Opinião
O Marketing das causas sociais
A recente campanha de publicidade dos Jogos da Santa Casa - «Para nós, são estes os números da sorte» está na origem desta crónica.
Durante muitos anos, os jogos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, nomeadamente o Totobola, foram promovidos com campanhas de qualidade de gosto e eficácia duvidosos e habitualmente caracterizados, no meio do Marketing e da Publicidade, como maus exemplos de comunicação.
A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa é uma instituição com mais de 500 anos de história e com uma vasta obra nos domínios da assistência social, da saúde, da formação e da cultura. Contudo, essa obra foi, durante muito tempo, desconhecida da maioria da população que para ela contribuía através da sua participação nos vários Jogos da instituição.
Mais recentemente, nos últimos anos, a comunicação publicitária da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa evidenciou melhorias significativas, passando a melhor cumprir o seu propósito de atrair mais jogadores.
Faço aqui um parêntesis para referir que não estou, de forma alguma, a fazer a apologia do Jogo destacando até algum carácter de alienação que a miragem obsessiva dos contínuos jackpots pode provocar no público em geral. Em todo o caso, como cidadão, sinto-me bem mais confortável com o crescimento do Euromilhões do que com a proliferação do pequeno jogo clandestino, frequentemente viciado, de cartões e senhas, cujos lucros vão enchendo bolsos desconhecidos.
Num momento de crescimento de popularidade dos Jogos de Santa Casa, é desejável e salutar que a Instituição satisfaça uma parte das necessidades dos seus clientes - os apostadores - explicitando para que servem os lucros gerados pelas suas actividades.
É por isso que sendo a Santa Casa uma instituição com vocação social, o Marketing Social vem contribuir para clarificar o trabalho desenvolvido por esta e outras instituições e credibilizar a sua imagem que poderia ser posta em causa pelo facto de os lucros serem provenientes do Jogo.
Pelo impacto que tem na sociedade e pela viragem verificada em termos de imagem e de comunicação, considero que a recente atribuição por parte da APPM - Associação Portuguesa dos Profissionais de Marketing - do galardão de personalidade do ano de Marketing Social, à Directora Comercial e de Marketing do Departamento de Jogos da Santa Casa da Misericórdia, representa o merecido reconhecimento da comunidade empresarial e de marketing face à mudança de actuação da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
Aproveito para referir que, por via do meu recente envolvimento em projectos formativos na área do Marketing Social no ISCTE, verifico com satisfação que dirigentes e técnicos das organizações do designado 3º sector começam a demonstrar um significativo interesse pela aprendizagem das práticas de marketing, ultrapassando antiquados preconceitos que viam no marketing uma actividade para causas e empresas meramente comerciais.
Por último, gostaria de referir que esta maior abrangência da actividade do marketing tem vantagens para essas organizações, mas também para o próprio marketing; espero que possa contribuir para que alguns políticos e sindicalistas porventura ignorantes, ao criticarem medidas acusando-as de falta de concretização, em vez de dizerem «é só marketing» passem a dizer, por exemplo, «é só propaganda», já que o marketing deve corresponder a uma resposta organizacional e não meramente a uma promessa de comunicação para um conjunto de necessidades dos públicos-alvo a que a organização se dirige.
E isto é verdade. Não é só conversa fiada...