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10 de Julho de 2008 às 14:00

O cubo mágico

No futebol, o chamado defeso vem-se transformando cada vez mais no período das grandes emoções. É verdade que a bola não salta e que os jogadores pouco ou nada correm (a não ser de uns clubes para os outros). Mas a "incerteza do resultado" permanece em campo. Sucedem-se as peripécias rocambolescas,...

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Sucedem-se as peripécias rocambolescas, fazem-se e desfazem-se decisões, remata-se com violência nas secretarias e tiram-se bolinhas, enfeitadas com asteriscos, de uma taça, enquanto se espera por uma qualquer (in)justiça que tarda sempre em chegar.

É mais ou menos por esta altura que a "época política" faz também o seu balanço e que as atenções se concentram no debate sobre o "Estado da Nação" que, este ano, coincide com o dia da publicação deste texto. Ou melhor, devia coincidir, não fosse dar-se o caso de a SEDES ter decidido "abrir as hostilidades" com 48 horas de antecedência, antecipando o debate parlamentar. Em boa verdade, as expectativas à volta desse debate e a importância que lhe é atribuída sempre me pareceram um pouco exageradas. O estado da Nação tem sido, de há muito, motivo de preocupação e discussão permanentes. Nos últimos meses, essa preocupação voltou a aumentar, por motivos que são de todos conhecidos. Às coisas que já não corriam tão bem como seria desejável vieram juntar-se a escalada dos preços do petróleo, o aumento dos juros, a Europa a saltar de crise em crise, o desemprego teimosamente elevado e uma lista crescente de problemas que chegaria para deixar mal disposto o último dos optimistas.

Hoje, como ontem, não faltará quem pretenda pintar a realidade com as cores do Verão. Alguns anunciarão a chegada do Inverno. Outros ainda prometerão as andorinhas, que prenunciam uma Primavera radiosa. Foi assim no ano passado e nos que o antecederam. Por maioria de razão, voltará a sê-lo no próximo ano, poucos meses antes de sermos chamados a escolher de novo quem irá chefiar os destinos do país.

É nestas alturas que me lembro de um famoso cubo inventado por um professor de arquitectura húngaro, de seu nome Erno Rubik, que nos anos 80 do século passado era freneticamente manipulado por centenas de milhões de mãos que ainda não se entretinham a teclar mensagens escritas nos telemóveis. Dizem os entendidos que o dito cubo possuía um pouco mais de 43 quintilhões de combinações possíveis. Como para o comum dos mortais um número dessa ordem de grandeza é dificilmente perceptível, alguém se apressou a explicar que, à velocidade de 10 combinações por segundo, seriam necessários 136.000 anos para as realizar, partindo do princípio que a mesma combinação nunca seria repetida. Escreveram-se tratados matemáticos sobre o tema, procurou-se o "algoritmo de Deus", fizeram-se manuais de soluções.

A "euforia do cubo" perdeu a sua natureza de fenómeno de massas. Mas continuou a apaixonar um número significativo de autênticos profissionais e de estudiosos. Existem campeonatos do mundo e competições de vária ordem que abrangem as mais diversas formas de resolução do problema, desde a tradicional – com as duas mãos – até às mais originais (olhos vendados, com os pés, debaixo de água). O recorde mundial é, desde Maio deste ano, de, pasme-se, 8,72 segundos! Elaboradas investigações universitárias e o recurso a computadores permitiram demonstrar que qualquer configuração do cubo poderia ser resolvida com 29, depois 26 e, já em 2008, 23 movimentos. O que antes era um problema quase insolúvel é hoje apenas uma questão de (muito pouco) tempo.

No governo das coisas deste mundo (na saúde, na educação, na justiça, até nas peripécias jurídico-futebolísticas que, ano após ano, teimam em fazer a sua prova de vida...), parece estar-se a fazer o caminho inverso. Os problemas demoram cada vez mais tempo a resolver (se é que vamos a caminho disso...) e o número de movimentos necessários para corrigir o que está mal aumenta, em vez de diminuir. Em vez de simplificar, complicamos. Em vez de exigir, facilitamos. Em vez de resolver, agravamos. E não saímos disto. Até quando?

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