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10 de Outubro de 2002 às 14:48

Publicidade electrónica indesejada

Além do incómodo relativo à supressão das mensagens e gestão das mesmas no correio electrónico, podem surgir custos acrescidos devido ao aumento do tempo da ligação à Internet para descarregar as mensagens não solicitadas.João Luís Traça

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Todos os utilizadores da Internet e possuidores de contas de correio electrónico certamente já receberam mensagens comerciais a anunciar produtos e serviços que não solicitaram (actividade vulgarmente designada por «Spamm»). Normalmente essas mensagens são enviadas indiscriminadamente para milhares de utilizadores da Internet, através de prestadores de serviços especializados na remessa em grandes quantidades e em simultâneo de mensagens de correio electrónico.

Em certas situações, tais mensagens são enviadas sob falsa identidade no que concerne ao emissor, o que dificulta a capacidade de o seu destinatário proceder à sua supressão antes de as receber ou de simplesmente programar o seu computador para que as apague automaticamente. Para além do incómodo relativo à supressão das mensagens e gestão das mesmas nos programas de correio electrónico, podem surgir custos acrescidos resultantes do aumento do tempo da ligação à Internet para descarregar as mensagens comerciais não solicitadas.

Em 27 de Janeiro de 1999, foi publicada a Lei n.º 6/99 que regulou a publicidade domiciliária, nomeadamente por via postal, distribuição directa, telefone e telecópia. Contudo, por expressa intenção do legislador, esta Lei não se aplica à publicidade por correio electrónico (n.º 2 do artigo 1.º da referida Lei). Esta decisão resultou do facto de, naquele momento, se saber que a União Europeia ponderava o estabelecimento de regras comuns sobre esta questão para todos os Estados-Membros.

A recente Directiva 2002/58/CE, de 12 de Julho de 2002, relativa à privacidade e às comunicações electrónicas, impõe aos Estados-Membros a obrigatoriedade de regularem a actividade de envio de mensagens de correio electrónico não solicitadas. Nos termos do artigo 13.º da Directiva, a União Europeia optou, apesar de contemplar algumas excepções, pela solução designada de «opt-in». Isto é, a utilização de sistemas automatizados de correio electrónico para fins de comercialização directa apenas poderá ser autorizada em relação a assinantes que tenham dado o seu consentimento prévio, optando, deste modo, por entrar (IN) na base de dados do emissor das mensagens. Adicionalmente, a directiva estabelece a obrigatoriedade de a mensagem conter um endereço para o qual o destinatário possa enviar um pedido para pôr termo a essas comunicações.

Cumpre agora ao legislador português proceder à transposição deste artigo 13.º da directiva para o direito interno por forma a garantir a maior eficácia possível da medida aí preconizada, tendo em conta as características transfronteiriças destes serviços.

A transposição deste artigo 13.º poderá ser efectuada através da alteração da Lei n.º 6/99, a qual passaria a incluir a publicidade por correio electrónico, pela inclusão no Código da Publicidade (Decreto-Lei n.º 330/90, de 23 de Outubro) de normas transpondo o artigo 13.º da Directiva ou, ainda, através da criação de um diploma autónomo.

Esta última solução, por uma questão de economia legislativa e de consistência do sistema jurídico, não parece muito aconselhável. Na verdade, a enorme quantidade de diplomas avulsos é considerada elemento de insegurança jurídica ao nível da interpretação e aplicação das normas ao caso concreto.

A alteração da Lei n.º 6/99 apresenta-se, numa perspectiva sistemática, mais recomendável, pois esta lei para além de abordar em termos gerais todos os aspectos relativos à publicidade domiciliária, endereçada ou não, já inclui muitos dos conceitos constantes do art.º 13.º da Directiva, o que facilitaria a inserção das alterações da nova redacção deste diploma em resultado da transposição.

A este propósito, a Lei n.º 6/99, suscita, porém, duas dificuldades. Em primeiro lugar, um prospecto publicitário numa caixa de correio dificilmente poderá provocar qualquer prejuízo material ao consumidor, o envio de uma mensagem de correio electrónico, caso não esteja devidamente configurada, poderá dar origem à inutilização do computador do consumidor ou perda de dados que aí se encontrassem arquivados e, por outro lado, a ilicitude do conteúdo da mensagem poderá, em certos casos, afectar o consumidor (veja-se o caso de informação não verdadeira). Caso se trate de um anunciante português que recorra aos serviços de uma entidade sediada fora da União Europeia especializada no envio de mensagens de correio electrónico, a capacidade de um consumidor português reclamar judicialmente os seus direitos contra este tipo de publicidade electrónica será substancialmente reduzida.

Por outro lado, a Lei n.º 6/99 estabelece que às matérias nele previstas é também aplicável, com as necessárias adaptações, o artigo 36.º do Código da Publicidade, o qual determina que são punidos como agentes da infracção para efeitos de aplicação das contra-ordenações aí previstas, os anunciantes, a agência de publicidade, o titular do suporte, bem como qualquer outro interveniente na emissão da mensagem publicitária.

Contudo, a Lei n.º 6/99 não prevê a aplicação do artigo 30.º do mesmo Código que determina a responsabilidade solidária dos anunciantes, agências de publicidade, entre outros, bem como dos titulares dos suportes utilizados, pela difusão de mensagens publicitárias ilícitas, o que significa que, caso um anunciante português utilize os serviços de um prestador de serviços não localizado na União Europeia, o consumidor lesado não poderá interpôr uma acção contra o anunciante português.

Deste modo, para além da transposição do artigo 13.º da Directiva, afigura-se aconselhável que o legislador português estabeleça também que, com as necessárias adaptações, o art.º 30.º do Código da Publicidade deverá ser aplicável às matérias reguladas na Lei n.º 6/99, por forma a garantir a protecção eficaz dos interesses dos consumidores.

João Luís Traça

Advogado

Miranda, Correia, Amendoeira e Associados

Comentários para autor e editor para negocios&estrategia@mediafin.pt

Artigo publicado no Jornal de Negócios – suplemento Negócios & Estratégia

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