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21 de Abril de 2014 às 09:54

O uso de viaturas ligeiras de passageiros nas empresas

Em termos fiscais, nos últimos anos tem-se assistido à crescente penalização da detenção e uso de viaturas ligeiras de passageiros nas empresas.

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Em termos fiscais, nos últimos anos tem-se assistido à crescente penalização da detenção e uso de viaturas ligeiras de passageiros nas empresas.


A mais recente alteração fiscal quanto a esta tendência de penalização, foi com a Lei de Reforma do IRC que trouxe um enorme aumento das taxas de tributação autónoma sobre os encargos suportados com este tipo de viaturas.


É sabido que a atribuição de viaturas a trabalhadores, nomeadamente a quadros das empresas, é uma forma de aumentar a respetiva remuneração sem consequências a nível de tributação em IRS. É que a norma do Código do IRS, para que haja tributação na esfera do trabalhador, exige que exista contrato escrito sobre a imputação do veículo a tal trabalhador. Ainda que, em muitos casos a viatura possa ser também um instrumento de trabalho, o facto é que em regra o trabalhador pode dela dispor também para o seu uso pessoal, incluindo fins de semana e férias.


Facilmente, essa utilização na esfera pessoal não será tributada se o acordo de utilização do veículo entre empresa e trabalhador não for reduzido a escrito.


Optou o legislador por aumentar exponencialmente a tributação autónoma como forma de forçar a celebração destes contratos escritos, pois a existir tributação em IRS na forma acima descrita, então deixa de haver tributação autónoma sobre a viatura ligeira de passageiros. A esta escolha também não é alheio o facto da tributação autónoma constituir uma fonte importante de receitas de IRC, evidenciado no agravamento das taxas, nos últimos anos.


Sobretudo para viaturas ligeiras de passageiros de valores de aquisição iguais ou superiores a 25 mil euros, o valor a pagar de tributação autónoma supera o montante da vantagem da dedução das despesas com a viatura, na determinação do lucro tributável. E essa diferença é tanto maior quanto mais elevado o custo de aquisição do veículo, pois não só aumenta a taxa de tributação autónoma a aplicar, como ainda a depreciação praticada só é fiscalmente aceite até determinado valor do custo de aquisição, conforme fixado em Portaria do Ministro das Finanças.


Ainda assim admite-se que nem sempre a fuga à tributação autónoma possa ter sido feita, ou se venha a fazer, canalizando a tributação para IRS. O poder negocial entre as partes envolvidas: trabalhador e empresa, terá sempre a sua influência.


Mas com estas medidas, facilmente se pode prever, que o parque automóvel das empresas irá diminuir, pelo menos quanto ao seu valor de aquisição.


Note-se que abordamos, neste artigo, o caso de viaturas ligeiras que, por definição do Código da Estrada, têm peso bruto igual ou inferior a 3.500 kg e com lotação não superior a nove lugares, incluindo o do condutor e, sendo de passageiros, destinam-se ao transporte de pessoas. Considerando essa finalidade deste tipo de viaturas, tem o legislador considerado que são mais suscetíveis de desvio para uso privado. E essa assunção não é feita apenas para IRC. Também no Código do IVA se impede a dedução deste imposto suportado em despesas com as designadas viaturas de turismo, exceto quanto a gasóleo (que tem norma própria).


Apesar de, na interpretação habitual da norma (o art. 21º do CIVA) sempre se ter feito a colagem da noção de "viatura de turismo" à classificação do Código da Estrada, o facto é que a redação da norma não inclui a expressão de "viaturas ligeiras de passageiros", ao contrário do que sucede no preceito que estabelece a tributação autónoma em IRC.


A limitação da dedução de IVA é feita em função da utilização potencial do veículo. Deste modo, fica abrangido pela noção de viatura de turismo qualquer veículo automóvel que, pelo seu tipo de construção e equipamento, não seja destinado unicamente ao transporte de mercadorias ou a uma utilização com caráter agrícola, comercial ou industrial. Por isso basta que o veículo, pela sua construção e equipamento, tenha aptidão para transporte de passageiros, para que o IVA suportado relativamente a tal viatura deixe de ser dedutível.


É esta redação da norma que permite que, viaturas de mercadorias com mais de três lugares sejam também incluídos na definição de "viaturas de turismo", ficando vedado o direito à dedução do IVA, atendendo à possibilidade que oferecem de servirem também como viaturas de transporte de passageiros.


Mas as diferenças entre o Código de IRC e o Código do IVA, não se resumem apenas ao âmbito das viaturas abrangidas. As situações que determinam a não sujeição a tributação autónoma e a não-aplicação da exclusão do direito à dedução, também não são inteiramente coincidentes.


Pelas normas do IVA não existe exclusão do direito à dedução se o veículo se destina a venda ou cuja exploração constitua objeto de atividade do sujeito passivo, como é o caso dos táxis, dos rent-a-car, das escolas de condução. Permite-se, também, que se mantenha o direito à dedução, em despesas suportadas em viaturas de turismo quando o sujeito passivo do imposto que as suportou tenha agido em nome próprio mas por conta de um terceiro, desde que sejam debitadas a esse terceiro. Esta disposição possibilita, por exemplo, que uma dada empresa, que tenha feito uma cedência temporária de uma viatura a outra empresa, possa deduzir o IVA suportado nos encargos com tal veículo desde que fature tais encargos à empresa utilizadora (com IVA, obviamente).


A redação do Código do IRC é bem mais restritiva quanto aos gastos que não ficam sujeitos a tributação autónoma. Apenas contempla os encargos com viaturas ligeiras de passageiros, afetos à exploração de serviço público de transportes, destinados a serem alugados no exercício da atividade normal do sujeito passivo e, como já vimos antes, as viaturas relativamente às quais tenha sido celebrado o acordo com trabalhador com vista à tributação em IRS. De fora ficam os encargos com viaturas destinados a venda, e ainda situações como o referido caso da cedência de viaturas (ainda que onerosa) entre empresas.

 


Artigo redigido ao abrigo do novo acordo ortográfico comunicacao@otoc.pt


Ana Cristina Silva, Consultora da OTOC

 

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