Opinião
O nuclear extemporâneo
Portugal estaria a avaliar o recurso a energia nuclear para garantir a sua independência energética. A maior parte dos países que optaram por esta tecnologia deixam acabar o seu ciclo de vida sem novos investimentos.
A nova geração, os reactores EPR Franco-Alemães, está ainda ainda no papel e a única tecnologia disponível, em fim de vida, a PWR, data dos anos setenta e é pouco competitiva.
O preço do kilowatt nuclear na França é estimado em 35 cP por kWh (cêntimo de Euro por kilo Watt hora) [EDF/ reactores PWR] e de 23 cP [EDF/ futuros hipotéticos reactores EPR] . Para Portugal, deverá ser acrescentado o custo de transferência da tecnologia, a ausência de factores multiplicadores e de economias de escala, o lucro da potencia fornecedora e o enorme custo financeiro dos empréstimos a realizar... Ninguém se atreve avaliar este sobre-custo... Actualmente, o custo da produção de electricidade com centrais a gás é de 32 cP [EDF], o solar passivo de 17 cP (sem o custo dos espaços de captação utilizados), o éolico entre 30 e 35 cP [EDF], os novos aéreo-geradores de grande dimensão alcançariam os 25 cP, a biomassa (queima de resíduos florestais) de 27 cP(compra dos resíduos florestais a 13 P/ton.). O consumidor final paga actualmente em média 70 cP por kWh.
Construir 1 a 3 centrais nucleares é equivalente a comprar electricidade directamente em Espanha ou em França visto que tudo será concebido no estrangeiro, os planos, a engenharia, os equipamentos, a manutenção, parte da operação, o combustível enriquecido, o tratamento dos resíduos radioactivos e até o desmantelamento das centrais será também essencialmente estrangeiro. Apenas o betão, os técnicos e operários serão nacionais.
A construção em França do primeiro reactor EPR é orçamentado em 3 milhares de euros. E são precisos 3 reactores! 9 milhares de euros! Convém sublinhar que esta evaluação é por baixo pelo que os custos de manutenção no fim de vida são actualmente muito superiores ao planeado. Uma pechincha. Portugal deverá endividar-se ad vitam eternam! É por isso que não aparecem investidores que propõem assumir os investimentos e o risco do nuclear, ao contrário das energias renováveis cujos capitais são inteiramente privados. Obviamente, terá de ser o Estado, com os nossos impostos, a cobrar os estudos preliminares e tudo o resto. O nuclear vem de mãos vazias e com uma dialéctica a-científica, perniciosa, procurando assustar («ganhar» a sua causa) os decidores para alimentar a sua avidez financeira.
O nuclear não proporcionará independência energética a Portugal. Não oferece quaisquer efeitos multiplicadores. Não potencializa a participação da indústria portuguesa nesta fileira energética. Cativará os melhores cérebros nacionais. Será a última indústria nacionalizada, ineficiente, perigosa e suja. Que desperdício!
O maior problema de Portugal reside nos combustíveis petrolíferos e não na produção de electricidade. Ora, o nuclear não produz gasolina nem gasóleo. Não é parte da resolução dos problemas agudos que emergem com a crise energética actual.
A discussão sobre o nuclear é extemporânea quando países como a Dinamarca ou a Holanda demonstram que um muito grande passo pode ser dado, rapidamente, com as energias eólica, solar, a biomassa (p.e. queima dos resíduos florestais), das ondas, etc. Trata-se de um mercado ainda não consolidado onde os talentos nacionais podem propor soluções inovadoras e estimular investidores e, eventualmente, criar uma indústria nacional. A janela de oportunidade ainda está aberta.
Não percam tempo com o nuclear!