Opinião
Justiça eficaz: será desta?
Em 2004, o André Gonçalves Pereira e eu próprio convidamos António Barreto para falar sobre o Estado da Justiça no encontro anual de advogados que promovíamos na sociedade de advogados que então girava sob os nossos apelidos.
Em 2004, o André Gonçalves Pereira e eu próprio convidamos António Barreto para falar sobre o Estado da Justiça no encontro anual de advogados que promovíamos na sociedade de advogados que então girava sob os nossos apelidos.
António Barreto deu-nos uma lição completa, inovadora e vibrante fundamentada numa infinidade de casos e números. Recordo-me que concluiu dizendo que não há democracia sem Justiça eficaz e que em Portugal não tínhamos, à época, uma Justiça eficaz.
Não tínhamos então e continuamos a não ter.
A Justiça não é eficientemente aplicada em Portugal porque os Tribunais não funcionam como deveriam funcionar num Estado de Direito que pretende assegurar os direitos, liberdades e garantias dos seus cidadãos. E os Tribunais não funcionam porque as leis de que depende o seu eficaz funcionamento são inadequadas, os meios e instalações insuficientes, alguns dos chamados "operadores judiciários" acomodados, incompetentes ou preguiçosos e os sucessivos governos, por omissão ou inépcia, incapazes de imaginar e liderar a mudança.
A Dra. Paula Teixeira da Cruz resolveu meter mãos à obra. No Congresso da Ordem dos Advogados anunciou os pilares dessa revolução mas, infelizmente, a atenção não foi canalizada para essa parte do seu discurso.
A sua "Reforma Integrada da Justiça" parece assentar em três iniciativas:
- Rever a organização dos Tribunais, diminuindo o seu número e conferindo maior simplicidade e flexibilização ao seu funcionamento;
- alterar os chamados "códigos adjectivos", isto é, o processo civil, o processo penal e o processo administrativo;
- tornar mais eficiente, coordenada e amiga toda a tecnologia de informação que serve o acesso e utilização da justiça junto de tribunais, notários, conservatórias e entidades similares.
No âmbito desta "Reforma", foi aprovada uma Lei e outra encontra-se em fase adiantada de aprovação. Ambas poderão contribuir de decisivamente para a implementação de uma justiça mais eficaz.
A Lei aprovada é a nova Lei da Arbitragem Voluntária (Lei 63/2011 de 14 de Dezembro) que regula de forma detalhada, clara e exequível a submissão voluntária à decisão final de juízes árbitros, nomeados pelas partes envolvidas, da resolução de litígios de natureza patrimonial e de alguns de natureza não patrimonial, relegando a intervenção dos Tribunais do Estado para um papel subsidiário. Esta lei não é nova (efectivamente revoga a velha e incompleta Lei 31/86) mas tem a vantagem de clarificar o alcance substancial e formal desta forma de jurisdição privada. Espera-se que a tendência para a utilização desta jurisdição voluntária se acentue, aliviando os Tribunais do Estado de uma parte complexa e significativa de potenciais litígios.
O projecto de Lei que está em discussão respeita a mais uma alteração do Código de Processo Civil.
Da exposição de motivos apresentada pela Comissão encarregue da sua redacção destaco o "reforço dos poderes de direcção efectiva do processo pelo juiz", a intenção de criar " um novo modelo de processo civil, simples e flexível, despojado de injustificados formalismos e floreados subjectivos " e a possibilidade de programar, na Audiência Preliminar que passará a ser decisiva para a formatação da acção judicial, "os actos e tempos da audiência final… para as Partes e os seus Advogados poderem ver respeitados os seus horários e agendas".
Se as regras que regulam a resolução de litígios privados pelos Tribunais do Estado, tal como já acontece na Arbitragem Voluntária, privilegiarem a substância sobre a forma e a oralidade da discussão, eliminarem os expedientes dilatórios, penalizando severamente a sua utilização e atribuírem ao Juiz maior poder e responsabilidade na condução do processo, seguramente que teremos uma Justiça mais célere e completa.
Se a isto juntarmos as anunciadas reformas do processo penal e administrativo, a adequada dotação de meios humanos e materiais aos tribunais, aos magistrados do Ministério Público e à Polícia Judiciária, a clarificação das regras sobre o segredo de Justiça (com consequente e exemplar punição de quem as viola) e a devolução aos Juízes do poder disciplinar sobre os funcionários judiciais, então teremos uma Justiça eficaz e, finalmente, uma Democracia exemplar.
Será que isso vai acontecer algum dia?
Advogado mcb@mcb.com.pt
Assina esta coluna semanalmente à sexta-feira
António Barreto deu-nos uma lição completa, inovadora e vibrante fundamentada numa infinidade de casos e números. Recordo-me que concluiu dizendo que não há democracia sem Justiça eficaz e que em Portugal não tínhamos, à época, uma Justiça eficaz.
A Justiça não é eficientemente aplicada em Portugal porque os Tribunais não funcionam como deveriam funcionar num Estado de Direito que pretende assegurar os direitos, liberdades e garantias dos seus cidadãos. E os Tribunais não funcionam porque as leis de que depende o seu eficaz funcionamento são inadequadas, os meios e instalações insuficientes, alguns dos chamados "operadores judiciários" acomodados, incompetentes ou preguiçosos e os sucessivos governos, por omissão ou inépcia, incapazes de imaginar e liderar a mudança.
A Dra. Paula Teixeira da Cruz resolveu meter mãos à obra. No Congresso da Ordem dos Advogados anunciou os pilares dessa revolução mas, infelizmente, a atenção não foi canalizada para essa parte do seu discurso.
A sua "Reforma Integrada da Justiça" parece assentar em três iniciativas:
- Rever a organização dos Tribunais, diminuindo o seu número e conferindo maior simplicidade e flexibilização ao seu funcionamento;
- alterar os chamados "códigos adjectivos", isto é, o processo civil, o processo penal e o processo administrativo;
- tornar mais eficiente, coordenada e amiga toda a tecnologia de informação que serve o acesso e utilização da justiça junto de tribunais, notários, conservatórias e entidades similares.
No âmbito desta "Reforma", foi aprovada uma Lei e outra encontra-se em fase adiantada de aprovação. Ambas poderão contribuir de decisivamente para a implementação de uma justiça mais eficaz.
A Lei aprovada é a nova Lei da Arbitragem Voluntária (Lei 63/2011 de 14 de Dezembro) que regula de forma detalhada, clara e exequível a submissão voluntária à decisão final de juízes árbitros, nomeados pelas partes envolvidas, da resolução de litígios de natureza patrimonial e de alguns de natureza não patrimonial, relegando a intervenção dos Tribunais do Estado para um papel subsidiário. Esta lei não é nova (efectivamente revoga a velha e incompleta Lei 31/86) mas tem a vantagem de clarificar o alcance substancial e formal desta forma de jurisdição privada. Espera-se que a tendência para a utilização desta jurisdição voluntária se acentue, aliviando os Tribunais do Estado de uma parte complexa e significativa de potenciais litígios.
O projecto de Lei que está em discussão respeita a mais uma alteração do Código de Processo Civil.
Da exposição de motivos apresentada pela Comissão encarregue da sua redacção destaco o "reforço dos poderes de direcção efectiva do processo pelo juiz", a intenção de criar " um novo modelo de processo civil, simples e flexível, despojado de injustificados formalismos e floreados subjectivos " e a possibilidade de programar, na Audiência Preliminar que passará a ser decisiva para a formatação da acção judicial, "os actos e tempos da audiência final… para as Partes e os seus Advogados poderem ver respeitados os seus horários e agendas".
Se as regras que regulam a resolução de litígios privados pelos Tribunais do Estado, tal como já acontece na Arbitragem Voluntária, privilegiarem a substância sobre a forma e a oralidade da discussão, eliminarem os expedientes dilatórios, penalizando severamente a sua utilização e atribuírem ao Juiz maior poder e responsabilidade na condução do processo, seguramente que teremos uma Justiça mais célere e completa.
Se a isto juntarmos as anunciadas reformas do processo penal e administrativo, a adequada dotação de meios humanos e materiais aos tribunais, aos magistrados do Ministério Público e à Polícia Judiciária, a clarificação das regras sobre o segredo de Justiça (com consequente e exemplar punição de quem as viola) e a devolução aos Juízes do poder disciplinar sobre os funcionários judiciais, então teremos uma Justiça eficaz e, finalmente, uma Democracia exemplar.
Será que isso vai acontecer algum dia?
Advogado mcb@mcb.com.pt
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