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03 de Março de 2024 às 21:37

Marques Mendes: Esta vai ser a semana do tudo ou nada

No seu habitual espaço de opinião na SIC, Luís Marques Mendes analisa o futuro político de António Costa, passa em revista a semana de campanha da AD e do PS e antecipa a "semana do tudo ou nada" nas "eleições mais renhidas e disputadas de há muitos anos a esta parte".

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COSTA EM AULAS

 

  1. A imagem de António Costa a chegar ao volante do seu carro à Universidade Católica, para ter aulas num curso de pós-graduação, gerou algumas graçolas de mau gosto. Todavia, esta imagem tem mais significado do que se pensa. Ela significa duas coisas:
  • A primeira é que acabou o ciclo político de António Costa como PM. Ele já está a preparar a sua vida futura.
  • A segunda é que o futuro do PM passa pela Europa ou por uma vida profissional no setor privado. Se a investigação que sobre si recai for arquivada até julho, António Costa vai para a Europa. O que seria bom para todos: para a Europa, para Portugal e para Luís Montenegro, caso ele venha a ser PM. Se tal não acontecer, o PM pode regressar à vida privada. Daí o curso que está a frequentar.
  1. Mas esta imagem do PM coloca uma dúvida: vamos ter um completo virar de página na política nacional ou apenas uma meia viragem?
  • No passado, sempre que um líder histórico saiu do Governo pelo seu pé, depois de um mandato longo, não foi substituído por um PM do seu partido. Foi substituído por um PM do partido adversário. Os portugueses fizeram um virar de página completo: mudaram de PM, de partido e de projeto político.
  • Cavaco Silva saiu em 1995, depois de 10 anos de governo, e não foi substituído por Fernando Nogueira, do PSD. Em 2002, António Guterres saiu ao fim de 7 anos de governo. Mas não foi substituído por Ferro Rodrigues, do PS. Houve um completo virar de página.
  • O que vai suceder agora? Haverá uma meia viragem de página, com uma nova vitória do PS, embora com um novo PM? Ou haverá uma viragem completa de página, com uma vitória do partido adversário, como sucedeu com Cavaco Silva e António Guterres? A 10 de Março saberemos.


A SEMANA DA AD

 

  1. A campanha da AD nesta semana foi uma espécie de duche escocês: quente e frio. Com aspetos positivos e negativos. Pela negativa, as polémicas e o ruído. Sobretudo o ruido em torno da imigração, de um eventual referendo sobre o aborto e de questões climáticas. Um excesso de ruído tem sempre uma carga negativa.

 

  1. Pela positiva, a presença de Passos Coelho, a atitude de Luís Montenegro e a marcação da agenda mediática.
  • Primeiro, Passos Coelho. Eu não subscrevo a sua ideia de que há uma relação de causa-efeito entre imigração e insegurança. Mas a sua presença e o seu discurso foram importantes. Para acabar com a especulação de que estaria de costas voltadas para Montenegro; e para dar um sinal de conforto aos eleitores mais à direita.
  • Depois, Luís Montenegro. Para muita gente, Montenegro tem surpreendido. Pela ponderação, pelo equilíbrio e pela moderação. Até a lidar com o ruido que alguns criaram: pôs ordem na casa com firmeza e equilíbrio. E no ataque de tinta que sofreu, foi elegante no que disse e todo o país político lhe expressou solidariedade.
  • Finalmente, a AD é o centro das atenções nesta campanha. Até Rui Tavares, líder do Livre, admitiu dialogar no futuro com a direita democrática. O que significa que, indiretamente, está a reconhecer que a AD pode vencer. É uma ajuda inesperada que contribui para marcar a agenda.

 

 

A SEMANA DO PS

 

  1. A campanha do PS é bem diferente da campanha AD. Mesmo assim, também tem pontos fortes e fracos. O ponto mais forte ocorreu ontem: a presença de António Costa no comício do Porto. O PM é claramente o maior trunfo que o PS tem para apresentar. E acabou por fazer um discurso eficaz e galvanizador. Deu um safanão numa campanha que estava demasiado reativa.
  • Este discurso tem alguns pontos críticos, mas há um difícil de explicar: o PM diz que estas eleições vieram fora de tempo. Tem razão. Mas foi a sua demissão, mais o escândalo de serem descobertos milhares de euros em notas no gabinete do seu Chefe de Gabinete, que conduziram a estas eleições antecipadas. Logo: a ser vítima, o PS é vítima de si próprio.
  • Posto isto, uma coisa me parece óbvia: como estamos perante umas eleições decisivas, acredito que António Costa ainda vai voltar á campanha do PS. Ninguém desperdiça o ás de trunfo!

 

  1. Outro aspeto positivo da campanha do PS é a bipolarização que Pedro Nuno Santos tem feito entre a AD e o PS. Como quem diz: ou nós ou eles. É uma forma inteligente de tentar conquistar voto útil á esquerda, sem melindrar os partidos á sua esquerda, Bloco e PCP.

 

  1. A maior dificuldade que Pedro Nuno Santos tem nesta campanha é outra: é que, segundo a sondagem da SIC/Expresso, 61% dos portugueses acham que está na altura de mudar e 70% acham mesmo que Portugal tem estado a ir pelo caminho errado. Ou seja:
  • Há um cansaço natural relativo a oito anos de governo;
  • E estas eleições vieram no tempo errado para o PS. Depois do annus horribilis que foi 2023 – casos e casinhos da TAP, inflação e custo de vida.

A SEMANA DECISIVA

 

  1. A semana que amanhã começa vai ser a semana do tudo ou nada. Está tudo em aberto. Estas são as eleições mais renhidas e disputadas de há muitos anos a esta parte. E vão ser dramatizadas até ao fim.
  • É certo que há uma dinâmica favorável à AD em três das quatro sondagens divulgadas esta semana. Mas o número de indecisos é de tal forma elevado (cerca de 20%) que tudo pode acontecer.
  • Se não houvesse o Chega, e as eleições se disputassem com os partidos tradicionais, a AD ganharia com tranquilidade estas eleições. Há no País uma vontade forte de mudança, como dizem as sondagens. Só que o Chega existe, continua com valores muito elevados nas sondagens e prejudica sobretudo a AD.

 

  1. Assim sendo, o guião para a noite eleitoral sugere algumas perguntas essenciais:
  • AD e IL terão maioria de deputados? Não é fácil, mas também não é impossível, como sugere uma das sondagens publicada.
  • PS poderá ganhar, sem maioria de esquerda? É possível, mas vai depender muito do voto útil e dos indecisos.
  • Chega conseguirá eleger em todos os distritos? É provável.
  • PCP baixará para metade dos deputados? Corre esse sério risco.
  • BE pode superar resultado de 2022? Não é fácil. A campanha está cheia de casos.
  • Livre pode surpreender pelo resultado? É muito provável. Tem feito uma excelente campanha.
  • PAN consegue eleger? Depende muito do voto útil.
  • Santos Silva consegue ser eleito? É uma dúvida séria face ao crescimento do Chega.
  • O próximo PAR será Aguiar Branco ou Francisco Assis? Depende de ser a AD ou o PS a ganhar as eleições.


O ESTADO DA EDUCAÇÃO

 

  1. O Conselho Nacional da Educação fez-nos esta semana um retrato muito útil do estado da educação. Vejamos os destaques essenciais:
  • A taxa de escolarização melhorou, em particular no ensino secundário (88% em 2022 contra 73% há uma década). Um bom sinal, mas há ainda um caminho a percorrer, continuando a combater o abandono escolar.
  • A taxa de retenção dos alunos teve uma redução acentuada nesta última década (baixou de 19% em 2013 para 8,6% em 2022). À primeira vista é um bom indicador. Mas esta redução coincide também com o período em que as nossas classificações nos rankings internacionais pioraram. Haverá aqui algum sinal de facilitismo?
  • A atratividade do ensino profissional é baixa. O objetivo deve ser o de ter 50% dos nossos alunos no ensino profissional. A verdade, porém, é que só cerca de 40% estão a seguir os cursos profissionais. Importa fazer pedagogia em torno do ensino profissional, para o valorizar. Os cursos profissionais não são cursos menores. São diferentes.

 

  1. Situação mais delicada é a do envelhecimento dos professores:
  • Mais de metade dos nossos docentes tem mais de 50 anos. E nove em cada dez tem mais de 40 anos. Um problema sério.
  • O número de aposentações está com uma tendência de aumento já desde 2016. E os novos professores formados não chegam para compensar os que se reformam. Estamos perante um dos desafios mais sérios que se colocam ao próximo governo. Já que não se fez o devido planeamento até agora, importa fazê-lo para o futuro.


A ECONOMIA E O CUSTO DE VIDA

 

  1. Numa semana com muitos números, há, no plano macro, sobretudo três importantes destaques:
  • A subida para A- do rating da República por parte da Standard & Poor´s. É a primeira vez desde 2011 que Portugal tem rating A- nas três principais agências. Um bom sinal para o país.
  • As exportações atingiram em 2023 um peso de 47% no PIB. É certo que este valor fica ligeiramente aquém do resultado de 2022 (50%). Mas no contexto difícil que se vive na Europa é, apesar de tudo, um bom resultado.
  • A inflação caiu para 2,1% em fevereiro, ligeiramente abaixo do valor da Zona Euro (2,6%), o que faz presumir que em breve podemos começar a ter descida das taxas de juro por parte do BCE.

 

  1. Apesar destes bons indicadores, os problemas das famílias continuam ainda a ser sérios:
  • O valor do cabaz alimentar está com tendência de descida de preço (uma queda de 2% desde o início do ano). Mas é bom recordar que continua em valores muito elevados, porque regista um aumento de 10% face a setembro de 2023.
  • E no crédito à habitação, os valores das prestações para março têm ainda reduções muito ligeiras (na Euribor a 3 e 6 meses) e continuam a registar um aumento na Euribor a 12 meses. Os sinais são, pois, positivos, mas ainda muito insuficientes face aos dramas de muitas famílias portuguesas.

 

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