Opinião
07 de Junho de 2010 às 11:33
Programa de austeridade e de estabilidade
Russsell Ackoff afirmava num dos seus livros que "se não formos capazes de definir bem e com rigor o problema, nunca encontraremos a solução". A observação que tenho feito à situação actual do nosso país tem-me revelado um conjunto de incorrecções no ...
Russsell Ackoff afirmava num dos seus livros que "se não formos capazes de definir bem e com rigor o problema, nunca encontraremos a solução".
A observação que tenho feito à situação actual do nosso país tem-me revelado um conjunto de incorrecções no diagnóstico, que tornam difícil, ou mesmo impossível, encontrar a solução.
De facto, verificamos no diagnóstico oficial o seguinte:
• Uma sub-avaliação clara das necessidades de redução da despesa, a efectuar a curto-prazo.
• Uma construção imperfeita do ranking de gravidade relativa das diferentes variáveis.
• Uma mensagem distorcida da realidade para os vários agentes económicos - empresas e famílias, não as preparando para as suas consequências.
• Uma tentativa de misturar efeitos externos com fragilidades internas, confundindo os interlocutores e impedindo acções correctivas adequadas.
• A manutenção da ilusão de que os culpados estão no exterior e de que o crescimento é possível já no curto prazo, com sacrifícios moderados.
• A afirmação de que o país mostrou capacidade de redução do deficit publico no passado recente e que, por conseguinte, os analistas internacionais nos darão credibilidade em relação aos programas de correcção estrutural que apresentamos.
• A manutenção da dicotomia entre empresas publicas e privadas, em vez da separação entre as que operam no domínio dos bens transaccionáveis e dos não transaccionáveis.
Tenho profundas divergências teóricas em relação a este diagnóstico de que resultam, obviamente, divergências sobre os programas de correcção da situação actual.
Considero que as necessidades de redução da despesa pública e privada é muito superior aos valores que têm sido adiantados; que a redução da despesa no sector privado deve ocorrer nas organizações que actuam nos bens não transaccionáveis porque nas outras esse ajustamento já ocorreu por força das exigências dos mercados; que o problema actual mais grave se situa na escassez e custo do crédito a obter pelo país nos mercados externos, o que obriga a um programa que seja entendido e aceite pelos analistas financeiros internacionais; que em consequência podemos assistir a uma distribuição errada do crédito disponível privilegiando uma vez mais entidades públicas ou para-publicas que actuam na área dos bens não transaccionáveis; que as causas essenciais e mais relevantes para a actual situação do país são causas internas, antigas e estruturais e não efeitos externos, pelo que não desaparecerão quando os restantes países da zona Euro saírem da recessão; que o país não mostrou ter competências para a redução do deficit público e portanto não convence os analistas financeiros internacionais nem as agências de rating, já que nos anos anteriores essa redução foi conseguida, exclusivamente à custa do aumento da receita; que se mantêm todos os constrangimentos anteriores e estruturais da economia portuguesa ao nível da produtividade, competitividade, especialização produtiva e relação com os mercados internacionais; que existe um sector empresarial publico altamente deficitário, com um desequilíbrio estrutural das suas contas de exploração e que se constitui como um sorvedouro de recursos financeiros essenciais para o desenvolvimento das áreas saudáveis da economia.
Na sequência deste diagnóstico, que considero ajustado à realidade actual do país, e que é confirmado pelas análises independentes de especialistas internacionais, considero que a construção de uma solução devia passar por um Programa de Austeridade e Estabilidade, com duas fases claramente distintas, em termos de objectivos, acções e instrumentos de intervenção.
Na primeira fase, de Austeridade, a ocorrer em 2010/2011, o objectivo prioritário seria unicamente a redução global da despesa, com cortes significativos e proporcionais em todas as áreas de actividade, recuperando a confiança dos analistas e agentes financeiros internacionais e resolvendo o problema do financiamento da economia portuguesa.
Na segunda fase, de Estabilidade, a ocorrer em 2011/2012, o objectivo seria o da correcção dos constrangimentos estruturais crónicos da economia portuguesa, que estão na base da sua falta de competitividade, o que exigiria acções orientadas para as diferentes áreas que impedem o crescimento, contemplando, nomeadamente as seguintes acções:
Ajustamento da estrutura de custos às receitas de todas as empresas públicas e eliminando os respectivos défices; adopção universal do princípio utilizador-pagador, separando o custo real dos serviços prestados dos eventuais apoios sociais a prestar a quem não os pode suportar; extinção dos organismos públicos que perderam razão de ser por força da evolução tecnológica e social do país; redução dos organismos públicos onde existam conflitos de competências; redução dos orçamentos departamentais contemplando exclusivamente as suas actividades indispensáveis; concentração dos incentivos públicos às empresas que actuem nos mercados externos em bens transaccionáveis; redefinição do papel do Estado com a privatização de todas as unidades que não se inserem nos objectivos traçados; fomento da concorrência em todos os sectores onde o Estado continuará a actuar, como a Saúde e a Educação, entre unidades públicas, privadas e de organizações sem fins lucrativos.
Só após a conclusão das acções dum Programa de Austeridade e Estabilidade será possível iniciar um Programa de Crescimento, com taxas de crescimento acima da média comunitária, que permita a criação de riqueza no país, dum modo constante, persistente, continuado e estruturado.
Se tivermos a capacidade de compreensão, estudo, rigor, determinação e sacrifício para desenhar e cumprir um programa sério de austeridade e estabilidade até 2012 podemos voltar a ter a esperança de retomarmos o nosso crescimento em 2013.
Se optarmos pela via fácil, andaremos de PEC em PEC até à bancarrota final, do tipo argentino.
A escolha é nossa.
Professor Associado Convidado do ISCTE
Assina esta coluna mensalmente à segunda-feira
A observação que tenho feito à situação actual do nosso país tem-me revelado um conjunto de incorrecções no diagnóstico, que tornam difícil, ou mesmo impossível, encontrar a solução.
• Uma sub-avaliação clara das necessidades de redução da despesa, a efectuar a curto-prazo.
• Uma construção imperfeita do ranking de gravidade relativa das diferentes variáveis.
• Uma mensagem distorcida da realidade para os vários agentes económicos - empresas e famílias, não as preparando para as suas consequências.
• Uma tentativa de misturar efeitos externos com fragilidades internas, confundindo os interlocutores e impedindo acções correctivas adequadas.
• A manutenção da ilusão de que os culpados estão no exterior e de que o crescimento é possível já no curto prazo, com sacrifícios moderados.
• A afirmação de que o país mostrou capacidade de redução do deficit publico no passado recente e que, por conseguinte, os analistas internacionais nos darão credibilidade em relação aos programas de correcção estrutural que apresentamos.
• A manutenção da dicotomia entre empresas publicas e privadas, em vez da separação entre as que operam no domínio dos bens transaccionáveis e dos não transaccionáveis.
Tenho profundas divergências teóricas em relação a este diagnóstico de que resultam, obviamente, divergências sobre os programas de correcção da situação actual.
Considero que as necessidades de redução da despesa pública e privada é muito superior aos valores que têm sido adiantados; que a redução da despesa no sector privado deve ocorrer nas organizações que actuam nos bens não transaccionáveis porque nas outras esse ajustamento já ocorreu por força das exigências dos mercados; que o problema actual mais grave se situa na escassez e custo do crédito a obter pelo país nos mercados externos, o que obriga a um programa que seja entendido e aceite pelos analistas financeiros internacionais; que em consequência podemos assistir a uma distribuição errada do crédito disponível privilegiando uma vez mais entidades públicas ou para-publicas que actuam na área dos bens não transaccionáveis; que as causas essenciais e mais relevantes para a actual situação do país são causas internas, antigas e estruturais e não efeitos externos, pelo que não desaparecerão quando os restantes países da zona Euro saírem da recessão; que o país não mostrou ter competências para a redução do deficit público e portanto não convence os analistas financeiros internacionais nem as agências de rating, já que nos anos anteriores essa redução foi conseguida, exclusivamente à custa do aumento da receita; que se mantêm todos os constrangimentos anteriores e estruturais da economia portuguesa ao nível da produtividade, competitividade, especialização produtiva e relação com os mercados internacionais; que existe um sector empresarial publico altamente deficitário, com um desequilíbrio estrutural das suas contas de exploração e que se constitui como um sorvedouro de recursos financeiros essenciais para o desenvolvimento das áreas saudáveis da economia.
Na sequência deste diagnóstico, que considero ajustado à realidade actual do país, e que é confirmado pelas análises independentes de especialistas internacionais, considero que a construção de uma solução devia passar por um Programa de Austeridade e Estabilidade, com duas fases claramente distintas, em termos de objectivos, acções e instrumentos de intervenção.
Na primeira fase, de Austeridade, a ocorrer em 2010/2011, o objectivo prioritário seria unicamente a redução global da despesa, com cortes significativos e proporcionais em todas as áreas de actividade, recuperando a confiança dos analistas e agentes financeiros internacionais e resolvendo o problema do financiamento da economia portuguesa.
Na segunda fase, de Estabilidade, a ocorrer em 2011/2012, o objectivo seria o da correcção dos constrangimentos estruturais crónicos da economia portuguesa, que estão na base da sua falta de competitividade, o que exigiria acções orientadas para as diferentes áreas que impedem o crescimento, contemplando, nomeadamente as seguintes acções:
Ajustamento da estrutura de custos às receitas de todas as empresas públicas e eliminando os respectivos défices; adopção universal do princípio utilizador-pagador, separando o custo real dos serviços prestados dos eventuais apoios sociais a prestar a quem não os pode suportar; extinção dos organismos públicos que perderam razão de ser por força da evolução tecnológica e social do país; redução dos organismos públicos onde existam conflitos de competências; redução dos orçamentos departamentais contemplando exclusivamente as suas actividades indispensáveis; concentração dos incentivos públicos às empresas que actuem nos mercados externos em bens transaccionáveis; redefinição do papel do Estado com a privatização de todas as unidades que não se inserem nos objectivos traçados; fomento da concorrência em todos os sectores onde o Estado continuará a actuar, como a Saúde e a Educação, entre unidades públicas, privadas e de organizações sem fins lucrativos.
Só após a conclusão das acções dum Programa de Austeridade e Estabilidade será possível iniciar um Programa de Crescimento, com taxas de crescimento acima da média comunitária, que permita a criação de riqueza no país, dum modo constante, persistente, continuado e estruturado.
Se tivermos a capacidade de compreensão, estudo, rigor, determinação e sacrifício para desenhar e cumprir um programa sério de austeridade e estabilidade até 2012 podemos voltar a ter a esperança de retomarmos o nosso crescimento em 2013.
Se optarmos pela via fácil, andaremos de PEC em PEC até à bancarrota final, do tipo argentino.
A escolha é nossa.
Professor Associado Convidado do ISCTE
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