reforma da arquitectura financeira internacional. Mas qualquer apelo a uma conferência "Bretton Woods II" deve ser concreto em termos de conteúdo. Há assuntos que têm de estar na agenda: um sistema global de regulação e supervisão prudencial; um FMI renovado, capaz de gerir uma reserva mundial de divisas, de coordenar uma política macroeconómica a nível global e de conceder linhas de crédito com suficiente agilidade; e a criação de um tribunal internacional da dívida.

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