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03 de Setembro de 2023 às 21:09

Marques Mendes: Eleições europeias serão as mais "nacionalizadas" de sempre

No comentário habitual na SIC, Luís Marques Mendes abordou o prolongamento do IVA 0% nos alimentos, as dificuldades de habitação dos portugueses e os desafios do novo ano político, incluindo as eleições europeias.

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O CUSTO DE VIDA

 

  1. Primeira questão: o IVA 0% nos alimentos. A medida termina no início de outubro. O que vai acontecer a seguir? Ao que confirmei, o Governo vai prorrogar a medida. A decisão será tomada já até meados deste mês. É correto que assim seja:
  • Primeiro, esta medida surtiu efeito. Segundo dados da DECO, a redução de preços no cabaz alimentar IVA 0% foi de 7,9%. Mérito do Governo e do Setor de Distribuição.
  • Segundo, esta medida tem ajudado a baixar a inflação no setor da alimentação, tendência que tem ainda de prosseguir.
  • Terceiro, o Estado não está a perder receita, como se vê da execução orçamental de julho.

 

  1. Segunda questão: crédito á habitação. As prestações continuam a subir. O pesadelo mantém-se. Num empréstimo de 150 mil Euros, de maio de 2022 a setembro de 2023, o aumento da prestação é superior a 70% (Euribor a 6 meses) e de 68% (Euribor a 12 meses). Esta é a má noticia. A notícia melhor é esta: confirmei que em meados de setembro o governo vai reforçar os apoios às famílias com duas medidas: o alargamento da bonificação de juros para taxas de esforço superiores a 35% e 50%; e a criação de uma nova oferta dos bancos que garanta a diminuição das prestações nos dois próximos anos.

 

  1. Terceira questão: a subida das rendas em 2024 pode chegar aos 6,9%, diz o INE. Perante este valor, uma coisa é óbvia: os inquilinos mais carenciados têm de ser apoiados. Falta saber é a melhor forma de o fazer. Uma forma é impor um novo travão aos senhorios. Parece boa ideia, mas não é. Distorce e mata o mercado do arrendamento. A segunda é a mais correta. É o Estado exercer a sua função social, apoiando com o subsídio de renda os inquilinos mais pobres e carenciados. Até reforçando o próprio subsídio de renda.

 

ALOJAMENTO ESTUDANTIL

 

  1. Duas polémicas a abrir o ano letivo. A primeira é a das novas greves nas escolas. O ME queixou-se de novas greves. Melhor seria que tivesse feito algo para as evitar. Vamos continuar com greves e os culpados são dois: o ME e os sindicatos. Se tivesse havido cedências de ambas as partes, um acordo garantiria paz nas escolas. Assim, perdem todos: professores, alunos e o País.

 

  1. A segunda polémica é no alojamento estudantil. Quatro problemas sérios:
  2. Primeiro: o problema real. A falta gritante de residências universitárias. Segundo os dados oficiais, as necessidades são de 108 mil camas. As camas disponíveis são apenas 16 mil. Cerca de 15% do que é necessário.
  3. Segundo: o problema político: o não cumprimento das promessas feitas. Em 2018, o Governo prometeu construir até 2023, cerca de 12 mil novas camas. No máximo construiu mil. O problema agravou-se.
  4. Terceiro: a confusão ministerial. A Ministra do Ensino Superior anunciou esta semana que até 2026, com verbas do PRR, teremos mais 15 mil novas camas. Afinal, consultado o Ministério, não são 15 mil novas camas, mas apenas 11.699: cerca de 5.857 são camas novas, construídas de raiz; a somar a mais 5.842 novas camas em espaços adaptados para o efeito.
  5. Último problema: a frustração final. Em 2026, depois do PRR, admitindo que tudo corre bem, teremos no total 26.722 camas. Para as necessidades atuais de 108 mil. Apenas 25% do que é necessário. Muito pouco.
  • O OE devia fazer um esforço de investimento a somar ao investimento do PRR. Ao Estado não cabe apenas facultar ensino superior. É preciso garantir também residências para os estudantes deslocados. O "pacote" de intervenção nesta área tem as duas vertentes: universidade e residência universitária. Doutra forma não há justiça social.

 

 

A REFORMA NA SAÚDE

 

  1. Foi pré-anunciada esta semana uma reforma do SNS, com a criação de 31 novas Unidades Sociais de Saúde. Um objetivo central: haver uma gestão conjunta de Hospitais e Centros de Saúde, de cuidados primários e hospitalares.

 

  1. Nesta proposta de reforma há três questões a considerar:
  2. Primeiro, uma questão política. É muito estranho que uma reforma do Governo seja apresentada pela Direção Executiva do SNS. Não é que Fernando Araújo não seja competente. Mas não é governante. Uma reforma como esta devia ser apresentada pelo Ministro da Saúde ou até pelo próprio PM. Deste modo, o que parece é que o Governo tem medo de dar a cara pela reforma.
  3. Segundo, uma questão de filosofia. No papel, esta reforma parece correta: é positivo haver uma gestão conjunta de hospitais e centros de saúde; é positiva a racionalização de meios; é positivo que os Centros de Saúde ganhem peso na gestão da saúde. Mas tudo isto é no papel.
  4. Terceiro, a questão mais importante está por explicar: na prática esta reforma vai trazer benefícios para as pessoas? Há respostas a dar:
  • Vão diminuir as listas de espera para consultas e cirurgias? Qual o plano concreto que existe?
  • O número de utentes sem médico de família vai reduzir-se? De que forma? Com que calendário?
  • A gestão conjunta vai provocar poupanças? Quais?
  • Bruxelas, ao que apurei, já autorizou a criação de 31 novas EP. Só falta saber: impôs condições? Quais?
  • O Hospital de Cascais fica de fora. Por ser uma PPP. Mas não seria útil ter uma PPP dentro da reforma para comparar desempenhos?

 

 

DESAFIOS DO NOVO ANO POLÍTICO

 

O ano político que agora começa vai ser politicamente agitado. Com vários acontecimentos especialmente desafiantes. Vejamos os principais:

  1. Eleições Regionais na Madeira (24 de setembro)
  • São eleições regionais com reflexo nacional
  • Uma maioria da coligação liderada pelo PSD reforça Montenegro.
  • Sem uma maioria, surge o "pesadelo" do Chega.
  • As sondagens dão vitória clara a Miguel Albuquerque.
  1. Orçamento do Estado para 2024
  • Um OE de grandes riscos (estagnação do PIB da UE, juros altos, inflação)
  • Marcado também por abrandamento da economia dos EUA
  • Com uma previsão de crescimento reduzido do PIB
  • A manter a linha de redução da divida (perto de 100% do PIB)
  • OE dominado por plano de redução do IRS
  1. Congressos do PSD e PS
  • PSD realiza Congresso estatutário em novembro.
  • PS realiza Congresso eletivo em março.
  • Ambos vão transformar-se em "Comícios" pró-europeias.
  • Não é de excluir que PS e PSD aí façam anúncio de cabeças de lista.
  1. Eleições Europeias
  • PM precisa de ganhar para evitar instabilidade. Risco de cartão amarelo.
  • Montenegro precisa de vencer para reforçar liderança. Risco é o Chega.
  • Eleições serão um teste às novas lideranças do PCP, BE, IL e CDS.
  • As eleições europeias mais "nacionalizadas" de sempre.
  1. Pode haver dissolução se PS perder europeias?
  • Não é nada provável. Nem desejável. São as regras da democracia.
  • Em 2004, coligação PSD/CDS perdeu europeias por 11 pp.
  • Jorge Sampaio não dissolveu AR por esse facto.
  • Derrota do PS pode gerar agitação. Mas não dissolução.

FESTA DO AVANTE

 

  1. Goste-se ou não se goste do PCP, é impossível não ter admiração pelo acontecimento de referência que é a Festa do Avante. Uma referência política, mas também cultural e social. Este ano não foi exceção. Com uma particularidade: foi a primeira Festa do Avante do novo líder, Paulo Raimundo. A sua primeira prova de fogo. O seu primeiro banho de multidão.

 

  1. Paulo Raimundo tem pela frente um desafio dificílimo. Por um lado, tem problemas políticos sérios a enfrentar. Por outro lado, tem vantagens pessoais e políticas a potenciar.
  • Os problemas são sobretudo três. Primeiro, a queda em toda a Europa do ideal comunista. Segundo, a queda muito acentuada do PCP nos últimos anos, agravada por causa da geringonça. Terceiro, a posição impopular em relação ao conflito na Ucrânia, difícil de compreender mesmo por muitos comunistas.
  • A seguir, as vantagens. Primeiro, a simpatia. Jerónimo de Sousa foi sempre um exemplo de simpatia e isso ajudou muito o PCP. Paulo Raimundo não lhe fica atrás. Segundo, a capacidade de comunicação. Paulo Raimundo é um bom comunicador. Simples, afável e estruturado. Ainda hoje o demonstrou no encerramento da Festa do Avante, com um discurso claro e assertivo.  Finalmente, tem junto de si o peso sindical da CGTP. Claro que o movimento sindical já não tem o peso que tinha na nossa sociedade. Mesmo assim, esta é uma das grandes mais-valias do PCP. Uma espécie de suporte de vida.

 

 

A UNIVERSIDADE DE VERÃO DO PSD

 

  1. Se a Festa do Avante é uma marca incontornável da ação do PCP, a Universidade de Verão do PSD transformou-se numa referência obrigatória da atividade do partido. Aqui, em grande medida graças à notável capacidade de organização e liderança do seu Diretor, Carlos Coelho.
  2. Transformada em rentrée, nesta Universidade o discurso de Luís Montenegro era essencial. Ele marcou a sua agenda para os próximos tempos:
  • Principal prioridade política: vencer as eleições europeias. Há uns meses, o líder do PSD tinha admitido a hipótese de uma derrota pequena. Hoje foi claro e ambiciosos: o objetivo do PSD é ganhar as eleições europeias. Corrigiu o tiro. Não podia ser doutra forma.
  • Eleitorado alvo a conquistar: os jovens e a classe média. O PSD fala para todos, mas hoje ficou claro que há uma particular atenção com os jovens e com a classe média. Ideia: reter os jovens em Portugal e aliviar a "taxa de esforço" da classe média.
  • As causas principais: a reforma do IRS e a causa da habitação. Montenegro tem nestas duas áreas as suas melhores propostas alternativas. É corrosivo com o Governo, como é normal num líder da oposição. Mas hoje também foi pró-ativo e construtivo: deu abertura para um acordo de regime com o Governo, em matéria de habitação, para um horizonte de 15 anos. Pena é que a futebolização da política, que está em curso, não permita concretizar.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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